Cena de "More Than Honey" (2012), um filme de Markus Imhoof.

Impasse europeu por causa das abelhas

Uma espécie de inseticidas, amplamente utilizada em todo o setor agrícola, pode ser responsável pelo elevado nível de mortalidade das abelhas na Europa. A Comissão Europeia quer proibir o seu uso, mas os fabricantes estão a lançar cortinas de fumo sobre as iniciativas.

Publicado em 1 Março 2013
Cena de "More Than Honey" (2012), um filme de Markus Imhoof.

São cada vez mais fortes os zumbidos de jogadas de bastidores relacionadas com as abelhas. As colónias estão a ser aniquiladas e as pessoas querem saber de quem é a responsabilidade. Os holofotes centraram-se, entretanto, nos neonicotinóides, um grupo de inseticidas. Tudo começou com um relatório da Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar, EFSA. Embora o relatório não afirme que esses pesticidas são a causa do morticínio das abelhas, conclui que acarretam garantidamente enormes riscos.

O resultado imediato foi o agendamento dos neonicotinóides para investigação europeia. O comissário europeu para a Política de Saúde e Defesa do Consumidor, o maltês Tonio Borg, fez uma proposta no final de janeiro de proibição do uso de três neonicotinóides importantes (imidacloprid, tiametoxam e chlotianidin), especificando as culturas de milho, algodão, girassol e semente de colza. A intenção era a proibição tornar-se aplicável a partir de 1 de julho de 2013, sendo o efeito avaliado durante dois anos. A comissão permanente de peritos dos Estados-membros deveria pegar no caso em 25 de fevereiro. No entanto, a reunião foi adiada para meados de março.

Proteção contra processo legal

Consta que os industriais estão a preparar processos judiciais e compensações por danos. Nem o departamento de Borg, nem o fabricante Syngenta estão com vontade se ver em tribunal. Aparentemente, a proposta foi alterada e ampliado o seu espetro ao cultivo de frutíferas.

A Comissão enviou uma carta à comissão permanente contendo um parágrafo invulgar, em que se afirma que o projeto de texto deve ser apresentado aos fabricantes, aguardando-se respostas até 1 de março. A carta afirma ainda que "há indícios de que os produtos não correspondem aos critérios da anterior aprovação".

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Parece que a Comissão pretende proteger-se, desta forma, contra um processo legal. Afinal, os fabricantes – grandes intervenientes, como a Bayer e a Syngenta –, não estão dispostos a ficar a assistir, sem dar luta. Publicaram anúncios de página inteira em jornais e escreveram cartas aos governos nacionais. Preconizam o desaparecimento de 50 mil postos de trabalho e um prejuízo financeiro de €4,5 mil milhões. A parte contrária alega que isso é uma ninharia em comparação com os €153 mil milhões que as abelhas geram por polinização gratuita das culturas naturais.

Uma “falsa solução”

A Syngenta lança abertamente dúvidas sobre o valor do relatório da EFSA, porque não inclui pormenores sobre o uso em sementes manipuladas. A Bayer refere-se à iminente proibição como "uma medida desproporcionada, que compromete a competitividade do setor agrícola europeu". A federação belgo-luxemburguesa do setor, a Fytopharma, refere-se à proposta como uma "falsa solução" para o problema das abelhas.

O combate à questão tem amplo apoio no Parlamento Europeu. Bart Staes, que é membro do Parlamento Europeu pelos Verdes, convenceu uma centena ou mais dos seus colegas de várias bancadas a assinar uma carta dirigida ao comissário Borg, apelando a uma proibição total.

No entanto, Bart Staes admite que o nível de oposição tem vindo a aumentar sistematicamente. "Não há consenso entre os Estados-membros. A Espanha e Grã-Bretanha estão a encanar a perna à rã e a Alemanha também está a causar problemas. Basta que mais um par de países faça como eles e a proposta é bloqueada por uma minoria no Conselho de Ministros."

Pesticidas enfraquecem abelhas

Um porta-voz de Sabine Laruelle (do Movimento Reformador belga), ministra das PME, dos Trabalhadores Independentes, da Agricultura e da Política Científica, fez questão de salientar que o Governo belga reagiu de forma bastante favorável à proposta europeia.

Já a organização flamenga de proteção da natureza Natuurpunt considera que a proposta europeia não vai suficientemente longe. "Deve ser imposta uma proibição integral", explicam Jens D'Haeseleer (especialista em abelhas) e Annelore Nys (perita agrícola). "Os pesticidas em questão são extremamente tóxicos – 7000 vezes mais venenosos do que o DDT. Estão a contaminar o solo e a água, onde se desativam muitíssimo lentamente". A contra-argumentação é de que as substâncias são altamente diluídas e que as abelhas apenas são expostas a dosagens baixas. "No entanto, uma exposição prolongada a pequenas quantidades enfraquece-as e torna-as mais suscetíveis à doença. É semelhante à sida”, defende D'Haeseleer.

2,5 milhões de assinaturas em 36 horas

O professor Dirk de Graaf, especialista em abelhas da Universidade de Gand, continua muito cético. Com base numa pesquisa realizada pelas universidades de Wageningen e Gand, De Graaf conclui que, embora as abelhas morram sob o efeito de neonicotinóides em ambiente laboratorial, tal não acontece no exterior, nas cercanias das colmeias. Segundo ele, o ácaro varroa é o maior assassino das abelhas. Refere a Austrália, onde os neonicotinóides são utilizados na agricultura e onde a varroa não está presente. Aí, as taxas de mortalidade são muito mais baixas. "O inseticida é um elemento da equação, mas não o único", explica, acrescentando que "a proibição terá algum efeito, mas não vai resolver o problema".

Para muitas pessoas, o destino das abelhas é uma questão altamente emotiva. A petição, no site da Avaaz, recolheu 2,5 milhões de assinaturas num período de 36 horas. E aguarda-se a estreia flamenga do documentário intitulado More Than Honey [Mais do que mel], a 20 de março. Se o filme tiver êxito, é improvável que o zumbido venha a cessar em breve.

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