Imagem do fime "Tuukrid Vihmas" (Mergulhadores na chuva), de Priit Pärn.

A melancolia como “marca da casa”

Desde a independência que o cinema da Estónia parece incapaz de produzir filmes em que a melancolia não detenha o papel principal, observa o Postimees, segundo o qual essa é, nem mais nem menos, a marca da cultura nacional.

Publicado em 19 Setembro 2011 às 12:38
© 2010 Eesti Joonisfilm  | Imagem do fime "Tuukrid Vihmas" (Mergulhadores na chuva), de Priit Pärn.

Apesar de um vislumbre de esperança, as criações dos nossos grandes mestres cinematográficos, Veiko Õunpuue Sulev Keedus, deixam-nos tristes. Uma obscuridade avassaladora caracteriza igualmente os nossos filmes de animação, muito apreciados a nível mundial. Tanto as obras clássicas como as de autores contemporâneos nos retiram a esperança pois tudo é visto através de colorações sombrias. Na verdade, será a vida tão triste como a descrevemos?

Vejamos mais além : as obras de Tammsaare [grande clássico da literatura estónica] que descrevem a dura vida dos agricultores, os quadros sombrios do pintor Kristjan Raud e os oratorios de Rudolf Tobias são apenas alguns exemplos no mesmo sentido. Assim sendo, ninguém questiona a qualidade artística do espaço cultura da Estónia, podemos apenas interrogar-nos sobre a origem desta melancolia dominante. Temos, com certeza, muitos humoristas, como Andrus Kivirähk, ou boas comédias, mas sentimos por todo o lado a presença de uma certa angústia, tipicamente estónica. Quer isto dizer que a cultura estónica é realmente demasiado melancólica? E sendo esse o caso, será um problema?

Por razões históricas, o pessimismo e a melancolia fazem parte, quase naturalmente, da cultura da Estónia. As longas noites de inverno, que duram meio ano e tornam os estónios apáticos, geram tristeza e nostalgia. No verão, a aridez também não traz alegria.

A finalidade da arte é ajudar as pessoas

Simultaneamente, estes rostos cansados que encontramos nos autocarros, esperam que lhes ofereçamos coisas com um aspecto diferente do seu quotidiano. Não seria a cultura quem deveria "injetar" neles a esperança e algum divertimento? Não estou a pensar, necessariamente, em peças cómicas, em músicos de rua ou em grafitos irónicos que criticam a sociedade. Bastaria tratar estes assuntos sérios de uma forma mais leve.

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Por vezes esquecemos que o objetivo da arte não é apenas apontar os problemas mas também ajudar as pessoas. O público lê, ouve, olha e procura identificar-se com as obras. Na opinião do semiólogo Umberto Eco, cada autor deveria ter o seu "leitor modelo" ou o seu grupo alvo. Mas, na Estónia, muitas vezes não sabemos se o autor compreende as expectativas do seu público, o que conduz à criação de um fosso entre o público e o artista. E a uma forma de snobismo por parte deste em relação ao público, ignorante demais para compreender a sua arte.

É evidente que a cultura estónica é suficientemente heterogénea para que cada um encontre nela o seu nicho. Mas a impressão geral é bastante esmorecida, principalmente quando comparada com a cultura finlandesa que tem algum humor. Se a Estónia pudesse ser como a Finlândia, que não conheceu a ocupação soviética, os estónios poderiam também, como o cineasta finlandês Aki Kaurismäki ou o escritor Juha Vuorinen, tratar a depressão quotidiana com um pouco mais de humor.

Certamente que a vida não é só beber sangria nos pátios interiores da cidade velha em pleno verão ou escutar música de janelas abertas, mas o essencial da atualidade que nos chega diariamente é suficientemente deprimente para que a cultura da Estónia, por mais modesta e, no entanto, diversificada que seja, não estabeleça com ela uma ligação permanente.

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