Um guarda-costas grego patrulha a fronteira marítima entre a Grécia e a Turquia.

As novas rotas do Mediterrâneo

As patrulhas marítimas da agência Frontex e a controversa cooperação com a Líbia estão a dar frutos: os migrantes atravessam menos o Mediterrâneo para chegarem à Europa. Contudo, estão a ser estabelecidas novas rotas, que criam novas situações de emergência.

Publicado em 24 Junho 2010 às 13:26
Um guarda-costas grego patrulha a fronteira marítima entre a Grécia e a Turquia.

Espera-nos um estranho Verão migratório. Um Verão em que as imagens de migrantes amontoados em embarcações sem o mínimo de condições, em direcção às costas da Europa poderão ser muito menos numerosas do que têm sido nos últimos anos. Os mais recentes números do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) apontam para uma diminuição das chegadas por barco de entre 50% e 95%, consoante os destinos, relativamente ao período 2009-2010.

Há apenas três anos, devido à sua superfície e densidade [populacional], Malta enfrentava uma grave crise, provocada pela chegada de entre 1500 e 3000 imigrantes, em cada Verão. No entanto, segundo as autoridades maltesas, desde Março que nenhum barco encalha nas costas do país – e isto depois de uma baixa de 50% entre 2008 e 2009. Ao ponto de, em Abril, Malta ter anunciado que se retirava das operações conjuntas que estão a ser realizadas pela Agência Europeia [de Gestão da Cooperação Operacional] nas Fronteiras Externas [dos Estados-Membros da União Europeia] – Frontex. A diminuição também foi espectacular em Itália, em especial na ilha de Lampedusa. Segundo a antena do ACNUR em Roma, as últimas estimativas dão conta de uma redução de 94%, entre 2009 e os primeiros meses de 2010. Tal como noutros locais, em termos globais, a baixa teve início em 2006. Nesse ano, 22 mil imigrantes vindos da África do Norte desembarcaram nas costas italianas. Em 2007, foram apenas 19900 e, em 2009, somente 8700.

A Líbia continua a ser um dos atores-chave

Essa diminuição verifica-se igualmente em Espanha. Segundo a antena do ACNUR em Madrid, situou-se em torno dos 50%, entre 2008 e 2009. Em 2006, 39 mil imigrantes tinham conseguido aportar a diferentes pontos da costa ibérica, situados em especial nas Canárias e nas Baleares. Em 2007, o número baixou para 18 mil e, em 2008, para apenas 13400. No entender do director da polícia central de fronteiras, Frédéric Perrin, estes números têm impacto em França. Segundo ele, a "pressão migratória" está em baixa no Calaisis e no eixo ferroviário Vintimille-Paris, utilizado pelos imigrantes provenientes de Itália. Os interrogatórios diminuíram em 20% desde o início do ano. Uma das causas destas mudanças é a Frontex. Nos últimos anos, as patrulhas navais têm sido mais numerosas e mais eficazes, em especial devido à existência de acordos bilaterais com os países considerados como "fontes" de imigrantes. Também aí se fazem sentir os efeitos da crise económica.

No entanto, um dos atores-chave continua a ser a Líbia. Este país, que se tornara um dos principais países de trânsito, em especial nos casos em que o destino dos migrantes era a Itália, reforçou o controlo das fronteiras a partir da Primavera de 2009 e da entrada em vigor de um acordo diplomático com o Governo de Silvio Berlusconi. Um acordo em que, além de ter passado à Líbia um cheque de cinco mil milhões de euros, a Itália reconheceu o seu papel nos danos infligidos aos líbios durante o período colonial. Desde então, estes últimos assinaram um contrato de 300 milhões de euros com uma empresa italiana de equipamentos de segurança – nomeadamente infra-vermelhos – destinados ao controlo da fronteira sul. E também iniciaram conversações com a União Europeia. Em 9 de Junho, foi assinado um "programa indicativo", que tem uma dotação orçamental de 60 milhões de euros e inclui cláusulas sobre fiscalização da imigração clandestina.

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Turquia, a nova grande porta de entrada na Europa

Todas estas iniciativas estão a redesenhar o mapa das migrações mediterrânicas. Os fluxos deslocaram-se para Leste e a nova grande porta de entrada para a Europa passou a ser a Turquia. Segundo a delegação do ACNUR em Istambul, em 2009, as autoridades turcas detiveram cerca de 70 mil migrantes em situação ilegal. Um número muito elevado mas que reflecte apenas uma parte da realidade.

É difícil saber se se trata de uma "deslocação" migratória. Os migrantes que chegam à Turquia são, em muitos casos, afegãos, somalis e eritreus e não originários da África Ocidental. Segundo as ONG, muitos deles estão retidos no Magrebe, à espera de melhores dias. Entretanto, os marroquinos, que já não precisam de visto para se deslocarem à Tailândia, estariam a contornar em parte o problema utilizando voos Marrocos-Banguecoque-Istambul. Seja como for, foram estabelecidas duas rotas principais a partir da Turquia. A "rota norte" passa pela Bulgária e pela Roménia e segue para a Europa do Norte. A "rota sul" passa pela Grécia, em direcção a Itália, França, Espanha…

Nesta nova configuração, a Grécia enfrenta muitos problemas. Em 2008, segundo a delegação do ACNUR em Atenas, perto de 150 mil imigrantes foram detidos por terem entrado e permanecido ilegalmente em território grego, ou seja, 75% do total europeu, contra 50% em 2008. Desde o início do ano, estes números indicam ainda que a via terrestre tem sido privilegiada em detrimento da via marítima.

Nesta nova paisagem, uma das grandes preocupações das ONG e do ACNUR continua contudo a ser o destino dos que pedem asilo. A Grécia é o país europeu que menos concede o estatuto de refugiado. Pelo seu lado, a Turquia não o concede a migrantes não originários da União Europeia.

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