Foto : Greg Westfall/Flickr

Novo escândalo abala Igreja

Depois de ter varrido os Estados Unidos e a Irlanda, as revelações sobre os casos de pedofilia dentro da Igreja Católica e nas suas instituições multiplicam-se na Europa. As autoridades nacionais decidiram intervir enquanto que as respostas da hierarquia eclesiástica e do Vaticano nem sempre têm estado à altura dos acontecimentos.

Publicado em 10 Março 2010 às 15:31
Foto : Greg Westfall/Flickr

No meio dos escândalos de abusos sexuais dentro de instituições da Igreja Católica alemã, a ministra da Justiça, Sabine Leutheusser, já adiantou que vai reclamar indemnizações aos bispos. Mesmo que os casos tenham prescrito (na Alemanha, este crime tem 10 anos de prazo para ser levado a tribunal), as vítimas deverão receber “uma remuneração económica”. “É uma questão de justiça, apesar da injustiça sofrida não poder ser compensada”, afirmou Leutheusser, do Partido Liberal FDP. O Governo anunciou que vai organizar uma mesa redonda [a 23 de Abril próximo] para tratar dos casos e a Conferência Episcopal já disse que estará presente.

A opinião pública alemã está escandalizada perante as novas revelações feitas pela principal estação de televisão da Alemanha, ARD, que, na segunda-feira, contou um novo caso de maus-tratos sistemáticos sobre menores num centro educativo religioso, para crianças autistas e com problemas psíquicos, da fundação protestante Educon. O Ministério Público de Dusseldorf está a investigar 17 educadores daquele instituto.

Enxurrada de denúncias

Por outro lado, a Conferência Episcopal holandesa decidiu, ontem, empenhar-se no esclarecimento das denúncias de abusos sexuais supostamente ocorridos em vários internatos do país, que abrangeriam pelo menos 200 pessoas, noticia a agência Efe. Os primeiros casos tiveram lugar nos anos 60 e 70 do século passado, num internato dos Salesianos, mas as denúncias estenderam-se, depois, a outras escolas do país. Os bispos estão “profundamente afectados com as chocantes histórias de abusos sexuais de que tiveram conhecimento nos últimos dias”, sublinhava uma declaração difundida depois da reunião, segundo informou a Rádio Netherlands. O assunto veio a público em Fevereiro, quando vários meios de comunicação publicaram denúncias de alunos de um centro na localidade de ‘s-Heerenberg (no Leste do país). O bispo da Diocese de Roterdão, Ad van Luyn, que era professor no internato em que supostamente tiveram lugar os abusos, negou que alguma vez tivesse tido conhecimento do que ali se passava. O De Telegraaf acrescentou ontemuma nova acusação: de um ex-aluno de um colégio de freiras, que contou ter sido abusado pelas religiosas, quando tinha 11 anos.

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Não são os únicos casos. Duas instituições religiosas austríacas – uma delas um internato – foram cenário de abusos sexuais a menores durante as décadas de 70 e 60, revelou, na terça-feira, a Imprensa austríaca. O Padre Superior da Abadia de St. Peter, em Salzburgo (no centro da Áustria), Bruno Becker, admitiu ter abusado de um rapaz de 12 anos, há mais de 40 anos. O sacerdote contou, ainda, que em 2009 informou as autoridades da Igreja Católica sobre este caso, depois de a vítima ter entrado em contacto com ele. Nesse mesmo ano, o padre Becker escreveu uma carta à sua vítima propondo-lhe 5 000 euros a troco do silêncio sobre este crime que, juridicamente, está prescrito. A vítima, no entanto, chamou a atenção para o facto de ter sido abusado sexualmente por outros dois sacerdotes. Um deles abandonou a ordem religiosa e o outro pediu para ser transferido para outro convento. Foram ambos detidos em Marrocos, em 2005, por fazerem turismo sexual.

Igualmente, em Vorarlberg (no Oeste da Áustria), foram revelados, terça-feira, casos de pederastia a um menor, nos anos 80, aluno de um internato privado de ensino secundário, do mosteiro cisterciense de Mehrerau. O autor do crime reconheceu os seus actos e foi transferido para o Tirol austríaco (no Oeste do país).

Esta enxurrada de denúncias obrigou o Vaticano a reagir. O seu porta-voz da Santa Sé, Federico Lombardi, saiu, ontem, em defesa das Conferências Episcopais da Alemanha, da Áustria e da Holanda, garantindo que souberam encarar os escândalos de abusos sexuais “atempadamente e com decisão”, e sublinhou que nem só na Igreja Católica têm lugar este género de delitos. De facto, lembrou que durante a época em que tiveram lugar os abusos na Áustria, as autoridades reconhecem que houve 527 casos, dos quais só 17 tiveram lugar dentro de instituições da Igreja Católica e os outros 510 ocorreram noutras instituições.

Reacções

A Igreja oscila entre a sanção e a negação

Perante a multiplicação de escândalos em que se vê envolvida, a Igreja foi obrigada a reagir. Assim, escreve o Le Figaro, “a lei do silêncio, que até aqui presidiu à gestão dos casos de padres pedófilos, foi abolida e, em sua substituição, estão a ser postos em prática programas de ‘tolerância zero’”. Apesar disso, a suspeita pesa sob o Vaticano, que é acusado de obstruir os inquéritos – em 2001, o futuro Papa Bento XVI pediu aos bispos para “tratarem apenas em Roma, no âmbito da Congregação para a Doutrina e a Fé”, de que era ele próprio o responsável, os casos de pedofilia – e de subestimar o fenómeno. “O Cardeal Claudio Hummes, perfeito da Congregação para o Clero admitiu, em 2009, que os casos de pedofilia verificados entre os padres atinge uma média de 5% dos sacerdotes”, escreve o diário italiano Libero. Conclusões corroboradas pela Conferência Episcopal dos Estados Unidos, bem como por vários estudos que indicam que, entre os religiosos, esta taxa é 100 vezes superior à da média da população.

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