Anúncio do diário austríaco. Um leitor com o jornal nas mãos : "O Krone é o melhor jornal do país". À direita : "Um dos nossos milhões de leitores, adivinhe qual !".

"Krone", um diário com poder a mais

O Kronen-Zeitung é o maior e mais influente jornal austríaco. Com 3 milhões de leitores, este diário informa quase um austríaco em cada dois. Hans Dichand, o director, de 89 anos, não hesita em agir como político destacado do país, usando o seu órgão de comunicação como uma arma política, escreve o Der Standard.

Publicado em 8 Julho 2009 às 14:51
Anúncio do diário austríaco. Um leitor com o jornal nas mãos : "O Krone é o melhor jornal do país". À direita : "Um dos nossos milhões de leitores, adivinhe qual !".

Democracia e liberdade de imprensa são dois conceitos bem definidos. Pelo menos, era o que se pensava até agora. Mas, nos últimos tempos, o tratamento da informação na "frente" do Kronen Zeitung suscita algumas questões sérias. Oficialmente, está tudo bem. As leis da democracia parlamentar e a liberdade constitucional da imprensa não foram prejudicadas. E, no entanto, estão na realidade a cair a pique.

Hans Dichand, conhecido por Tio Hans, o editor do Krone, não gosta da União Europeia. [Durante a campanha para as eleições europeias], tomou partido por Hans-Peter Martin, deputado sem filiação partidária e também ele eurocéptico. E Hans-Peter Martin obteve 17,7% dos votos. O Chanceler Werner Faymann, chefe de fila do SPÖ (Partido Social-Democrata austríaco), postou-se aos pés do todo-poderoso Tio Hans, na famosa carta de vassalagem. [Em 2008, numa carta aberta ao editor do "Krone", o candidato à chancelaria mudou por completo de linha política, sem informar o seu partido, passando a defender que a ratificação dos tratados europeus fosse feita através de referendos e não por votação no Parlamento austríaco. Adoptava assim a linha do jornal, que tinha caído numa eurofobia quase histérica.] Tornou-se rapidamente o menino bonito do jornal e, segundo as sondagens, “o político mais simpático do momento”.

O Tio Hans também não gosta dos imigrantes. As leis relativas aos estrangeiros passaram a ser mais severas e, à excepção dos Verdes, nenhum partido se atreveu a reagir. O Tio Hans retirou o apoio ao seu favorito Faymann. Agora, apoia Josef Pröll na corrida à Chancelaria. E, segundo as últimas notícias, também quer ver-se livre do Presidente Heinz Fischer, até agora nunca posto em causa. Uma frase no jornal e a coisa está feita. A República em peso fica de ouvido à escuta. O resultado desta rivalidade está no centro das atenções.

Será possível um homem de 89 anos – e não o Parlamento, os partidos ou o resto da opinião pública – comandar a política austríaca? É um feito que, apesar do medo que causa, suscita respeito. Hans Dichand transformou as "cartas dos leitores" numa arma política absoluta. Todos os dias são publicadas duas páginas de cartas de leitores, cada uma delas antecedida por uma frase mnemónica impressa por cima, à direita, a negrito, a indicar o tema. Escrita por leitores fiéis, a frase varia todos os dias.

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Outrora, este método era utilizado na República Democrática Alemã pelo jornal Neues Deutschland [órgão do partido único]. Ficava-se assim a saber o que se devia pensar. Dichand pode declarar, com razão, que, ao contrário da RDA, a Áustria é um Estado de direito e os seus leitores são cidadãos livres. Trata-se apenas de fazer a opção certa. O dirigente encarrega-se pessoalmente disso. A acção seguinte consiste em discutir com as figuras políticas. O antigo Chanceler Wolfgang Schüssel contou o modo como se desenrolavam as discussões consigo: se aceitar o nosso tema, nós apoiamo-lo. É isto que o Tio Hans transmite aos seus interlocutores. Em geral, uma resposta negativa pode custar-lhes a carreira.

Abraham Lincoln disse que a democracia podia sobreviver sem Governo mas não sem liberdade de imprensa. Graças a esta, os cidadãos trocam ideias sobre assuntos que dizem respeito a toda a gente. Durante décadas, as democracias clássicas viveram dessa opinião pública democrática. Terá essa era chegado ao fim? “Será a democracia um modelo ultrapassado?” A pergunta foi feita num simpósio recente, organizado na Áustria. Na Rússia, circula o conceito de “democracia soberana” e, na China, fala-se de “democracia autoritária”. A Áustria está prestes a contribuir para o debate com o fenómeno “democracia mediática”.

Esta inovação daria muito que pensar aos investigadores em ciências políticas. Mas não se trata apenas de um tema de investigação. Todos os austríacos sofreriam as suas consequências.

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