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Praça do mercado de Cieszyn. © Marek and Ewa Wojciechowscy

Cieszyn com fronteira ao meio

É difícil comemorar conjuntamente o aniversário, quando a história os separou. Apesar das tensões existentes entre polacos e checos nesta região raiana da Silésia Oriental, a vida em Cieszyn e Cesky Tesin vive da fronteira que passa entre elas.

Publicado em 5 Fevereiro 2010 às 16:41
Praça do mercado de Cieszyn. © Marek and Ewa Wojciechowscy

Cieszyn iniciou as celebrações dos 1200 anos da sua criação. Um pouco em cima da hora, no início de Dezembro, Český Těšín anunciou que iria participar nas cerimónias. No entanto, na margem ocidental do Olza, o entusiasmo por fazer uma festa conjunta nunca foi grande. E assim, Cesky Tesin vai celebrar com grande pompa os 90 anos da sua criação, em 1920, data em que uma nova fronteira dividiu a cidade em duas. Muitos polacos de Zaolzie [literalmente, das “terras para lá do rio Olza”] são mal vistos por causa deste aniversário e, em Cieszyn, é bem visível a reserva em comemorar o aniversário checo.

Segundo a lenda que corre nas duas margens do Olza, os três filhos de um soberano eslavo – Bolko, Leszko e Cieszko – reuniram-se naquele sítio, em 810, e fundaram a cidade de Cieszyn. No Outono de 1918 [com o desaparecimento da Áustria-Hungria e a criação da Polónia e da Checoslováquia], o Conselho Nacional do Principado de Cieszyn tomou oficialmente o poder em nome do Governo polaco. Foi assinado um acordo de divisão da Silésia, que cindia Cieszyn em duas partes, uma polaca e outra checa, respeitando os dados linguísticos do recenseamento de 1910 (viviam ali 123 mil polacos, 32 mil checos e 22 mil alemães).

A parte mais rica ficou para os checos

Os polacos ficaram convencidos de que a questão ficava resolvida. Daí terem enviado um regimento de Infantaria local combater os ucranianos na frente da Galícia Oriental. As legiões checoslovacas aproveitaram a ausência polaca. A guerra foi curta, mas sangrenta, e o cessar-fogo acabou por ser imposto sob pressão da Entente Cordiale [França e Reino Unido]. O futuro da Silésia em Cieszyn foi decidido arbitrariamente em Julho de 1920, pela Conferência de Embaixadores, em Paris. A parte mais rica e industrializada, com as minas, as metalurgias e a linha de caminho-de-ferro que ligava a Chéquia à Eslováquia foi atribuída à Checoslováquia.

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Os sangrentos acontecimentos de 1919 deram origem a vários monumentos. Em Cesky Tesin, é o de Tomás Masaryk, o pai da Checoslováquia independente e seu Presidente de 1918 a 1935. Destruído em Outubro de 1938 pela intervenção das tropas polacas em Zaolzie, vai agora ser reconstruído. Esta decisão perturbou muitos polacos, para os quais a política de Masaryk contribuiu para a divisão de Cieszyn. “Mas é uma festa checa e é o seu herói, o que se vai fazer?”, condescende Zygmunt Stopa, presidente da Associação Polaca de Educação e Cultura na República Checa.

Do lado polaco, em 1934, foi inaugurado um monumento que comemora as batalhas vitoriosas das legiões polacas. O monumento foi apeado pelos alemães em Setembro de 1939. Recuperou o seu lugar há alguns anos. “Sei que, do lado checo, houve ranger de dentes”, comenta Bogdan Ficek, presidente da Câmara de Cieszyn.

Na declaração sobre a celebração dos 1200 anos de Cieszyn, divulgada no início de Dezembro numa sessão conjunta dos conselhos municipais, lê-se: “Não podemos alterar a história, nem esquecê-la; mas podemos assegurar um futuro comum às próximas gerações.” E Bogdan Ficek explica: “Consideramos que, no que às nossas duas cidades diz respeito, se deve dar um passo em frente, ainda que isso possa desagradar a algumas pessoas.”

O comércio de Cieszyn deve aos checos e aos eslovacos quase 70% do seu volume de negócios. Os checos aproveitam uma taxa de câmbio vantajosa da sua coroa em relação ao zloty. No mercado de Cieszyn, os produtos em vime são muito procurados, bem como as árvores de Natal artificiais, as mantas, os sapatos, os legumes e os rebuçados. Os turistas checos, carregados de compras, apanham um táxi polaco para chegarem aos seus automóveis, deixados do outro lado do Olza, ou para irem até à estação. Antes da ponte, o taxista tapa as insígnias do veículo e prossegue a corrida como um automobilista comum, porque a fronteira passa mesmo a meio do rio. “Se se aplicassem estritamente as regras, uma ambulância polaca teria de parar no meio da ponte e esperar que uma ambulância checa fizesse o transbordo do doente”, explica o presidente da Câmara de Cieszyn. E vice-versa.

Estas violações oficiosas da fronteira são extensivas à cooperação da polícia e da guarda municipal, na perseguição de criminosos em fuga. E hoje, ninguém imagina que a jovem cantora Ewa Farna, de Zaolzie, não possa cantar de ambos os lados do Olza. Cantando em polaco e checo, é a melhor embaixadora da “polonidade” em Zaolzie. É também o ídolo da juventude transfronteiriça polaca e checa. No final, todos são “stele. Stąd” (daqui), como se diz-se em Cieszyn.

Minorias

Uma coexistência pouco pacífica

As autoridades checas prometeram resolver o problema do desrespeito pelos direitos da minoria polaca na região fronteiriça de Cieszyn (Silésia), relata o diário de Varsóvia, Gazeta Wyborcza. A promessa foi feita durante a recente visita do Presidente polaco Lech Kaczynski a Praga. Os 40 mil polacos que vivem na região queixam-se que as placas de sinalização em polaco são vandalizados por extremistas checos de direita. Das 31 localidades autorizadas pela “Carta Europeia das Línguas Regionais ou Minoritárias” a afixarem sinais bilingues, apenas metade decidiu exercer esse direito, e muitas voltaram atrás na decisão. Ocorreram problemas até com a placa de uma casa em Smilovice, assinalando o local de nascimento do actual presidente do Parlamento Europeu, Jerzy Buzek. “Os checos não estão habituados a isso, e precisamos de lhes dar mais tempo”, considera Jozef Szymeczek, dirigente do Congresso dos Polacos na República Checa. O caso mais grave, segundo ele, deu-se na cidade de Trinec, que tem uma minoria polaca de seis mil pessoas, onde as autoridades locais tentaram fechar uma escola polaca e recusam sequer discutir a possibilidade de sinais bilingues. Os polacos que vivem na República Checa pensam que a maior parte do ódio contra eles vem dos checos jovens. Um grupo de Internet chamado “Odeio polacos” tem quase mil membros. “É óbvio que as relações checo-polacas são muito melhores a nível governamental do que local”, conclui o diário.

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