A união reduz o preço da fatura

Ao contrário da intenção de Bruxelas, a liberalização do mercado da eletricidade, há dez anos, traduziu-se num aumento generalizado das faturas pagas pelos europeus. Para fazer frente a esta tendência, os consumidores associam-se e obtêm deste modo tarifas mais vantajosas.

Publicado em 18 Setembro 2013 às 15:38

Desde 1 de janeiro de 2003 que todos os consumidores de eletricidade em Espanha têm a possibilidade de escolher a empresa fornecedora. Foi assim que começou o longo processo, ainda não concluído, de liberalização do setor energético, que, em teoria, deveria ter conduzido a uma redução do montante da fatura da luz. Esperava-se que, à semelhança do que aconteceu no mercado da telefonia, a concorrência entre empresas desse origem a ofertas interessantes, para atrair clientes. Uma década depois, não só isso não aconteceu como a fatura aumentou bastante. Segundo um estudo da Organização de Consumidores e Utilizadores (OCU), esta aumentou uma média de 60%, desde 2007. E, segundo o Eurostat, os espanhóis são os terceiros da Europa que pagam mais pela luz.

Os consumidores começam a reagir. Ontem, a OCU lançou uma iniciativa coletiva destinada a fazer descer a fatura energética. A sua proposta, que tem vários precedentes na Europa, consiste em formar um grande grupo de consumo, para comprar energia por grosso e negociar diretamente o preço com as empresas de comercialização. Deste modo, conseguir-se-á, em teoria, reduzir a fatura: quanto mais energia for comprada, mais barata esta será.

Até 14 de outubro, qualquer pessoa, seja ou não sócia da OCU, pode juntar-se ao grupo de compra, numa página de Internet. Dois dias depois, a organização realizará um concurso, em que poderão participar todas as empresas de comercialização que desejem fornecer energia àquele grande conjunto de clientes, e do qual sairá vencedora a que oferecer o preço mais baixo. Em 4 de novembro, será comunicado aos consumidores o nome da empresa vencedora, que podem ser duas, se for também decidido aceitar uma oferta pelo serviço combinado de eletricidade e gás, e cada cliente receberá informação pormenorizada sobre quanto pode poupar. Se o interessado considerar adequado, dará o seu acordo e a comercializadora poderá assinar contrato com ele.

Associações de consumidores têm êxito

[[Várias associações de consumidores europeias têm já em curso iniciativas semelhantes]], algumas com grande êxito. Na Holanda, onde foi lançada no ano passado pela Consumentenbod, inscreveram-se 52 mil consumidores que conseguiram uma poupança média de 277 euros por ano. Na Bélgica, a ação promovida pela Tests-Achats, contou com a adesão de 152 mil pessoas e obteve reduções de 130 euros na fatura da luz e de 435 na do gás. No Reino Unido, a organização Which alcançou uma poupança média de 258 euros para 285 mil pessoas e, em Portugal, a associação DECO conseguiu descidas de entre 25 e 80 euros para quase 600 mil clientes.

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Antonio Arranz, responsável técnico em matéria de energia da OCU, não se atreve a indicar montantes de poupança em Espanha. “Dependerá do número de pessoas que se inscreverem e do perfil de cada uma”, diz. No entanto, garante que a maioria dos participantes ficará melhor do que está. Na realidade, segundo os seus cálculos, “há clientes no mercado livre que pensam ter uma boa oferta e estão a pagar cerca de 25% mais do que com a tarifa regulada”.

Resta também saber qual será a resposta das empresas, se estão dispostas a participar no concurso e a oferecer tarifas atrativas. A Endesa, uma das cinco grandes empresas que dominam o setor em Espanha, participou no concurso de Portugal e ganhou, mas ainda não decidiu se vai concorrer ao da OCU.

A Associação Nacional de Poupança e Eficiência Energética (ANAE), criada para unir os consumidores de energia e conseguir uma redução de custos da fatura da água e da luz, está a preparar, há mais de meio ano, uma proposta idêntica. “Os precedentes na Alemanha, no Reino Unido e, mais recentemente, em Portugal animaram-nos a tentar alterar o sistema. Já contamos com a luz verde da Comissão Nacional de Energia (CNE) e estamos à espera da opinião da Indústria”, explica o porta-voz da ANAE, Francisco Valverde. Esta associação ainda não fixou uma data de lançamento [da iniciativa].

“Propostas não vão ao fundo da questão”

“São propostas com as quais é possível negociar alguns euros, mas não vão ao fundo da questão. Não me parece que se vá muito mais longe assim, porque o problema do sistema de fornecimento de eletricidade em Espanha não reside nas empresas de comercialização, mas na própria conceção do sistema”, afirma Jorge Fabra, presidente da [associação] Economistas frente a la crisis [economistas face à crise], ex-presidente da Rede Elétrica e antigo assessor da CNE.

[[Segundo Fabra, o sistema espanhol é uma torre de Babel difícil de entender e que origina grandes erros de diagnóstico]]. “E insisto em que o principal problema não reside em haver ou não concorrência entre as comercializadoras. Reside no facto de o sistema não fazer distinção entre as origens da energia: a que é gerada pelas centrais hidroelétricas e pelas centrais nucleares é mais barata do que a do carvão e do gás natural, mas são todas vendidas ao mesmo preço. Por isso, há quem obtenha mais dinheiro do que seria devido”, explica. “Mas nenhuma das reformas até agora lançadas pelos diferentes governos conseguiu abordar esta questão. Há muitos interesses empresariais em jogo”, adianta.

As empresas de comercialização justificam a ausência de ofertas interessantes, alegando que trabalham com pouca margem de manobra, porque a parte fixa da fatura, que é determinada pelo Governo, é igual para todos e só lhes é possível poupar na última fase do processo: custos administrativos, pessoal e gestão.

As cooperativas de energia verde, comercializadoras que entraram no sistema associando consumidores comprometidos com as energias renováveis, também querem mudar as regras do jogo. Este verão deram um passo em frente. Depois de ter sido divulgado que o Governo tenciona lançar uma taxa sobre o consumo próprio, que consiste em produzir eletricidade em casa com recurso a painéis solares ou míni geradores eólicos e consumi-la, estas organizações apelaram à desobediência, para defender o seu modelo. El País encontrou meia dúzia destas comercializadoras verdes. Segundo os seus representantes, encontram-se em pleno crescimento e propõem bons preços.

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