Envolver os cidadãos na Europa

À beira das eleições para o Parlamento Europeu de 2014, a União Europeia devia aprender bastante com a recente campanha presidencial nos Estados Unidos, no que respeita ao envolvimento com os seus cidadãos, ao acréscimo de legitimidade e a ter mais voz no panorama internacional.

Publicado em 4 Janeiro 2013

A União Europeia tem um longo historial como farol de paz, prosperidade e êxito, em campos que vão da cultura ou da ciência ao desporto. No entanto, a Europa atraiu mais a atenção mundial nos últimos dois anos do que nas últimas seis décadas, devido à crise da dívida – agravada por uma economia recessiva e divergências internas –, que enche os destaques noticiosos por todo o mundo. Afinal, a polémica tem bons efeitos nas vendas. Mas o debate público que essa polémica vem alimentando não é manifestamente construtivo.

Quase seis décadas depois de o realizados em grande parte por intervenientes nacionais em fóruns nacionais – e mantêm-se centrados nos interesses nacionais. Para haver um progresso real, interesses europeus claramente definidos terão de substituir os interesses nacionais em matéria de desenvolvimento da União.

A definição desses interesses exige um debate sério, honesto e pan-europeu – ou seja, ultrapassando a soma dos debates nacionais. A discussão deve ser pública, envolvendo os cidadãos europeus, e não apenas o pequeno círculo de políticos do Conselho Europeu.

A ausência de uma esfera pública europeia representa um obstáculo para esse debate. O espaço comum europeu existente – composto por órgãos de comunicação, como o Financial Times e The Economist, conferências de âmbito europeu, redes de Organizações Não Governamentais e programas de intercâmbio como o Erasmus – envolve apenas elites ricas e cosmopolitas. Apesar de a comunicação social poder proporcionar abertura à criação de uma esfera pública europeia mais abrangente, isso ainda vai levar algum tempo, pelo menos no que respeita os cidadãos de língua inglesa.

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Uma oportunidade para iniciar o debate

Entretanto, os europeus devem encarar a corrida às eleições para o Parlamento Europeu de 2014 como uma oportunidade para iniciar um verdadeiro debate público sobre o seu futuro. Deviam começar por copiar as intervenções públicas bem-sucedidas de outras regiões do globo, como os Estados Unidos.

Na verdade, a recente eleição presidencial norte-americana foi confusa, populista e corrompida por interesses corporativos. Mas, apesar disso, exemplificou o que é um debate dinâmico entre as visões do futuro da América em confronto: um país mais igualitário, que assume um papel construtivo global, ou uma América externamente agressiva, ao serviço dos seus cidadãos mais ricos. Milhares de milhões de pessoas em todo o mundo seguiram os cativantes – e muitas vezes teatrais – debates dos candidatos; não precisaram de direito a voto para se sentirem envolvidas na discussão.

Nos próximos 20 meses, os recursos mais eficazes da campanha eleitoral dos Estados Unidos deviam ser cruzados com a tradição eleitoral da Europa. O primeiro passo para um debate inclusivo e convincente sobre o futuro da Europa será garantir que as eleições de 2014 decidam qual o partido político ou coligação que irá preencher os cargos de governação, nomeadamente os do executivo – como acontece em qualquer democracia parlamentar.

Presentemente, só o Parlamento Europeu é diretamente eleito. É o Conselho Europeu, que reúne políticos nacionais, que propõe o executivo da UE – presidente da Comissão Europeia e seus comissários – que o Parlamento depois ratifica. Como esses cargos são preenchidos sem ter em conta resultados eleitorais, os cidadãos não dão valor às eleições para o Parlamento Europeu, encarando o conjunto da instituição como pouco mais do que um programa de emprego para políticos e seus apaniguados.

À procura de plataformas comuns

Para melhorar esta estrutura sem introduzir alterações ao Tratado, os grupos político-partidários europeus, começando pelo maior e mais influente, devem cumprir a sua promessa de nomear candidatos próprios para a presidência da Comissão Europeia. Os políticos mais destacados devem, então, realizar campanhas políticas efetivas, concebidas, geridas e financiadas pelos respetivos grupos políticos, através da partilha de recursos partidários europeus e nacionais.

Uma campanha eleitoral pan-europeia deste tipo forçaria partidos políticos afins a desenvolver e angariar apoios para plataformas comuns. Por exemplo, os social democratas podiam promover a ideia de um salário mínimo europeu; os Verdes podiam defender uma política energética independente da energia nuclear, a nível da Europa; e os conservadores podiam ser os paladinos da baixa dos impostos por toda a Europa.

Além disso, deve ser criado um fórum de debate pan-europeu. Isso deve implicar, antes de mais, a transmissão dos debates formais entre os principais candidatos de toda a Europa – usando o modelo do Festival Eurovisão da Canção ou da Liga dos Campeões em futebol.

Em suma, se a UE se apresentar como um sistema político funcional de pleno direito, com estruturas e processos democráticos sólidos, ganhará a atenção e apreço dos seus cidadãos e do resto do mundo, promovendo um aumento da participação popular nos seus países e maior poder de influência no exterior. A canalização dos debates para uma discussão produtiva – em vez de simples parangonas mediáticas – é crucial para reforçar os processos democráticos e resolver problemas urgentes.

A crise do euro ameaça a própria existência da União Europeia. Mas também proporciona uma oportunidade para se ampliar o debate crucial sobre o futuro da Europa – um debate que só será produtivo no contexto de uma verdadeira democracia parlamentar europeia.

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