Operários chineses em fila, esperando a partida para o estaleiro, em Hefei (China) . (AFP).

O expansionismo chinês conquista a Europa

A presença chinesa na Europa está a crescer, sobretudo nos países de Leste, fortemente endividados. A nova parceria econónmica não se resume a grandes contratos de obras públicas, alerta o Handelsblatt. O Império do Meio também utiliza a sua influência política.

Publicado em 23 Setembro 2009 às 15:52
Operários chineses em fila, esperando a partida para o estaleiro, em Hefei (China) . (AFP).

A implantação de empresas chinesas em África e na América Latina permitiu-lhes aceder às preciosas matérias-primas desses continentes. Mas é na Europa que os chineses contam fazer valer os seus conhecimentos técnicos em matéria de grandes infra-estruturas, em condições imbatíveis e ignorando as reformas orçamentais negociadas entre os Estados e o FMI.

Na Europa, os grandes grupos nacionais chineses atacam pela periferia: o Governo de Pequim tem já concluídos acordos "estratégicos" com a Moldávia e a Sérvia. Neste quadro, a China vai atribuir um crédito preferencial no montante de mil milhões de dólares [0,68 mil milhões de euros] à Moldávia, tendo como contrapartida enormes encomendas públicas para o maior grupo de construção chinês, o China Overseas Engineering Group (Covec).

Em África, na Ásia e na América Latina, a China já tinha anteriormente comprado, a troco de muitos milhares de milhões de dólares, o acesso às matérias-primas locais e aos grandes projectos de construção de infra-estruturas. Esta prática foi objecto de repetidas críticas por parte dos políticos locais e das instituições de apoio ao desenvolvimento. Denunciaram o "neocolonialismo chinês" de ter ignorado, à força de créditos sem condições, as reformas económicas, sociais e políticas que muitos responsáveis ocidentais consideravam urgentes e necessárias. Em contrapartida da ajuda chinesa, países como a Macedónia e a Costa Rica tiveram de interromper as suas relações com Taiwan (ou Formosa), que a China considera como parte do seu território.

Taiwan e Kosovo no coração da parceria sino-sérvia

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Na Europa, a China prossegue actualmente a sua expansão. Depois do acordo de colaboração estratégico estabelecido entre o Presidente sérvio Boris Tadic e o Chefe de Estado chinês Hu Jintao, está em curso a negociação de um crédito preferencial atribuído pela China para a construção de estradas e de uma ponte sobre o Danúbio, por um montante total de 200 milhões de euros, bem como o alargamento de vários portos, a criação de uma zona económica especial e projectos de armamento. Ao longo desta cooperação, ficou igualmente acordado que a China não reconhecerá o Kosovo, a província dissidente da Sérvia, e que, por seu lado, a Sérvia procederá do mesmo modo em relação a Taiwan. "A China torna-se uma potência de primeiro plano na economia mundial. Uma parceria estratégica com ela é, pois, sensata", afirmou Tadic, após a assinatura do contrato. Já o seu opositor, Dusan Prorokovic, criticou este acordo, porque vai originar um "endividamento inadmissível".

Também na Ucrânia a China negoceia a concessão de créditos vantajosos, enquanto o partido da primeira-ministra Iulia Timochenko debate o estabelecimento de uma cooperação com o Partido Comunista Chinês. Como na Sérvia, os créditos preferenciais atribuídos por Pequim colocam alguns problemas, porque estes países acabavam de assinar com o FMI programas de apoio de vários milhares de milhões de euros, relativamente aos quais deviam apresentar um programa de redução de despesas radical nos respectivos orçamentos nacionais. A este respeito, Volker Perthes, director do Stiftung für Wissenschaft und Politik (SWP), declarou que "tais iniciativas minam o FMI", acrescentando que a China concede créditos significativos por condições economicamente não racionais, "como já fez em África", e isso torna "o trabalho do FMI, do Banco Mundial e dos apoios ao desenvolvimento mais difícil".

Preços desafiam a concorrência ocidental

Na Polónia, o grupo de construção Covec tenta impor-se através de grandes intervenções de dumping [descida de preços fora da lógica do lucro financeiro] no mercado da construção de estradas, que ascende a cerca de 40 mil milhões de euros até à realização da Taça Europeia de Futebol de 2012. A Covec já ganhou os seus dois primeiros concursos para a construção de auto-estradas na UE. Trata-se de troços da nova auto-estrada A-2, que liga Varsóvia a Lodz. O grupo público chinês obteve os contratos, ultrapassando concorrentes ocidentais famosos, porque o preço por quilómetro proposto – entre 6,3 e 6,5 milhões de euros – era 60% inferior ao preço do concurso e claramente menos elevado que a proposta apresentada pelos grupos de construção civil dos polacos da PBG e dos irlandeses da SRB Civil Engineering. Em Varsóvia, as pessoas interrogam-se como a Covec vai conseguir manter o preço contratado e se tenciona importar mão-de-obra chinesa barata, como sucede nos projectos chineses em África.

União Europeia

Depois do canalizador polaco, o investidor chinês

Qual vai ser o futuro das relações comerciais entre a Europa e a China? A imprensa europeia parece resignada ao inevitável domínio do Império do Meio. Zbynek Petracek ironiza, nas páginas do Lidové Noviny, dizendo que o arquétipo do canalizador polaco ou do proxeneta da Europa de Leste podem, em breve, tornar-se silhuetas ultrapassadas pela ascensão inelutável do investidor chinês. "Ainda há trinta anos, 'Made in China’ era uma raridade, que se via em bolas de pingue-pongue e em canetas. Agora, está em quase tudo", escreve no diário checo. A seu ver, o recente sucesso de um consórcio chinês que ganhou o concurso de construção de uma estrada polaca, entre Lodz e Varsóvia, baseia-se apenas na premissa dos preços baixos. "Se os europeus não gostam que assim seja, devem contrapor algo comparável."

Mas isso parece improvável, segundo o correspondente do diário londrino The Daily Telegraph em Pequim. Na perspectiva chinesa, "a Europa é uma entidade cada vez mais dividida e enfraquecida, incapaz de negociar a uma voz e rapidamente passada para trás pelo fervilhante relacionamento EUA-China." As tensões com a UE e as questões proteccionistas e de direitos humanos levaram a China a “centrar as suas transacções em negociações país a país, entabulando um diálogo económico estratégico com o Reino Unido, situação que a França e a Alemanha procuram agora reproduzir”. Contudo, a ratificação do Tratado de Lisboa talvez contribua para evitar que a Europa de se veja marginalizada, através da “criação de um presidente europeu e de um alto-representante para os Negócios Estrangeiros”. De um G2 EUA-China, a Europa pode transformar-se no “terceiro elemento vital no processo de reformatação de um mundo novo, multipolar”.

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