Na altura em que a República Checa assumiu a presidência europeia, no início deste ano, a impressionante variedade cultural do país, passada e presente, foi apresentada (para a Europa ver) como um grande trunfo.
O problema, é que a realidade vista pelos olhos dos artistas checos é menos brilhante. Não só a cultura não foi praticamente mencionada nos discursos oficiais dos ministros do Governo de Mirek Topolanek, como várias importantes personalidades culturais salientaram o facto de a República Checa ser um dos países que menos paga para estimular a cultura. O orçamento da Cultura, menos de 1% do PIB, é inferior à média europeia. A República Checa não tem legislação para a cultura e eventuais contribuições de pessoas ou instituições privadas não beneficiam de vantagens fiscais, como noutros países, em especial em França.
No tempo do comunismo, a República Checa era o país que representava melhor o modelo cultural em que era possível sobreviver passando através da censura. Um dos mais interessantes e influentes escritores europeus das últimas décadas, Milan Kundera, é checo. Mesmo entre os que permaneceram no país, contavam-se escritores e ensaístas de renome, como Vaclav Havel, Ludvik Vaculik, ou Bohumil Hrabal. Para surpresa dos ocidentais, Milan Kundera não é muito popular na República Checa, e o dramaturgo Vaclav Havel, ex-Presidente do país [o primeiro depois da queda do regime comunista], não é muito lido.
Para numerosos checos, as duas décadas de liberdade, após 1989, foram dominadas pela rivalidade e pela hostilidade que separam os dois checos mais conhecidos no estrangeiro: Kundera e Havel. Kundera tem fama de arrogante e é acusado de desinteresse pelo seu país, depois do seu exílio no Ocidente. Havel, em contrapartida, conseguiu criar uma imagem de patriota sempre pronto para o sacrifício. Esta imagem não basta aos seus compatriotas e ainda muito poucos checos o lêem; e os que o fazem já não são muito jovens. Apesar de tudo, a rivalidade entre Kundera e Havel continua a ser uma espécie de eixo em redor do qual evolui a vida cultural checa. Durante os seus 13 anos na Presidência do país, Havel evitou sistematicamente prestar a Kundera a mais pequena atenção oficial.
A cinematografia checa arrancou muito rapidamente, em 1991. Nos primeiros anos, assistiu-se, contudo, a uma espécie de empobrecimento dos temas e das formas artísticas. Foi como se o desaparecimento da censura acarretasse com ela a inspiração artística. Sem a grelha de interpretação e os constrangimentos da censura, numerosos artistas viram-se desprovidos do seu principal meio de expressão.
A isso acrescentam-se os constrangimentos do mercado. O artista, hoje, tem de criar para vender. A nova geração de cineastas conseguiu, após uns primeiros anos hesitantes, reintroduzir o filme checo no circuito internacional. Ao ponto de, em 1996, "Kolya", do realizador Jan Sverak, receber o Óscar para o Melhor Filme Estrangeiro. Mas também no cinema, como na literatura, o fosso de gerações é patente. A geração mais antiga não esperava que, uma vez recuperada a liberdade, a jovem geração fosse crítica para com a sociedade, e sobretudo para com a sociedade actual. Em vez criticarem o antigo regime comunista, os jovens criadores atacam o conformismo checo. Na República Checa, são produzidos hoje à volta de 15 a 20 filmes por ano, o que, para um país de apenas 10 milhões de habitantes, é considerado satisfatório. A maior parte dos filmes checos tem pequenos orçamentos – uma média de um milhão de euros.