Uma destas tardes, aconteceu-me uma coisa mágica. Aos 38 anos, comi os primeiros vegetais que eu próprio cultivei. Era um simples cebolinho, muito embora, na minha boca, tivesse um sabor a orgulho e conquista.
Quantos serão os ministros do ambiente da UE, reunidos no Luxemburgo, dia 25 de Junho, que produzem os seus próprios alimentos? Não faço esta pergunta porque me parece que o êxito da minha história com os cebolinhos me dá de repente mais legitimidade ecológica do que os mestrados políticos europeus. Faço-a porque duvido que muitos deles sintam qualquer ligação emocional com a terra, a julgar pela arrogância com que a menosprezam.
Há três anos, a Comissão Europeia apresentou um quadro legal sobre protecção dos solos, que, continua por aprovar, porque a França, Reino Unido, Alemanha, Áustria e Holanda se opõe a um plano que consideram demasiado oneroso, ou que a questão dos solos é um assunto que deveria ser deixado para as administrações nacionais.
As razões apresentadas para rejeitar o projecto são falsas. Longe de ser demasiado onerosa, a proposta não avança o suficiente no sentido de obrigar os governos a proteger um bem sem o qual ninguém consegue viver. Os políticos e os funcionários públicos das regiões com uma fraca qualidade do solo não têm razão para ter medo que os eurocratas de Bruxelas os enganem com notificações. Em vez de uma actuação de emergência, a legislação exigiria apenas que os governos identificassem as áreas assoladas por problemas como, por exemplo, salinização e erosão do solo e fizessem um inventário das áreas contaminadas, juntamente com planos para a reabilitação desse tipo de terra.
A saga da protecção do solo é uma prova problemática do modo como a estratégia da UE em matéria ambiental padece de ideias compartimentalizadas. Foi criada legislação com carácter obrigatório em matéria de ar e água, mas não existe uma regulamentação comunitária semelhante em matéria de solo. Qualquer criança inteligente seria capaz de perceber que tudo isto está intimamente ligado. Mas, alegadamente, políticos e funcionários com altos estudos não entendem que é uma palermice tentar proteger umas coisas e negligenciar outras.
A relutância da Grã-Bretanha em apoiar o plano é mais um exemplo da retórica falaciosa de Tony Blair e Gordon Brown sobre alterações climáticas. Convenientemente tratado, o solo pode agir como se fosse um “poço” de carbono, absorvendo cerca de 20% de todas as emissões humanas de dióxido de carbono. Com o solo estragado, no entanto, a situação inverte-se. Em vez de absorver, o solo liberta CO2. A cada ano que passa, o solo britânico perde cerca de 0,6% de matéria orgânica e o aumento daí resultante em emissões de CO2 seria quase equivalente à entrada em circulação de cinco milhões de novos carros. Esta questão foi um sério problema durante várias décadas: entre 1980 e 1995, o solo britânico perdeu 18% de matéria orgânica. Em 2004, a Agência do Ambiente afirmou que a degradação do solo, em Inglaterra e no País de Gales, devido a factores como, por exemplo, agricultura intensiva e má gestão das florestas, era insustentável.
Por toda a UE, milhares de áreas foram sendo poluídas devido a práticas industriais imprudentes; ninguém sabe ao certo a dimensão total destes danos, atendendo à quase inexistência de dados. A Comissão, entretanto, calcula que a degradação do solo custe à economia comunitária 38 000 milhões de euros ao ano - provavelmente um cálculo moderado.
O solo não pode ser protegido da restante degradação com gestos simbólicos. Uma estratégia alargada e eficaz passaria pela reforma da política industrial e agrícola e por uma atitude mais sensata em termos de gestão de resíduos. Mas parece ser uma estratégia remota, tanto mais que os nossos governos nem conseguem pôr-se de acordo em relação a regras mínimas. É difícil não entrar em desespero.