Chegou o momento de agir

Embora estejam de acordo quanto ao diagnóstico dos males que afetam as finanças mundiais e, em especial, a zona euro, os Governos europeus agem de forma dissonante e parecem não se aperceber da gravidade da situação. A verdade, porém, salienta o Mediapart, é que o tempo urge e as soluções existem.

Publicado em 10 Agosto 2011 às 14:40

Eles falaram uns com os outros! Esta informação deveria ser tranquilizadora. Em plenas férias de verão, os responsáveis dos principais Governos e autoridades monetárias ocidentais, os membros do G-7, conseguiram falar pelo telefone. O facto é elucidativo quanto à importância do momento. Mas, como não estão de acordo sobre quase nada, os políticos vão, mais uma vez, esperar pela reação dos mercados financeiros, antes de definirem uma atitude e de arquitetarem à pressa uma enésima solução de curto prazo.

A verdade é que a descida da notação norte-americana representa também o ocaso da sua política. Estão hoje a pagar o preço de não terem tomado nenhuma medida adequada, quando da crise de 2008 e da falência do Lehman Brothers. Por ideologia, por incompetência, por medo, os responsáveis políticos deixaram passar essa oportunidade única de retomar o controlo de um sistema financeiro, que funcionava sem qualquer disciplina. A curta trégua conseguida em 2009-2010 levou-os a pensar que tudo poderia vir a ser como antes. Mas negar a realidade não pode nunca ser a base de nenhuma política.

De bolha em bolha, de crise camuflada em crise oculta, o sistema, totalmente desligado da realidade, foi-se abaixo em 2007. A confusão atingiu o auge com a falência do Lehman Brothers, em setembro de 2008. Os bancos centrais disponibilizaram à pressa a liquidez necessária – e mais ainda, para evitar um descalabro geral. Os Governos foram em socorro de todas as suas instituições bancárias e tentaram salvar a economia. Se os Estados se encontram hoje numa situação limite, isso deve-se ao facto de terem apostado no resgate do sistema financeiro.

Chantagem permanente da banca

Mas os Governos não aprenderam com a falência do Lehman Brothers – ou, pelo menos, não tiraram dela as devidas lições. As conclusões gerais, inspiradas pelo mundo financeiro que nisso tinha todo o interesse, diziam que, acima de tudo, não se devia tocar nos bancos, sob pena de causar uma falência a nível mundial. E foi instituída a incerteza moral. Too big to fail, os bancos obtiveram o direito a uma chantagem permanente sobre os Governos e o direito de sugarem sem limites as finanças públicas. Em nome da garantia para os titulares de depósitos, evidentemente: tal como no caso dos pequenos acionistas que servem de álibi a um mercado bolsista que há muito os excluiu.

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Qual a contrapartida? Nenhuma. Nada de direito de controlo, nada de ter de prestar contas, nada de ter sequer de agir. Nada foi pedido, em nenhum momento, aos famosos detentores de obrigações, que deveriam assumir os riscos. O Reino Unido, que percebe indiscutivelmente melhor o sistema financeiro, foi o único país a nacionalizar os seus principais bancos. Nesta matéria, a França chegou, pelo contrário, a extremos caricaturais, ao encarregar Michel Pébereau, PDG do BNP Paribas, de elaborar o plano de salvamento dos bancos franceses.

As autoridades bancárias norte-americanas optaram por uma mistura de atitudes. Obrigaram os bancos a recapitalizarem-se. Dezenas de estabelecimentos bancários fecharam ou foram adquiridos por outros. Na zona euro, nada de semelhante. Os banqueiros sabiam o que faziam. Precisavam apenas que lhes dessem o tempo e o dinheiro necessário para procederem a alguns ajustamentos. Os testes de resistência foram uma anedota.

Contudo, nem mesmo as medidas anunciadas, devido ao pânico, nas cimeiras do G-20 de finais de 2008, começos de 2009, foram aplicadas. Recordemos: "Acabaram-se os paraísos fiscais! Acabaram-se as agências de notação! Acabou-se a especulação!"

Nenhum controle ou transparência

Os paraísos fiscais estão mais prósperos que nunca, depois da farsa do fim das suas prerrogativas, coberta pela OCDE. As agências de notação, novamente alvo de desfavor do público depois da descida da notação dos Estados Unidos, não se preocuparam nem por um segundo. Continuam a ser igualmente irresponsáveis. A Europa nem sequer criou a sua própria agência, como tinha prometido.

