O bosão da Europa

Publicado em 6 Julho 2012 às 14:04

É a indispensável partícula elementar, a que explica porque existe o universo e os seus componentes lhe dão consistência. Sem ela, acredita-se, o grande projeto é incompreensível. Só tem um problema: é apenas teórica.

Na esperança de a descobrir, é preciso fazer experiências longas e dispendiosas. Fazer girar continuamente matéria dotada de forças, por vezes complementares e frequentemente opostas. Alguns temem que a colisão dessas forças entre si ou contra obstáculos inesperados faça falhar a experiência, nomeadamente provocando uma explosão do laboratório. Mas se não for possível demonstrar a existência dessa partícula, este universo parecerá cada vez mais artificial aos nossos olhos e corre o risco de entrar em colapso.

Sem o bosão da Europa, a partícula que é pertença comum, a construção europeia acabará por ser apenas um modelo de ciência política, inaplicável a longo prazo. Numa altura em que a ciência acaba de dar um passo decisivo, com a descoberta quase certa do bosão de Higgs, o grande acelerador europeu não produz, para já, senão respostas divergentes.

Esta semana, o Parlamento Europeu rejeitou o tratado anticontrafação ACTA rejeitou o tratado anticontrafação ACTA. Uma decisão que acentua o contraste entre duas forças do universo europeu: o Parlamento opondo-se à Comissão Europeia, que defendia o tratado. Mas uma decisão vista como um passo em frente em matéria de democracia, uma vez que o texto era contestado por cidadãos ativos de toda a Europa.

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Dias antes, a decisão dos dirigentes dos países da zona euro de aprovar o pacto de crescimento e prosseguir na senda de uma união bancária havia libertado as forças centrípetas do universo europeu. A Dinamarca fez saber que se contentava com uma UE a duas velocidades. Uma minoria cada vez mais forte de deputados alemães opôs-se à flexibilização das condições de apoio a bancos e países em dificuldades. O primeiro-ministro britânico foi forçado a recordar um referendo sobre a UE, numa atmosfera de crescente questionamento da presença do Reino Unido na UE. E a ministra das Finanças finlandesa garantiu que o seu país preferia deixar o euro a pagar as dívidas de outros países.

Enquanto isso, o chefe de Estado cipriota, Dimitris Christofias, inaugurava a presidência rotativa da UE do seu país e expressava o seu reconhecimento à Rússia, que é menos exigente do que a UE em matéria de prestação de assistência financeira.

Neste universo caótico, em que os jogos políticos, as preocupações sobre os inconvenientes de uma solidariedade financeira, a crise e os seus sintomas criam turbulências adicionais, poderá um dia surgir esse bosão da Europa que permitirá estabilizar o projeto de uma União Europeia próspera e democrática. Mas vai ser necessária muita sabedoria e tato por parte dos nossos dirigentes.

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