Crise da dívida

Berlim, a ovelha negra

Publicado em 6 Março 2015 às 18:26

O correspondente do Libération em Bruxelas, Jean Quatremer, revela que o Avgi, um diário próximo do Syriza, o partido do primeiro-ministro grego Alexis Tsipras, publicou uma caricatura do ministro alemão das Finanças, “Wolfgang Schäuble, vestido com um uniforme da Wehrmacht, o exército do Terceiro Reich, com uma cruz de guerra ao pescoço”.

Tsipras só condenou a ilustração dois dias depois de esta ter sido publicada. Além disso, Quatremer recorda que o primeiro-ministro grego foi o primeiro, na verdade, a “abrir as comportas da germanofobia” ao pedir à Alemanha uma compensação pelos danos sofridos pela Grécia durante a Segunda Guerra Mundial.

Com a crise, a germanofobia está a progredir por toda a Europa e Berlim “começa a preocupar-se”, observa Quatremer. O correspondente explica que, “um pouco por todo o lado, encara-se mal o que é percebido como a dominação de um país que parece querer impor o seu modelo económico com políticas de austeridade”.

No Reino Unido, “uma parte da classe política […] e da imprensa popular estão indignadas por ver a derrotada de dois conflitos mundiais impor-se como um maestro incontestável da zona euro”, acrescenta o jornalista, que observa que a hostilidade relativamente à Alemanha também está em expansão em França. O soberanista de direita Nicolas Dupont-Aignan qualifica a União Europeia como o “Quarto Reich”, o líder da Frente de Esquerda, Jean-Luc Mélenchon, estima que “a atitude da Alemanha é arrogante, dominadora e está a conduzir a Europa para o caos”, enquanto a líder do Frente Nacional, Marine le Pen, denuncia a “capitalização da Grécia face à chantagem de Berlim”.

Newsletter em português

O jornalista acrescenta que o “discurso germofóbico está também a ganhar terreno no seio do UMP e do PS”, devido a divergências relacionadas com a gestão da crise do euro. Os alemães seguem as regras. Só depois é que consideram o contexto, enquanto nós e os anglo-saxónicos somos muito mais pragmáticos, realça um membro do Governo francês a Quatremer, segundo o qual,

para Berlim, basta seguir as regras acordadas e não ir em busca de uma interpretação criativa, de se adaptar às circunstâncias. Os seus “não” repetem-se com frequência: não ao plano europeu de resgate dos bancos, não a uma recuperação europeia, não à ajuda financeira à Grécia, não à interpretação flexível das regras.

No entanto, o Bundestag apoiou o resultado das últimas negociações com a Grécia, “que não estava nada garantido”. O tabloide alemão Bild fez, de facto, campanha contra a extensão da ajuda à Grécia e o plano de resgate estava longe de obter o apoio da opinião pública. Quatremer chegou à conclusão de que

na verdade, a Alemanha aceitou sempre aquilo que inicialmente rejeitou: a continuação da Grécia na zona euro, a solidariedade financeira para com os países em dificuldade, a união bancária, a flexibilização do Pacto de Estabilidade, a nova política monetária expansionista do Banco Central Europeu, o acordo para a renegociação parcial do programa de reformas exigido a Atenas, etc.

O jornalista questiona-se se a França não será responsável por estes sentimentos germofóbicos, uma vez que “o enfraquecimento do Hexágono na cena política europeia reforça a impressão de uma dominação brutal de Berlim.

Tags

É uma organização jornalística, uma empresa, uma associação ou uma fundação? Consulte os nossos serviços editoriais e de tradução por medida.

Apoie o jornalismo europeu independente.

A democracia europeia precisa de meios de comunicação social independentes. O Voxeurop precisa de si. Junte-se à nossa comunidade!

Sobre o mesmo tópico