A UE não pode baixar os braços

Após a recusa da Ucrânia em assinar um acordo de associação, a União Europeia não pode dar-se ao luxo de perder a confiança dos outros países da Parceria Oriental. Na cimeira de Vílnius, tem de enviar uma mensagem política clara à Moldávia e à Geórgia, considera “Die Welt”.

Publicado em 27 Novembro 2013 às 17:44

Quando foi a última vez em que se viram manifestantes a acenar fervorosamente a bandeira das estrelas da União Europeia? Na década de 1950, na fronteira franco-alemã? Em 1989 e seguintes, durante as revoluções ditas “de veludo”, de Bucareste a Talin? Hoje, volta a ser agitada nas manifestações na Ucrânia e, há algumas semanas, na República da Moldávia.

“Europa” é ainda sinónimo de esperança. Ou, para ser mais preciso: de prosperidade em primeiro lugar, seguida de segurança, e de liberdade, em terceiro. Três condições que todos os seres humanos prezam.

Se as manifestações da Moldávia decorreram sob o signo da confiança, já os ucranianos envergaram as cores da tristeza e do ressentimento. Sexta-feira, durante uma cimeira organizada na Lituânia – o país que ocupa atualmente a Presidência da União Europeia –, a UE fará o balanço de um projeto cujo nome é, para já, sinónimo de promessas, mais do que de atos: a Parceria Oriental. Procurava-se, com ela, aproximar a União Europeia e os vizinhos orientais da Europa. A Rússia apôs-lhe imediatamente um rótulo de inadmissibilidade.

Entre as repúblicas do Cáucaso, o Azerbaijão, rico em recursos naturais, mas governado por um regime autoritário, distanciou-se do projeto, posteriormente imitado pela Arménia, altamente dependente da Rússia, e pela Bielorrússia, dominada por uma ditadura.

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Sociedade civil

A UE negociou acordos de associação com os restantes três países – Ucrânia, Geórgia e Moldávia. São documentos ambiciosos, que preveem uma harmonização jurídica (as leis orientais deveriam aproximar-se da legislação europeia), a que se junta um reforço da democracia e da economia de mercado, bem como um aumento do comércio livre acompanhado de uma redução de direitos aduaneiros. Como é possível alguém recusar um projeto destes? Muito facilmente. Mais uma vez, voltou a verificar-se um velho ditado da sabedoria popular: ninguém pode viver em paz se isso não agradar ao seu vizinho.

[[Prosperidade, segurança e liberdade nos países vizinhos é o que perturba uma Rússia revigorada sob a liderança de Vladimir Putin]]. Mentes simples, na busca de uma explicação, podem encontrá-la num provérbio russo: quando dois agricultores vivem lado a lado e apenas um tem uma vaca, qual é o desejo do mais pobre? Que a vaca do rico morra. A Rússia quer impedir o surgimento, nas suas imediações, de modelos de sociedade e de Estado divergentes. Ou seja – supremo horror – uma sociedade civil consciente da sua força.

Em duas entrevistas realizadas num curto espaço de tempo, Putin agitou claramente a cenoura e a vara ao Presidente ucraniano, Viktor Yanukovich. Agora, a União Europeia ficou em maus lençóis: na quinta-feira passada, a Ucrânia – o maior dos países estritamente europeus – retirou-se do acordo de associação com a UE.

Pode parecer paradoxal, mas, nos próximos meses, a União Europeia vai ter de demonstrar a sua capacidade para definir uma política com os seus vizinhos orientais da Moldávia e da Geórgia. Teremos de rever as nossas ambições em baixa? Ambos os países querem selar em Vílnius o seu acordo de associação com a UE, o último passo antes da adesão. Nunca os políticos europeus representaram um papel tão importante na formação de um governo pró-europeu como na Moldávia. Mas as eleições europeias são daqui a seis meses, seguidas, seis meses depois, de eleições na Moldávia.

Conflitos de peso

E se a União abrandar os seus esforços e não dirigir aos moldavos uma mensagem forte, como seja a isenção de vistos, os comunistas podem muito bem sair vencedores do escrutínio.

Ambos os países são prejudicados por conflitos de peso: a Geórgia, porque as tropas russas ocupam um terço do país; a Moldávia, porque separatistas apoiados pela Rússia criaram um Estado dentro do Estado, numa parte do seu território. Mas isso não deve impedir o curso da história: é claramente possível estabilizar os dois países e aproximá-los da UE. A questão que se coloca hoje não é a da adesão, mas de relações comerciais e mudanças. O que importa agora é o que é importante e realista fazer. Quase tínhamos esquecido que o Chipre, Estado-membro da União, foi cortado ao meio, numa divisão que se tornou permanente.

A outra opção seria o surgimento de um novo império em torno da Rússia, ainda que com diferenças consideráveis em relação à União Soviética. Nessa época, Moscovo devia proporcionar uma melhor qualidade de vida às repúblicas da periferia da União Europeia, bem como aos seus cidadãos, para os manter sossegados. Desta vez, seria diferente: os novos países-satélites ocupam uma zona desgarrada, instável e pobre, que envia milhões de trabalhadores clandestinos para todo o mundo, para a construção de novas torres de escritórios, de Madrid a Moscovo. E mais cedo ou mais tarde, as mulheres que ficaram em casa acabarão por reformar as suas velhas bandeiras europeias, esmaecidas...

Contraponto

Não forçar os vizinhos do Leste

“Sejamos honestos: não foi apenas a política levada a cabo por Moscovo, como também os programas como a Parceria Oriental, que levaram a um jogo de tração à corda geopolítico”, estima a investigadora belga Ria Laenen em De Standaard. Recordando as eleições presidenciais na Geórgia, vencidas no passado mês de outubro por Guiorgui Margvelachvili, esta considera que “não há dúvida de que o caminho incondicionalmente pró-europeu da Geórgia que se viveu sob o mandato de Mikheil Saakachvili, vai chegar ao fim”, mas não se trata forçosamente de algo mau:

Em vez de nos focarmos na confiança crescente com a qual a Rússia tenta manter ou recuperar os países eurasiáticos no seio da sua esfera de influência, deveríamos perceber que está mais do que na hora de redefinir a mensagem que a UE dirige a esses países. […] Será que devemos obrigá-los a escolher entre Moscovo e Bruxelas? […] Com esta eleição, a população da Geórgia mostrou claramente querer uma normalização das relações com o seu grande país vizinho, a Rússia. […] O primeiro passo é admitir que a UE também tem interesses geopolíticos, ou melhor ainda, interesses geoeconómicos nesses países. Sobretudo porque produzem gás e petróleo – como o Azerbaijão – ou – como a Geórgia – porque desempenham um papel crucial enquanto países de transição no acesso aos oleodutos.

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