Frankfurt simboliza a versão europeia de capitalismo (Wolfgang Staudt)

Aprender com a Europa

Numa altura em que os críticos das reformas dos serviços de saúde apresentadas por Barack Obama acusam o Presidente norte-americano de tentar impor a democracia social em Washington, o economista laureado com o Prémio Nobel, Paul Krugman, sublinha que a democracia social de estilo europeu, frequentemente atacada pelos conservadores norte-americanos, afinal funciona.

Publicado em 12 Janeiro 2010 às 14:59
Frankfurt simboliza a versão europeia de capitalismo (Wolfgang Staudt)

À medida que a reforma dos serviços de saúde se aproxima da meta, saem gritos e apitos do lado dos conservadores. Mesmo os mais moderados têm emitido alertas desastrosos de que o projecto de saúde de Obama irá transformar a América numa democracia social de estilo europeu. E todos sabem que a Europa perdeu todo o seu dinamismo económico. É estranho, contudo, virem dizer o que todos sabem não ser verdade. A Europa tem problemas económicos: quem os não tem? Mas a história que se ouve permanentemente – de uma economia estagnada, em que os impostos elevados e os benefícios sociais generosos minaram os incentivos, parando o crescimento e a inovação – têm pouco a ver com os factos, surpreendentemente positivos. A verdadeira lição da Europa é realmente o oposto do que os conservadores reivindicam: a Europa é um êxito económico, que demonstra que a democracia social funciona.

Na verdade, o sucesso económico da Europa devia ser óbvio, mesmo sem recurso a estatísticas. Para os norte-americanos que visitaram Paris: pareceu-lhe pobre e atrasada? E que dizer de Frankfurt ou Londres? Há sempre que ter em conta que, quando a questão se coloca sobre em que acreditar – nas estatísticas económicas oficiais ou no que os olhos vêem –, os olhos levam a melhor. No entanto, as estatísticas confirmam o que os olhos vêem. É verdade que a economia dos Estados Unidos cresceu mais rapidamente do que a da Europa, na geração passada. Desde 1980 – quando a nossa política fez uma viragem declarada para a direita e a Europa não – o PIB real dos EUA cresceu, em média, 3% ao ano. Entretanto, a UE dos 15 – a coligação política de 15 países, antes de a União Europeia ser ampliada para incluir diversas antigas nações comunistas – cresceu apenas 2,2% ao ano. Ponto para a América! Ou talvez não. Tudo o que daí se extrai é que tivemos um crescimento demográfico mais rápido. Desde 1980, o PIB per capita real – que é o que importa para os padrões de vida – cresceu praticamente o mesmo nos EUA e na UE dos 15: 1,95% ao ano, aqui; 1,83% lá.

Europeus são bastante produtivos

E quanto à tecnologia? No final dos anos 1990, podia-se argumentar que a revolução da tecnologia da informação tinha passado à margem da Europa. Mas recuperou e bem. A banda larga, em especial, está tão difundida na Europa como nos Estados Unidos, e é muito mais rápida e mais barata. E quanto a empregos? Aqui, os Estados Unidos comportam-se discutivelmente melhor: as taxas de desemprego europeias são geralmente substancialmente mais elevadas do que as de cá, e a proporção de empregados mais baixa. Mas se sua visão é de milhões de adultos no auge da idade produtiva sentados sem fazer nada, vivendo de pensões, desengane-se. Em 2008, 80% dos adultos entre 25 e 54 anos, na UE-15, estavam empregados (e 83%, em França). É mais ou menos como nos Estados Unidos. Os europeus trabalham menos do que nós na juventude e na velhice – mas isso mau?

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E os europeus são bastante produtivos: trabalham menos horas, mas o resultado por hora, em França e na Alemanha, é próximo dos níveis dos EUA. A questão não é que a Europa seja a utopia. Como os Estados Unidos, está aflita a lutar contra a crise financeira actual. Como os Estados Unidos, as grandes nações da Europa enfrentam problemas fiscais sérios a longo prazo – como alguns Estados individuais dos EUA, alguns países europeus estão à beira de uma crise fiscal. (Sacramento é agora a Atenas dos Estados Unidos – no mau sentido.) Mas vista de uma maneira mais abrangente, a economia europeia funciona, cresce e, de uma maneira geral, é tão dinâmica como a nossa.

Então, porque é que muitos peritos nos traçam um retrato tão diferente? Porque segundo o dogma económico que prevalece neste país, a democracia social de tipo europeu devia ser um desastre total. E as pessoas tendem a ver o que lhes dá jeito. Mas enquanto os relatos da recessão económica da Europa são extremamente exagerados, os dos seus impostos elevados e benefícios generosos não são. Os impostos, nas principais nações europeias, variam entre 36 e 44% do PIB, contra os 28% nos Estados Unidos. Os cuidados médicos universais são… universais. A despesa social é muitíssimo mais elevada do que a nossa. A Europa é frequentemente apresentada como uma história de proteccionismo, uma demonstração de que, quando se tenta tornar a economia menos brutal, pô-la a tomar mais conta dos seus cidadãos que estão em apuros, acaba-se por liquidar o progresso económico. Mas o que a experiência europeia demonstra realmente é o oposto: justiça social e progresso podem andar a par.

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