No que lhe diz respeito, a especulação cresce a olhos vistos. Não foi tomada qualquer medida, como por exemplo proibir as vendas a descoberto sobre as dívidas soberanas. As Credit default swaps [CDS, garantias em caso de incumprimento de pagamento de uma obrigação], arma de destruição massiva do mercado obrigacionista, continuam a ser um buraco negro: as transações escapam a qualquer controlo. Os europeus nem sequer têm forma de saber o que se passa: dependem totalmente de organizações privadas norte-americanas para obter qualquer informação.

A nova réplica da crise já não permite subterfúgios. O sistema esgotou-se a si mesmo. Mas como pagar a montanha de dívidas herdadas da desregulamentação do conjunto do sistema monetário e financeiro?

Em primeiro lugar, é urgente pôr termo à especulação. Os Estados não podem permitir a continuação desta devastação das economias, a pretexto de que não é conveniente tocar na livre circulação de capitais. Dispõem de armas, se quiserem servir-se delas. A proibição das vendas a descoberto sobre as dívidas soberanas talvez já não baste: talvez seja preciso um controlo momentâneo dos capitais, que passaria por uma mobilização dos bancos centrais.

Mudar o estatuto do BCE

Numa primeira etapa, a Europa deve estabelecer medidas destinadas a evitar os ataques do mundo financeiro às dívidas soberanas da zona euro. Um atrás do outro, os responsáveis políticos franceses pensam ter encontrado a solução milagre: o federalismo, dizem, pulando de entusiasmo. Em seu entender, isso implica o reforço do fundo de estabilização financeira, enquanto se espera pelas euro-obrigações. O problema é que a Alemanha é contra. E Berlim tem razão: porque isso equivale, nem mais nem menos, a voltar a jogar com o orçamento de todos os Estados, desta vez para contentar a alta finança. A verdadeira solução passa por uma alteração do estatuto do Banco Central Europeu, que deve aceitar ser o financiador de último recurso dos Estados da zona.

Em seguida, é preciso pôr termo a pouco e pouco à desordem do sistema financeiro e da economia da dívida. Apesar de ser importante pôr em ordem as finanças públicas e estabelecer um sistema de impostos justo, a redução dos défices orçamentais – a única política preconizada pelos Governos – não é a resposta para a enormidade do problema existente. Pode apenas levar à austeridade, à pobreza e ao fim de todos os aventureirismos políticos.

A montanha de dívidas é tal que, de qualquer modo, não bastará a adoção de um único mecanismo. De uma forma ou de outra, uma parte dos créditos deverão ser anulados, o que volta a colocar a questão do controlo do sistema bancário. Será preciso ainda proceder a desvalorizações monetárias para resolver o problema do excesso de liquidez criado, com a consequente perda de valor. Por último, é impossível continuar com os desequilíbrios industriais e comerciais existentes. Os países ocidentais não podem importar tudo, sem criar nenhuma riqueza, numa situação de desemprego massivo. Deve ser reconstruída uma base de produção digna desse nome.

Portanto, existem soluções. Mas estas estão muito longe dos dogmas e dos pontos assentes dos responsáveis políticos. Ainda assim, será preciso fazer qualquer coisa. Tentar ganhar mais tempo, adiar as opções, como podem ser tentados a fazer, poderá dar origem a uma catástrofe.

Contraponto

O fim das loucuras do “neossocialismo”

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Estamos atualmente a viver a “bancarrota do neossocialismo”, afirma Tomasz Wróblewski, editor-chefe do Dziennikk Gazeta Prawna.

Em 2008, jornalistas e ideólogos, tais como Naomi Klein e Grzegorz Kolodko [um economista polaco e antigo ministro das finanças], culparam o capitalismo por todo o mal no mundo. Depois de dois anos de intervenções do governo, pacotes de estímulo, nacionalizações, impostos mais elevados, regulações bancárias e plafonds salariais para os diretores executivos, o mundo não se tornou nem mais equitativo nem mais saudável.

Mas como escreve Wróblewski, “Esta segunda crise económica, orientada no sentido da recessão, não foi provocada por banqueiros insaciáveis ou corporações insensíveis. Os números vermelhos dos reportórios fiscais de todo o mundo são culpa dos governos que se estabeleceram depois de 2009 para salvar os mercados das forças de mercado.”

Segundo Wróblewski, esse período marcou “um breve, embora agressivo, episódio de justiça ao estilo socialista no mundo” quando “contrariamente ao senso comum, os políticos decidiram que podiam gerir o dinheiro melhor do que os bancos e que conseguiam gerir a oferta e a demanda melhor do que os mercados”.

Contudo “há males que vêm por bem e o mercado irá sempre impor a verificação da realidade perante estas loucuras de esquerda”, conclui Wrobléwski.

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