Neonazis com certificação biológica

A coberto da agricultura biológica e da defesa do ambiente, alguns militantes ligados ao partido de extrema-direita NPD infiltram-se na sociedade e difundem as suas ideias radicais da maneira mais anódina.

Publicado em 2 Maio 2012 às 10:54

De calças verdes e camisa aos quadrados, Hans-Günter Laimer é aquilo a que aqui, na Baixa Baviera, se chama "um homem a sério". Ao descer do seu trator, saúda-nos com um "olá!" bem disposto e mostra-nos a exploração, mantida pela sua mulher, onde é tudo local e biológico. Um dia "de portas abertas" na quinta de Laimer inclui um grupo de tocadores de flauta, uma contadora de histórias e uma feira da ladra para crianças.

Um verdadeiro paraíso "bio" em ponto pequeno – só que Laimer nada tem de militante ambientalista. É membro do conselho da associação Midgard, que publica a Umwelt&Aktiv, uma revista aparentemente dedicada à agricultura biológica, que aborda temas como a conserva de cerejas e creches. Mas também publica textos sobre a Yule [a festa de inverno pagã celebrada pelos povos germânicos] e sobre os benefícios da política agrícola do NPD [Partido Nacional Democrata alemão, neonazi], que comercializa a revista na Internet. O próprio Laimer apresentou a sua candidatura a eleições locais sob as cores desse partido.

"O nosso objetivo é sensibilizar as pessoas para os problemas da proteção dos animais, da proteção do ambiente e da proteção da pátria", pode ler-se na página de apresentação da revista. Aliás, esta é considerada como "uma publicação de propaganda disfarçada do NPD" pela Direção de Segurança do Território. Laimer diz não ter qualquer participação na revista. O setor biológico é predominantemente dominado pela esquerda, lamenta. "Qual é a diferença entre os meus pepinos e os pepinos de um Verde?"

A proteção da natureza e da pátria

A proteção do ambiente nunca foi uma área reservada dos Verdes. Este movimento surgiu no século XIX, como reação à industrialização. Foi igualmente um tema central da ideologia nazi, que, em 1933 e em 1935, aprovou duas leis sobre a proteção dos animais e a proteção do ambiente. A proteção da natureza e da pátria, tal como a ideologia do sangue e da terra, são temas centrais do discurso nacional-socialista. "Em quase todos os domínios, a ideologia nazi serviu de base ao movimento de proteção do ambiente", explica Nils Franke, historiador e autor de um ensaio intitulado Naturschutz gegen Rechtsextremismus [Proteção do ambiente contra o extremismo de direita], que tem em vista luta contra a infiltração da extrema-direita no movimento.

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Devido ao interesse que as questões ambientais suscitam na Alemanha, o NPD apropriou-se recentemente deste tema, explica Franke. Envergando roupagens de cores verdes, a ideologia nazi está, assim, a reabrir caminho na sociedade. Entre Rostock e Schwerin, no Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, surgiu um novo movimento de "regressão": famílias que querem viver "dentro do respeito pelos animais e pelas tradições".

"Os temas ecológicos assumem cada vez maior importância no discurso da extrema-direita", explica uma representante do centro regional para a cultura democrática de Roggentin. "O objetivo é levar as pessoas a deixarem de associar o NPD a um movimento político e a passarem a associá-lo a um grupo que estabelece simples pontes para a vida dos cidadãos." Um vizinho, que se inclui entre os defensores da "regressão", fala-nos de homens, com blusões de aviador e botas rangers, que acendem tochas e cantam canções do folclore. Conta-nos ainda que um responsável da segurança interna o visita periodicamente, para tomar um café e saber das notícias locais.

Os “bio-castanhos” nas associações de agricultores

Politóloga da Universidade de Rostock, Gudrun Heinrich publicou, no início do ano, um livro intitulado Braune Ökologie [a ecologia castanha (alusão à cor do uniforme das SA)], em parceria com a fundação Heinrich Böll. "O NPD está estreitamente ligado às associações e automaticamente implantado nas zonas agrícolas", explica.

Fornecedores de equipamentos agrícolas ecológicos, Huwald Fröhlich e Helmut Ernst também se instalaram no Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental. Na sua antologia Opposition für Deutschland [Opor-se pela Alemanha], Fröhlich afirma que o humanismo e o internacionalismo são "valores contranatura" e defende o regresso às virtudes regionais e nórdicas de autonomia. Ernst e Fröhlich são membros da Biopark, uma das maiores associações de agricultores biológicos da Alemanha. A Biopark tem a sua própria cadeia de armazéns e abastece os da marca Edeka.

Só em 2011, a associação descobriu que entre os seus aderentes se incluíam agricultores "bio-castanhos" como Ernst, Fröhlich e muitos outros, afirma a presidente, Delia Micklich. Por um lado, diz, "não aprovo, de modo algum, a ideologia dessas pessoas e compreenderia, se alguns consumidores decidissem deixar de comprar produtos Biopark". Por outro, hoje, o NPD está representado nos parlamentos regionais [no Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental e na Saxónia] e, legalmente, Delia Micklich não pode fazer nada, desde que as suas explorações sejam bem geridas. "A nossa associação não pode responder pelas opiniões políticas. Limitamo-nos a certificar os métodos de produção agrícola", explica. "Enquanto o partido não for ilegalizado, não podemos fazer nada contra essas pessoas."

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