Distinguir a burocracia da regulamentação

Os eurocéticos estão sempre a criticar a burocracia de Bruxelas, sobretudo desde a publicação, no dia 15 de outubro, de um relatório pelo Governo britânico. No entanto, nem todas as burocracias são más. As pessoas devem estabelecer uma distinção entre as burocracias inúteis e as regulamentações eficazes elaboradas para proteger os trabalhadores.

Publicado em 15 Outubro 2013 às 15:24

Burocracia ou regulamentação? Estas duas coisas são muito diferentes e é importante distingui-las. Ninguém é a favor da burocracia. A própria palavra tende a associar a si mesma a existência de um excesso de formalidades. A regulamentação é diferente. Ao contrário da burocracia, a regulamentação não é intrinsecamente isto ou aquilo. Parte dela é boa. Parte dela é má. A maior parte dos regulamentos é uma mistura de bom e mau. Tudo depende do regulamento e do que está a ser regulado.

Discutir a regulamentação não tem nada de errado. Mas haverá sempre a suspeita de que um debate organizado em torno da burocracia constitui, de certo modo, uma cortina de fumo que oculta a tentativa de eliminar tanto os bons como os maus regulamentos.

O relatório sobre a burocracia da UE, apresentado na terça-feira pelo Governo britânico, é um bom exemplo. Uma vez que ninguém é a favor da burocracia, as recomendações do business task-force [grupo de trabalho composto maioritariamente por diretores de empresas britânicas e organizações representativas de empresas britânicas, que também incluiu organizações representativas de empresas europeias] no sentido de que seja reduzido o âmbito [da regulamentação] da UE podem, à primeira vista, parecer decorrer do mero senso comum. Por outro lado, se começarmos a aprofundar a análise do relatório, as coisas tornam-se bastante mais complicadas. As questões colocadas têm pouco a ver com burocracia e bastante com a procura de um equilíbrio entre os interesses económicos dos empregadores e os interesses de segurança dos empregados.

Estratégia contra a burocracia

[[A aplicação dos regulamentos em matéria de saúde e segurança, por exemplo, pode de facto, como afirma o grupo de trabalho, constituir um encargo excessivo para as pequenas e médias empresas]]; mas também pode ser uma forma de impedir lesões desnecessárias e riscos e acidentes profissionais, talvez mesmo mortes. Neste debate, é preciso encontrar um equilíbrio entre os dois tipos de interesses. O mesmo se pode dizer em relação a outras áreas regulamentadas referidas no relatório – proteção de dados, informação não financeira, aprendizagem, trabalhadoras grávidas, horário de trabalho e trabalhadores temporários. Em todos os casos, há que realizar um debate legítimo.

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Contudo, agrupar todas estas questões sob o título de burocracia é simplesmente enganoso. E também distorce a maneira como encaramos a UE. Pela forma como o debate é organizado no Reino Unido, ninguém diria, mas muito daquilo que por vezes é rejeitado como sendo regulamentação da UE é uma tentativa em muitos casos bem sucedida (e, sim, em alguns casos mal sucedida) de simplificar, e não de complicar – substituir 28 sistemas nacionais diferentes por um único sistema. Se a UE não regulamentasse um domínio, isso seria sem dúvida feito por todos os governos nacionais e cada um deles fá-lo-ia à sua maneira.

Ao moldar o debate europeu em termos de burocracia, os partidos de direita colocam-se numa posição de vantagem política, porque três quartos dos cidadãos da UE consideram que há excesso de burocracia. Não há dúvida que as formalidades e a burocracia são problemas reais – como agora reconhece a Comissão Europeia, que adotou a ideia britânica e alemã de a aprovação de cada nova regra ter como contrapartida a abolição de uma velha regra. Os partidos de esquerda precisam de definir, também eles, uma estratégia firme contra a burocracia. Mas a tentativa de fazer cortes na proteção social, sob a capa de um ataque contra a burocracia, não deve fazer parte dessa estratégia.

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