Abafa-te, avinha-te e… avinagra-te?

Apesar de ácido, há quem goste de lhe salientar os benefícios, em certas regiões da Europa. Uma salada de expressões com um toque de vinagre.

Publicado em 13 Novembro 2009 às 11:08

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Desde tempos imemoráveis, o vinagre ocupa um lugar de primeiro plano na cozinha. Foi utilizado durante muito tempo na conservação alimentar – de que mantemos, por exemplo, a tradição dos picles – e continua a ser utilizado como condimento.

Na Roma Antiga, misturavam-no com água e plantas aromáticas, resultando um refrigerante muito popular, conhecido por “posca”. Cidadãos livres, escravos e legionários: todos o apreciavam. Dois Césares tão augustos como Adriano e Trajano não desdenhavam bebê-lo em público, quando precisavam de revitalizar a sua popularidade junto dos súbditos romanos. E se o ramo de hissopo estendido a Cristo na cruz lhe levou à boca vinagre, não era, como se pretendeu em tempos, para o martirizar, mas precisamente com a preocupação de lhe aliviar a sede e tonificar os músculos.

Para além das virtudes culinárias, o vinagre possui uma qualidade anti-séptica poderosa. Assim, no início do século XVII, em Toulouse, durante uma epidemia de peste que dizimou grande parte da população, quatro malfeitores foram apanhados a roubar os cadáveres. A justiça surpreendeu-se por conseguirem escapar ao contágio da terrível calamidade e, em troca da liberdade, exigiu que revelassem o segredo da sua imunidade. Adivinhou: o vinagre, pois claro. Apesar de os polacos contarem sete bandidos na expressão “Kwaśny jak ocet siedmiu zlodziei”, a receita que associa o ácido acético a uma série de espécies herbáceas continua a ser famosa em inglês, sob o nome de Vinagre dos Quatro Ladrões – “The four thieves vinegar”.

Apanhar moscas com vinagre

Embora de ambos os lados da Mancha as moscas não se apanhem com vinagre (“you can catch more flies with honey than with vinegar”, “on attrape pas des mouches avec du vinaigre”), os italianos consideram que um copo do acre néctar oferecido com generosidade é mais suave que mel (“L'aceto donato è più dolce del mele”).

A exemplo das talhas de vinho estragado, também o coração dos homens sofre frequentemente ameaças de corrosão. Na Turquia, aconselha-se, por isso, ao homem impetuoso que limpe a sua cólera o mais rapidamente possível, antes que a acidez da sua raiva danifique o tonel: “Keskin sirke küpüne zarar”.

Num inglês tão americano como cáustico, o combatente cheio de entusiasmo e energia, pronto a aceitar todos os desafios, distingue-se por estar “full of piss and vinegar” [cheio de acidez interior: urina e vinagre]. Até ferve! O que não acontece com os franceses, para quem um “pisse-vinaigre” [mija-vinagre] é aquele para quem todas as ocasiões são boas para azedar o vinho, ou seja, um desmancha-prazeres.

Um provérbio alemão proclama que a acidez traz felicidade: “Sauer macht lustig”. Uma recordação de que, originalmente, os pratos condimentados com vinagre contribuíam para abrir o apetite dos convivas, instalando assim o bom humor em torno da mesa. De acordo com certos estudos, um bom copo de vinagre em jejum aumentava a tonicidade e a descontracção dos músculos. Um ritual que se perdeu. Hoje, a simples sugestão arrisca-se a avinagrar os ânimos.

Resistem os adeptos dos benefícios das mezinhas naturais, que estão dispostos a garantir que o vinagre de cidra é muito recomendável – mas não puro! Duas colheres num copo de água limpam o fígado e ajudam a combater a diabetes. Um verdadeiro bálsamo proporcionado pelas mães… do vinagre.

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