Moldávia, o alargamento clandestino

Nos últimos tempos, Bucareste atribuiu passaporte romeno a mais de 100 mil moldavos e tenciona acelerar o ritmo. Esta política, que integra de facto a antiga república soviética no espaço europeu, começa a desagradar aos outros países.

Publicado em 15 Julho 2010 às 14:37

O chefe do Estado romeno quer aumentar o número de cidadãos e escolheu para o efeito métodos curiosos. Centenas de milhares de moldavos que vivem na pobreza recebem generosamente passaportes. Um presente de um Estado da UE que aceitam agradecidos: desaguam em massa na Europa Ocidental, onde trabalham como mão-de-obra barata. Os novos candidatos à entrada na União Europeia levantam-se cedo. Ainda a fraca claridade matinal não abriu e já centenas de moldavos, na sua maioria jovens, se reúnem diante do consulado romeno em Chisinau, capital da República da Moldávia, o país mais pobre da Europa. Denis Rotari, de T-shirt azul clara e dragão tatuado no cotovelo, é ladrilhador. E foi o amor que o levou ali. “Tenho necessidade de dinheiro para me casar”, declara o jovem de 21 anos. Como todos os que estão na fila, vem pedir um passaporte romeno, sinónimo de esperança de encontrar trabalho como mão-de-obra barata, em qualquer lugar entre Roma e Lisboa.

Um milhão de moldavos saiu já da sua pátria, cujo PIB per capita está ao nível do do Sudão. Alugam os seus serviços no estrangeiro, geralmente no mercado negro. Quase 120 mil dos 3,6 milhões de cidadãos do país dispõem agora de um passaporte do país vizinho, e mais de 800 mil esperam que o seu pedido seja aceite, segundo o Governo romeno. Para controlar esta corrida desenfreada, o Ministério romeno dos Negócios Estrangeiros abriu dois novos consulados nas cidades de Balti e Cahul – a expensas da UE.

Moldavos entram na UE pela porta dos fundos

A questão é a seguinte: o Presidente romeno, Traian Basescu, de orientação nacional-patriótica, quer engrossar as fileiras dos seus súbditos e aceitou que o número de naturalizações passe para 10 mil por mês, a partir deste ano. Assim, numa UE esgotada pelo alargamento, e sem sequer um referendo, nem a aprovação de Bruxelas, de Berlim ou de Paris, está em marcha um alargamento encapotado. Os moldavos votam pelos atos e entram pela porta dos fundos da União, o paraíso económico.

Desde que a Aliança para a Integração Europeia correu com os comunistas pró-russos do poder em Chisinau, em 2009, a Roménia lançou a sua ofensiva para a naturalização do seu pequeno vizinho. Bucareste patrocina a formação dos funcionários do Ministério moldavo dos Negócios Estrangeiros em matéria de “integração euro-atlântica” e financia a tradução das leis da UE. Apesar de se encontrar ela própria gravemente atingida pela crise financeira, a Roménia atribuiu no ano passado generosos créditos ao seu vizinho. O arame farpado foi retirado da fronteira e, desde o outono, os habitantes de uma zona transfronteiriça de 30 quilómetros podem mesmo entrar na Roménia sem visto.

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"Um mesmo povo que tem direito à unidade e a um futuro comum"

É verdade que romenos e moldavos vivem em dois Estados distintos, “mas somos um mesmo povo, e este povo tem direito à unidade e a um futuro comum”, afirmou Basescu, que sonha com o România Mare, uma ressurreição da Grande Roménia, nas suas fronteiras de 1918 a 1940, altura em que englobava a Moldávia. Os avanços romenos têm tudo para agradar às novas autoridades moldavas. Nove dos 53 deputados da coligação governamental dispõem, eles próprios, de passaporte romeno. Na pessoa de Mihai Ghimpu, o Presidente em exercício é um unionista. Dorin Chirtoaca, presidente da Câmara Municipal de Chisinau e sobrinho de Ghimpu, insiste na nota: “Os romenos e os moldavos estão estreitamente ligados, como os alemães e os bávaros”. A ideia da existência de um Estado à parte foi “uma ilusão do poder soviético”.

A verdade é que uma união com a Roménia, o segundo Estado mais pobre da UE, depois da Bulgária, não parece seduzir a maioria da população moldava. De acordo com sondagens, dois terços deles desejariam entrar para a União, mas apenas 2% se consideram romenos. De resto, como diz Rotari, o ladrilhador, diante do consulado romeno: “Com o passaporte, pretendo apenas ir mais para Ocidente. A Roménia, quero que se lixe”. O seu primo trabalha já em Madrid, num matadouro. Em março de 2011, quando a Roménia entrar no espaço Schengen, as centenas de milhares de moldavos titulares de passaportes romenos poderão finalmente deslocar-se livremente pela UE.

Entretanto, a onda de imigrantes chamou a atenção de Bruxelas. Os populistas da direita apressam-se a tirar partido do processo. Andreas Mölzer, deputado europeu da FPÖ, a direita populista austríaca, exigiu já que a Comissão Europeia tome posição e crie os meios para pôr termo à atuação romena. “Para a Alemanha, não há, no entanto, razão para preocupações”, explica Manfred Grund, deputado do CDU no Bundestag. “A maior parte dos moldavos procura apenas a Itália e a Espanha.”

Reações

A UE quer pôr travão na situação

“A Europa pressiona a Roménia a renunciar à Moldávia”, relata o România Libera. Enquanto Bucareste apresenta o seu vizinho como um posto avançado da União Europeia, salienta o diário romeno, os outros países-membros não aprovam a sua política de concessão de passaportes aos moldavos romanófonos. A hostilidade de certos países deve-se à intenção dos europeus ocidentais de redefinir as suas relações com a Rússia e de reconhecer em Moscovo um polo de influência, explica o România Libera. Os 100 mil passaportes já atribuídos e os 10 mil por mês que Bucareste promete vir a emitir são considerados uma ameaça pelos parceiros europeus, que temem um êxodo de mão-de-obra barata para o Ocidente.

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