Raed Arafat, um palestiniano vindo da Síria, sempre foi popular entre os romenos, que se sentem próximos do homem que fundou o Serviço Móvel de Urgência, Reanimação e Desencarceramento (SMURD).
Nascido em Damasco, em 1964, Raed Arafat descobriu, aos 14 anos, a sua paixão por "primeiros socorros". No liceu, criou a primeira equipa de emergência, com alguns colegas. A medicina, inicialmente uma simples paixão, tornar-se-ia um ideal profissional. O pai queria que estudasse na escola profissional politécnica; mas Raed tinha prometido a si mesmo "ser médico ou então varredor de lixo”.
O inimigo da reforma da saúde
Aos 16 anos e meio, foi para a Roménia, porque, conta, "foi o país que respondeu mais rapidamente ao meu pedido de admissão na Universidade [o regime comunista de Nicolae Ceausescu tinha montado um sistema que permitia aos cidadãos de países árabes estudarem na Roménia]. Mais tarde, descobri que também tinha sido admitido na Grécia e nos Estados Unidos. Mas os meus pais não me contaram da resposta dos EUA, com medo que eu fosse para lá e nunca mais voltasse. Esperavam que, da Roménia, voltasse", explica. Em 1989, depois de se formar, teve a possibilidade de ir para França.
Mas em dezembro, devido à revolução que eclodiu na Roménia, a obtenção de vistos foi congelada e Raed permaneceu em Bucareste.
Vinte anos depois da fundação do SMURD, em 1991, Raed Arafat acredita que o sistema de urgências na Roménia mudou: "Agora, os bombeiros desempenham um papel essencial na resposta de emergência. É o mesmo sistema que vigora na maioria dos países da UE. Os bombeiros e a sua mentalidade militar desempenharam um importante papel na evolução do sistema romeno."
A primeira equipa de emergência utilizou o seu próprio carro. Isso até uma antiga colega de faculdade, que exercia na Alemanha, angariar fundos e ajudar a comprar uma velha ambulância, para dar ao SMURD. Posteriormente, receberam doações da Cruz Vermelha Norueguesa.
Raed Arafat não desistiu de praticar medicina, mantendo ainda agora turnos no serviço de helicóptero. Muitas vezes, ouviu dizerem nas suas costas: “Olha, o árabe veio para cá ensinar-nos medicina!". Mas, como ele mesmo diz: "Este árabe aprendeu medicina na Roménia, sou um produto da Roménia!"
Em 12 de janeiro, o subsecretário de Estado da Saúde nomeado em 2007 transformou-se no "inimigo da reforma da saúde": é assim que Arafat descreve o atual Presidente da República, Traian Basescu, que fez uma intervenção em direto, por telefone, num programa de televisão em que o médico denunciava a entrada de capital público em unidades de intervenção privadas.
A confiança dos romenos
Raed Arafat insurgia-se contra a reforma do seu serviço e contra a privatização dos hospitais públicos. Imediatamente após a chamada de Basescu, demitiu-se. Em direto. [Mais tarde, reingressou nos serviços, veja-se a caixa abaixo].
A privatização da saúde pública representa cerca de 4,5 mil milhões de euros, dos quais 1,5 mil milhões provenientes de companhias de seguros privadas e da venda de bens públicos. A maioria dos romenos está preocupada que se chegue a uma situação em que os cuidados de saúde deixem de ser uma obrigação do Estado, e que a morte seja o que resta a quem não tiver dinheiro e um seguro de saúde.
Outros dizem que a privatização dos hospitais e a introdução de seguros privados irá proporcionar uma grande fatia de mercado, que vai beneficiar empresários e políticos próximos do Governo.
Basescu acabou por pedir ao Governo de Emil Boc para retirar o seu projeto de reforma da saúde, argumentando que "ninguém dentro do sistema quer mudanças e muito poucos fora dele o desejam: os hospitais não querem mudar, os médicos de família não querem mudar, o sistema de emergência não quer mudar”.
Talvez Raed Arafat não seja o cavaleiro branco descrito na imprensa dos últimos dias. Mas ao contrário dele, Traian Basescu não tem a confiança dos romenos: o político que defronta o perito no seu campo de atividade prefere confiar a sua saúde a médicos de Viena de Áustria! Mas o golpe de misericórdia em termos de imagem para Basescu viria de pessoas consideradas suas partidárias, como o seu próprio subsecretário de Estado.
Como salienta Alina Mungiu-Pippidi, presidente da Sociedade Académica da Roménia, a propósito da reforma agora posta de lado, "a lei foi concebida de forma antidemocrática e pouco profissional. O Estado deve promover pessoas capazes, como Arafat, em vez de as afastar”.
Notícias de última hora
Demissão e reintegração
“O segundo compromisso do Presidente”, titula Adevărul, após Traian Băsescu ter aceitado retirar o seu projeto de reforma da Saúde e pedido a Raed Arafat para voltar atrás na sua demissão. No dia 17 de janeiro, cinco dias após ter publicamente desistido do seu cargo no Ministério da Saúde, o fundador das urgências nacionais aceitou reintegrá-lo. Respondendo portanto ao apelo do chefe de Estado e do primeiro-ministro que esperam apaziguar as manifestações que abalam o país desde a demissão de Arafat. Este último fará parte do comité de especialistas responsáveis pela elaboração de uma nova reforma do sistema de saúde.
“Ninguém é tão popular como ele na Roménia”, observa o Adevărul, que considera que Arafat conseguia mais do que um cargo como subsecretário de Estado. “Ele podia aspirar ao cargo de ministro da Saúde, uma vez que tinha o apoio do povo que, neste momento, vale mais do que o dos políticos”. Porém, alerta o diário, o seu regresso ao Governo não significa que os protestos vão acabar, na medida em que os seus simpatizantes “pedem agora mais do que a simples satisfação dos pedidos de Arafat”.