Revista de imprensa Julgamento Ergenekon na Turquia
Lors des manifestations devant le tribunal de Silivri (Turquie), le 5 août 2013.

“O julgamento de uma maneira de pensar”

A 5 de agosto, o tribunal de Silivri, perto de Istambul, decretou a sua sentença sobre o caso Ergenekon, uma conspiração nacionalista destinada, segundo o poder, a derrubar o governo islâmico-conservador de Recep Tayyp Erdoğan nos anos de 2000. Uma decisão tão marcante quanto controversa, defende a Imprensa turca.

Publicado em 6 Agosto 2013 às 16:53
Lors des manifestations devant le tribunal de Silivri (Turquie), le 5 août 2013.

O “processo do século”, como os jornais lhe chamaram, acabou com a condenação a prisão perpétua para cerca de vinte dos acusados, entre os quais estão muitos militares de alta patente, jornalistas e políticos da oposição kemalista. Mais de 250 outras pessoas foram condenadas a penas de prisão mais leves e 21 foram absolvidas.

No diário pró-governamental Yeni Safak, o editorialista Abdülkadir Selvi congratula-se com as penas aplicadas mas pergunta se “o processo Ergenekon acabou mesmo?” e se se deve ficar por aqui. Selvi lembra, de facto, que em 1997, o exército derrubou o governo de coligação liderado pelo partido Refah, o antepassado do AKP de Erdogan, e que, em 2007, também foi o exército que fez uma tentativa de “golpe de Estado eletrónico”, ao publicar no sítio de Internet do estado-maior uma advertência contra a esperada eleição do candidato à presidência da República do AKP, Abdullah Gül:

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Houve, entre nós, inúmeros golpes de Estado mas, curiosamente, nunca houve processos judiciais contra esses golpes. Mas, hoje, isso mudou. De facto, a Turquia, vítima de golpes de Estado militares, pede agora contas. Neste contexto, a sentença do processo Ergenekon reveste-se de uma importância histórica especial. Mas ainda faltam peças neste tabuleiro. De facto, uma vez que o general Başbuğ foi condenado a prisão perpétua, não deveríamos também julgar o general Büyükanit, que mandou redigir a advertência de 27 de abril de 2207, bem como o general Evren [chefe da junta saída do golpe de Estado de 1980]? Sem falar dos golpes de Estado de maio de 1960 e de março de 1971. A questão, aqui, não é julgar velhos e mortos, mas punir o facto de se fazer um golpe de Estado.

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O sítio de Internet independente T24, Aydin Engin escreve que há

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efetivamente, entre os suspeitos julgados no processo Ergenekon pessoas que, para criarem as condições para um verdadeiro golpe de Estado, organizaram ações legais (por exemplo, manifestações apelando ao exército “para cumprir o seu dever”) e ilegais (como o assassinato de missionários cristãos em Malatya, em abril de 2007, os esconderijos de armas e também o atentado contra o Conselho de Estado, em 2006). Tratam-se, evidentemente, de crimes graves que merecem ser julgados […], mas também convém olhar para outro aspeto deste processo. De facto, a Justiça turca desacreditou-se neste processo pelo excesso de revanchismo primário. Assim, ao mesmo tempo que foram julgadas pessoas que cometeram crimes graves, o processo contra a rede Ergenekon ficou seriamente manchado por processos de intenção, pelo processo contra uma maneira de pensar.

O diário kemalista Cumhuriyet, de que um dos jornalistas, Mustafa Balbay, foi condenado a trinta e quatro anos e oito meses de prisão, considera por seu lado que este processo é apenas

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uma vingança política, orquestrada pelo governo do AKP.

Finalmente, no jornal Vatan, o escritor e editorialista Zülfü Livanelli, antigo preso e exilado político na década de 1970, denuncia igualmente um veredicto “que atingiu um grande número de inocentes, condenados com base em testemunhos anónimos e em afirmações nunca provadas”, o que “lança uma terrível sombra sobre o veredicto”:

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Não foi feita justiça porque, ao lado dos culpados, foram punidos inocentes. Espero que os juízes do Tribunal de Cassação restabeleçam a Justiça.

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