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O apelo de Oslo à Europa

O Nobel da Paz atribuído à Europa representa um apelo duplo: aos dirigentes europeus, para que salvem uma União danificada; aos cidadãos, para que deem provas de solidariedade, num momento em que a crise coloca em causa o modelo social europeu, escreve o filósofo alemão Jürgen Habermas.

Publicado em 15 Outubro 2012 às 15:57

É no momento da crise mais grave da sua história que a União Europeia vê ser-lhe atribuído o Nobel da Paz. Nas suas motivações, o Comité Nobel felicita-a por ter “contribuído para passar a maior parte da Europa de um continente em guerra para um continente de paz”. De facto, seria difícil imaginar outros motivos para motivar a atribuição de um prémio Nobel da Paz.

Portanto, as circunstâncias da crise atual esclarecem a entrega deste Nobel, ou mais precisamente as repercussões que tal decisão pode ter na situação atual da União. Interpreto a decisão da atribuição do prémio Nobel da Paz à UE neste preciso momento, em que esta nunca esteve tão mal, como uma súplica às elites políticas europeias – as mesmas elites que vemos hoje, em tempos de crise, a agir sem qualquer coragem, nem qualquer visão.

Para além dos antagonismos históricos

Este prémio Nobel da paz mostra claramente aos governos que estão hoje na liderança dos países-membros da união monetária que precisam de olhar para além da sua própria sombra e que devem portanto avançar com o projeto europeu. Algo que está explicitamente escrito, no mínimo três vezes, no texto do apelo. O Comité Nobel começa por elogiar a reconciliação da construção da paz na Europa após a Segunda Guerra Mundial.

O texto evoca, em seguida, os esforços para construir e promover a democracia e a liberdade, assim como os processos de liberalização que a União Europeia levou a cabo nos anos 1980 a favor da Grécia, da Espanha e de Portugal, similares aos dos anos 1989-90 para os países da Europa central e oriental, que integraram mais tarde a União. Esforços que a Europa deve agora aplicar nos Balcãs. O Comité Nobel louva a coragem que a Europa teve para superar os antagonismos históricos e obter este sucesso civilizador que é o alargamento da União Europeia, que deverá um dia incluir a Turquia.

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A Europa dos cidadãos

Mas há mais. É preciso esperar pela terceira motivação do Comité para encontrar a ironia da atribuição deste prémio Nobel da Paz à União Europeia. O Comité Nobel faz referência à crise económica que, nos países-membros da zona euro, está na origem “de perturbações e tensões sociais consideráveis” e que quase leva à rutura uma Europa comprometida por responsáveis incompetentes. Ao analisarmos bem o texto, percebemos que o que está em jogo é a terceira grande concretização da União, isto é, o seu modelo social, baseado no Estado-Providência.

Neste momento, nós europeus estamos obstinados a permanecer imóveis e silenciosos numa União a duas velocidades. É por isso que interpreto também a decisão de atribuição do prémio Nobel da Paz à União Europeia como um apelo à solidariedade dos cidadãos, que deverão dizer que Europa pretendem. Somente o reforço das instituições da “KernEuropa” – o núcleo essencial europeu – permitirá dominar um capitalismo que se tornara incontrolável e parar o processo de destruição interna da União.

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