Presidente François Hollande no Palácio do Eliseu, em Paris, a 26 de junho de 2012.

Teremos sempre Paris

As dificuldades económicas enfrentadas pela Grécia, Espanha e Itália, assim como a complexidade da Alemanha na tomada de decisões, estiveram durante muito tempo no centro das atenções. Mas existe um país que continua a ser crucial para o futuro da Europa, onde o debate sobre a Europa poderá ser retomado: a França de François Hollande.

Publicado em 6 Julho 2012 às 14:40
Presidente François Hollande no Palácio do Eliseu, em Paris, a 26 de junho de 2012.

A virulência da crise da dívida e a instabilidade que, nos últimos meses, se apoderou da zona euro fizeram com que as atenções se concentrassem em Espanha e em Itália. Com a Grécia, Portugal e a Irlanda sob intervenção, a pergunta que toda a gente tem vindo a colocar é até onde e até quando os Governos de Mariano Rajoy e Mario Monti aguentariam a pressão e o que aconteceria, caso, finalmente, se avançasse para uma intervenção completa em Espanha e/ou Itália.

A urgência e a dificuldade de salvar a Espanha e a Itália contribuíram para pôr em destaque a importância da Alemanha e, por várias vezes, destacaram Angela Merkel como a pessoa que tinha nas suas mãos a capacidade de resolver o problema da Europa.

Do mesmo modo que a crise obrigou os cidadãos a adquirirem as noções básicas de economia necessárias para perceberem e avaliarem as soluções que vão sendo adotadas, a posição predominante da Alemanha nesta crise tornou imprescindível que nos inteirássemos das complexidades do sistema político, da economia e da opinião pública daquele país.

Por isso, na Europa da crise, aprendemos a prestar atenção às eleições regionais na Alemanha, aos pareceres do seu Tribunal Constitucional, aos processos de ratificação dos acordos europeus, à fragilidade ou força dos parceiros liberais ou bávaros do Governo da CDU, às posições do presidente do Banco Central alemão e às clarificações que, uma vez no Governo, a oposição social-democrata poderia introduzir no que se refere às euro-obrigações.

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União política novamente em cima da mesa

Aprendemos que a Alemanha tem um sistema político muito complexo, no qual o poder se encontra muito repartido entre uma série de instituições fortes e independentes, que limitam seriamente a capacidade de atuação de Angela Merkel.

Entretanto, em França, verificava-se o contrário. A enorme concentração de poder que a Constituição da V República confere ao Presidente, juntamente com a hiperatividade compulsiva de Sarkozy, permitia que toda a atenção se centrasse no papel do Presidente e simplificava em muito as análises.

No entanto, conforme começou a vislumbrar-se durante a campanha eleitoral, por trás do seguidismo de Sarkozy agitava-se uma França extremamente complexa, que passava por uma série de dúvidas existenciais: dúvidas sobre a sua identidade nacional, dúvidas sobre o seu modelo económico, dúvidas sobre a integração europeia e dúvidas sobre a globalização.

Essas dúvidas limitaram enormemente a margem de manobra do centro-direita francês e obrigaram-no a reproduzir os postulados da direita nacionalista e xenófoba, que a Frente Nacional de Marine Le Pen representa.

Também restringiram – em larga medida – a margem de manobra do centro-esquerda, obrigado a conviver com uma esquerda que se opõe fortemente à globalização e se sente cada vez mais distanciada do processo europeu, que encara como uma globalização com pele de cordeiro que procura destruir o Estado-Providência e intervencionista, que constitui uma das marcas distintivas da identidade da França.

De forma inesperada, uma vez que se pensava que o referendo constitucional de 2005 a tinha enterrado definitivamente, a união política voltou agora a cair no prato da esquerda francesa. Hollande enfrenta esse desafio, numa posição nada invejável.

Tornar a Europa mais eficaz

Por um lado, quase dois em cada três eleitores que o colocaram no Eliseu votaram contra a Constituição Europeia, em 2005. Por outro, a difícil situação das finanças públicas da França, posta em destaque esta semana pelo Tribunal de Contas, torna inevitável que as negociações sobre a fase seguinte da união económica e política coincidam temporalmente com uma série de cortes orçamentais significativos, que irão gerar resistência política e social.

À medida que for associando os progressos na integração europeia com uma nova redução da margem de autonomia do Estado para pôr em prática políticas de esquerda e interpretando a união política como uma nova pressão sobre o seu modelo social, a opinião pública francesa não deixará de reagir vivamente contra aquilo que irá considerar não como uma união política mas sim como uma institucionalização encoberta do modelo económico alemão e das políticas de austeridade no espaço europeu.

Tal como aconteceu nos anos 1990, quando se preparava a união económica e monetária, e também na década passada, quando se discutiu a Constituição Europeia, a esquerda francesa terá que decidir até que ponto a união política e económica com a Alemanha contribui para preservar e, eventualmente, para revitalizar o seu modelo económico ou, pelo contrário, para garantir e tornar irreversível o seu declínio.

O desafio enfrentado por Hollande consiste portanto em conseguir uma Europa mais eficaz, o que requer maior integração e, por conseguinte, cedência de soberania, mas na qual, simultaneamente, a diversidade de modelos económicos e sociais seja respeitada, e não sufocada. Não será fácil, porque a França de hoje ocupa uma posição muito inferior à da Alemanha.

Economia

França escolhe um caminho diferente

O Presidente francês, François Hollande, está a desafiar a ortodoxia defendendo que a responsabilidade fiscal deve envolver cortes em vez do aumento dos impostos, uma opinião partilhada no editorial do Irish Times:

O duro comentário de que “não existe alternativa para a austeridade” abriu caminho a um consenso geral de que somente medidas de austeridade destruirão o crescimento e a uma abordagem, de certa forma mais compreensível, à situação dos que estão extremamente endividados.

O novo Governo de Hollande pretende equilibrar os registos este ano, com cerca de 7,2 mil milhões de euros em impostos extra, atingindo sobretudo os mais ricos e as maiores empresas. Estes incluem:

a diminuição do limite do imposto sobre a riqueza e a imposição de um imposto único aos que têm uma riqueza bruta acima de 1,3 milhões de euros; uma restrição no imposto de sucessão; taxas mais elevadas para bancos, companhias petrolíferas e dividendos; o aumento da taxa social única; e a duplicação da taxa sobre as transações financeiras para 0,2 por cento. No outono, [François Hollande] irá lançar o seu programa de reformas de grande alcance, incluindo uma taxa de 75 por cento sobre os rendimentos acima de um milhão de euros. Também aplicou novas taxas aos proprietários de casas de férias – só no Reino Unido existem 200 mil – o que causará muitas dificuldades às autoridades britânicas.

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