Consta que há pessoas que pagam os seus impostos porque consideram que é o que está certo. Não porque pensem que o Estado tem necessidade dos vários milhares de euros que lhe pagam todos os anos, nem porque não têm conta na Suíça. São geralmente as mesmas que não sacam ilegalmente filmes da Internet, porque acham imoral privar de direitos o autor de uma obra. São pessoas que seguem o preceito do filósofo Immanuel Kant, que diz mais ou menos isto: reflecte sobre o que aconteceria se todos fizessem como tu!
O que vão pensar essas pessoas – que existem, efectivamente – de um Governo que tenciona comprar dados roubados a instituições bancárias, a fim de desmascarar os prevaricadores fiscais e reclamar-lhes impostos retroactivos?
Uma concepção particular da justiça
Pensem no que seria o Estado considerar ser seu direito violar a lei, porque alguns políticos têm uma concepção muito sua da justiça. É o caso de Sigmar Gabriel, dirigente do SPD, que resumiu este problema delicado declarando que “não se pode deixar fugir os bandidos a pretexto de que foram desmascarados por outros bandidos”. [Em 1 de Fevereiro, a chanceler Angela Merkel declarou, por seu turno, que era necessário "fazer tudo para obter esses dados".]
É essa a concepção de justiça do Governo e do SPD: pôr-se fora da lei para apanhar os transgressores? Para eles, o fim (encher os cofres do Estado) justifica os meios, revelando a sua relação táctica com o Estado de Direito. Permitem-se colocar-se acima das leis. A compra de bens roubados para seu próprio lucro constitui, na verdade, um delito punível com pena de prisão de até cinco anos. Mesmo a simples tentativa de compra de bens roubados é um acto punido por lei.
"Aposse do poder corrompe inevitávelmente a razão"
Mas se o Estado tem o direito de definir a sua própria moral em relação à lei, por que não podem os cidadãos fazer o mesmo? Como garante do Estado de Direito, o Governo não é obrigado a respeitá-lo ainda mais ele próprio? A lei não tem precisamente por função limitar o poder do Príncipe, para que este não seja livre de fazer o que considere oportuno?
Afinal, para os particulares, não faltam boas razões para os cidadãos que pensam colocar o seu dinheiro na Suíça se justificarem. Não é preferível assegurar aos filhos uma educação de qualidade, em vez que colocarem esse dinheiro na boca do monstro estatal? Não é mais nobre dar alguns euros extra à mulher-a-dias [que trabalha clandestinamente] do que dá-lo ao fisco? Se o Estado puder fazer a sua interpretação do direito, porque não poderão os cidadãos fazer o mesmo?
E assim, os contribuintes que pagam os seus impostos porque julgam imoral violar a lei começam a duvidar das palavras de Immanuel Kant. imagine-se só o que poderia acontecer!
VISTO DA SUIÇA
Angela Merkel destrói o sigilo bancário

Pierre Ruetschi, Tribune de Genève (excertos)