A bela primavera dos eurocéticos

O resultado do Verdadeiros Finlandeses, a 17 de abril, foi a última manifestação: por toda a Europa, os eurocéticos estão cada vez mais virulentos e a sua retórica bem cimentada permite-lhes fazerem-se entender tanto à escala nacional como europeia.

Publicado em 19 Abril 2011 às 14:58

Peter Gauweiler nunca gostou do euro, essa “moeda esperanto”, como lhe chamou, à semelhança da língua internacional que ninguém fala. “Se realmente quiséssemos ajudar a Grécia ou Portugal, dizíamos-lhes para saírem da Europa”, declarou esta semana o representante do CSU. As acusações de populismo deixam-no indiferente. “Isso quer dizer, apenas, que sei o que as pessoas pesam.”

Gauweiler talvez não saiba o que “eles” pensam mas sabe o que um número crescente de europeus quer: sair do euro. Num grande número de países, o estado de crise permanente, as políticas de austeridade e os planos de estabilização alimentam o descontentamento popular contra a moeda única.

Em França, a Frente Nacional grita contra o euro, na Holanda, os populistas do PVV (Partido para a Liberdade, fundado por Geert Wilders) exigem o regresso do florim e os discursos hostis ao euro do Verdadeiros Finlandeses permitiram-lhe ser o terceiro partido do país nas eleições legislativas de 17 de abril. Sem esquecer o papel dos mercados financeiros: “O risco económico ligado à união monetária está em vias de se transformar em risco político”, sublinha Thomas Mayer, um dos economistas principais do Deutsche Bank.

UE e FMI são os principais acusados

Porque, apesar das ajudas ao crédito e do reforço do pacote de estabilidade, a crise do euro está longe do fim. Os Estados periféricos reduziram as despesas sociais de maneira drástica. Os impostos aumentam, os salários baixam, as pensões desvalorizam-se, por todo o lado o Estado recua e a pobreza avança. Por isso, hoje, são muitos os dedos acusadores que apontam para a União Europeia e para o Fundo Monetário Internacional. A ira cresce.

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Enquanto isso, uma coisa é certa: Portugal, Espanha, Irlanda e Grécia vão ter de poupar muito mais do que até agora se pensava. Numa conjuntura difícil, a economia afunda-se e as receitas do Estado também, aumentando ainda mais o défice público, apesar de todos os planos económicos. “A política de estabilização levada a cabo na Grécia, para o ano de 2011, ameaça acabar em fracasso”, inquieta-se Christoph Weil, economista do Commerzbank. A situação orçamental de Espanha e da Irlanda não melhorou no início do ano e Portugal vai ter de adotar novas medidas de estabilização.

Tentando relançar as suas economias através das exportações, todos os países em crise se esforçam por reduzir os salários para melhorarem a competitividade face a outros países, como a Alemanha. Os rendimentos dos cidadãos estão sob pressão e o consumo baixa. Existe um “risco de excesso de rigor”, previne o banco Société Générale e acrescenta: “É um jogo perigoso”.

Nos países atingidos pela crise, cresce o descontentamento contra o euro. “Os eurocéticos constituem uma força política na Irlanda e aguardam a sua hora”, sublinha Hugo Brady, do think tank Centre for European Reform. Mas a ira cresce, igualmente, nos países mais ricos como a Finlândia, a Alemanha e a Holanda, que se consideram os tesoureiros da Europa. “Manter as ajudas financeiras aos Estados à beira da falência vai traduzir-se em tensões políticas”, profetiza o principal economista do Deutsche Bank.

Construção europeia serve de para-raios

É com isto que jogam os partidos de direita. O Verdadeiros Finlandeses declarou-se contra o plano de ajuda a Portugal. A recente vitória deste partido pode acabar por criar um problema à União Europeia. Um Governo finlandês eurocético poderá, de facto, bloquear todas as decisões europeias que exijam unanimidade.

Em França, a Frente Nacional também marca pontos com a sua retórica antieuropeia. “A União Europeia é uma estrutura que considero como totalitária, é a União Soviética europeia”, declarou Marine Le Pen. Na Holanda, o presidente do PVV, Geert Wilders pronuncia-se contra as ajudas financeiras concedidas à Grécia. “Nós trabalhamos, eles festejam. Enquanto nós nos esforçamos, eles só pensam em beber ouzo [aguardente típica da Grécia]”, disse Wilders, perante os deputados holandeses. “No PVV dizemos: nem um cêntimo para a Grécia! E ainda menos para os portugueses e os espanhóis!”

Estas palavras, ainda há pouco tempo marginais, preocupam, agora, os meios financeiros. “A conjuntura económica agrava-se, é o clima propício ao desenvolvimento das ideias de extrema-direita”, escreve Dylan Grice num estudo feito para os investidores do banco Société Générale. Geralmente, a direita está contra tudo o que é estrangeiro ou externo, nomeadamente os imigrantes. E parece ter encontrado um novo bode expiatório na moeda única europeia. “Todos os países membros da zona euro se sentem controlados pelo estrangeiro. A construção europeia desempenha a função de para-raios”, escreve Grice.

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