Fãs assistem ao jogo Polónia-Rússia na "fan zone" de Varsóvia, a 12 de junho.

Euro 2012, patrocinador oficial do multiculturalismo

Ao acolherem o campeonato da Europa de futebol, as suas equipas e os seus adeptos, os polacos descobriram as alegrias do intercâmbio cultural. E modificaram a sua relação com o patriotismo.

Publicado em 25 Junho 2012 às 10:16
Fãs assistem ao jogo Polónia-Rússia na "fan zone" de Varsóvia, a 12 de junho.

As cidades anfitriãs e as localidades que albergaram os futebolistas surpreenderam tanto os jogadores como os adeptos pela sua preparação. As bandeiras de vários países e nações misturaram-se umas com as outras nas paredes de muitas instituições e nas varandas das casas. A Polónia tornou-se uma verdadeira torre de Babel.

Varsóvia é, sem dúvida, a primeira cidade no que diz respeito a número de visitantes mas as pequenas localidades também gostaram da mistura de culturas. Legionowo, por exemplo, foi rebatizada como “pequena Grécia”. O edifício do centro de gestão de situações de crise foi decorado com um cartaz escrito em inglês e grego: “Legionowo dá-vos as boas vindas”. Não foi por acaso – fica mesmo à beira da estrada por onde viaja o autocarro que leva os jogadores gregos até Jachranki. Os habitantes sabem a que horas o autocarro ali passa e param o que estão a fazer para lhe dizerem adeus.

Foram organizados eventos para divulgar a cultura e a gastronomia gregas. Há meses que a cidade se prepara para o euro. Legionowo fica a cerca de meia hora de Varsóvia, o que tornou o seu centro desportivo muito cobiçado por várias equipas. Os gregos ganharam porque… foram os primeiros. E há muitos meses que as autoridades locais buscavam maneiras de fazer com que os gregos levassem boas recordações da estadia. Substituíram a cerca do estádio que foi posto à disposição dos jogadores. E também renovaram os vestiários, o piso do campo de treino e até a estrada vizinha.

E não foi tudo – também resolveram atribuir coroas de louro aos vencedores da corrida anual dos dez quilómetros de Legionowo fazendo, assim, uma piscadela de olho aos Jogos Olímpicos da Grécia antiga. Alguns habitantes começaram a aprender grego. “Kalimera” (Bom dia), deseja-nos um transeunte, sorrindo. E os habitantes da cidade dizem, divertidos: “É provável que as azeitonas passem a ser o nosso aperitivo preferido”. “Como pode ver, há bandeiras da Grécia e inscrições em grego. Decorámos a cidade para receber os gregos mas não há muitos adeptos da equipa do Peloponeso por aqui. Por isso, vamos à ‘fan zone’ de Varsóvia para convivermos com eles”, conta Andrzej Szeniawski, um habitante de Legionowo.

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Exibir uma bandeira deixou de estar fora de moda

A primeira vez que foi à ‘fan zone’ de Varsóvia, com a filha pequena, teve um choque cultural. “Vi asiáticos vestidos de branco e vermelho [as cores da Polónia] a venderem cachecóis, camisolas, bonés. Uns turcos, também vestidos de adeptos da Polónia, aproximaram-se deles e pediram para tirar uma fotografia todos juntos”, conta. Ficou igualmente surpreendido ao ver adeptos checos com cachecóis que diziam “Polska” [Polónia]. “Foi nessa altura que percebi que durante o Euro na Polónia todos os visitantes se sentiram polacos e torceram por nós durante os jogos da nossa seleção. Por isso, decidi ir ao Polónia-Rússia com uma bandeira russa para ser simpático para os russos”, continua.

Szeniawski tem mais uma opinião que quer partilhar connosco: o nosso patriotismo deixou de estar “reservado” a uma categoria social. “Até aqui, o patriotismo polaco era entendido de uma forma unívoca: quando alguém exibia uma bandeira na rua, suspeitávamos imediatamente que era do PiS [Direito e Justiça, o partido conservador da oposição]”, explica. “Quando participei na marcha [dominada pelos movimentos nacionalistas] do 11 de novembro [dia da independência] ouvi os hooligans gritar: ‘O patriotismo deve provocar dor!’. O Euro mostra que o patriotismo também deve dar alegria e exibir uma bandeira deixou de estar fora de moda.”

Opalenica, uma cidade de dez mil habitantes, entre Poznań e Nowy Tomyśl, também se transformou num polo de interesse. Foi escolhida para albergar a seleção de Portugal e o seu jogador-vedeta, Cristiano Ronaldo. E apesar de, também aqui, os adeptos da equipa não aparecem em grande número, sente-se um ambiente fora do comum e há animação.

Por sua própria iniciativa, os seus habitantes penduram bandeiras portuguesas lado a lado com bandeiras polacas. E basta passear os olhos para ver mensagens de boas-vindas. “Gdansk fica vermelho espanhol”, “Os irlandeses pintam Poznan de verde”: eram estes os comentários nas redes sociais. E depois dos encontros desportivos, a festa continuava nas discotecas e nos bares até de madrugada.

O fim dos estereótipos

O que é que os turistas estrangeiros puderam apreciar na Polónia? Os meios de transporte rápidos e confortáveis, os letreiros claros e compreensíveis que indicam os nomes das ruas e as paragens de autocarros, a comida deliciosa e as mulheres bonitas. E o que é que nós aprendemos com os turistas estrangeiros? Segundo eles, falamos bem inglês, sabemos divertir-nos e somos bons adeptos, apesar de ainda termos muitos progressos a fazer no que diz respeito aos cânticos. Nessa matéria, os irlandeses, por quem todos nos apaixonámos, podem dar-nos algumas lições.

Amamo-los pela sua classe e pela capacidade de aceitarem a derrota, pelo seu orgulho, pela sua alegria e porque não hesitaram em gastar muito dinheiro nos nossos bares e restaurantes. Mas também porque nos prometeram voltar qualquer dia e só dizerem bem do nosso país. E essa é a melhor publicidade que nos podem fazer.

Apesar da nossa seleção nacional não ter tido um percurso glorioso durante o Campeonato da Europa, podemos dizer, sem exagero, que o Euro transformou a Polónia e os polacos. E não estou a pensar apenas na melhoria da imagem da Polónia, nos benefícios económicos ou sequer na modernização da nossa economia ou no incremento das infraestruturas.

Estou a pensar, sobretudo, que o Euro 2012 nos permitiu perder os complexos nacionais e pôr fim a estereótipos. Conseguimos perceber que somos uma nação não apenas alegre e acolhedora, organizada e homogénea no seu apoio à seleção de futebol, mas também aberta ao multiculturalismo colorido que se instalou entre nós e que marcou o nosso quotidiano durante estas últimas semanas.

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