Dantes, o FMI era uma organização através da qual as economias ricas do Ocidente resgatavam as economias em dificuldades do mundo emergente. Agora, a situação é precisamente a inversa.
À exceção da Alemanha e, talvez, do Japão, é o Ocidente que está virtualmente na falência. E, agora, são as economias de crescimento rápido da Ásia e da América Latina que estão a financiar o Ocidente. Até os Estados Unidos, que continuam a dar cartas em muitas das decisões do FMI, são de facto financiados pela China. E, no entanto, a China tem menos votos no FMI do que o Reino Unido.
Portanto, existem argumentos de imparcialidade em favor de que o principal cargo do FMI, apressadamente abandonado por Dominique Strauss-Kahn, seja atribuído a um não ocidental. Mas também há boas razões de ordem prática para tal. Seria mais provável um não ocidental apresentar um parecer firme, não baseado em sentimentos, sobre a linha de ação a seguir pelas economias da zona euro em dificuldades, o parecer que é sempre posto de lado e que é este: abandonem a zona euro.
Penso apenas que é difícil imaginar que Christine Lagarde seja capaz de dizer à Grécia qualquer coisa como: "Olhem, vocês não precisam de outra operação de resgate. A longo prazo, o melhor a fazer é retirarem-se ordeiramente da moeda única".
Creio que, por mais notável que seja, a ministra das Finanças francesa está, como qualquer outro candidato europeu, demasiado presa ao establishment da União Europeia e demasiado integrada na elite francesa para ser capaz de acreditar firmemente no abandono do euro. Para, por exemplo, um singapurense desapaixonado, a decisão de recomendar à Grécia a saída da zona euro constituiria um problema muito menos traumatizante.
Estatuto de "estrela rock financeira"
E mesmo que assim não fosse, ficaríamos melhor com alguém em relação a quem a ideia de que se tratava de um amigo de Sarko[zy] nunca nos passaria pela cabeça. Por isso, apesar de ser verdade que conhece bem os meandros da zona euro, Christine Lagarde também poderá ser mais cega às fraquezas desta. O "peso" político – que ela tem de facto – só é útil se for usado na direção certa.
Além disso, o peso do FMI é mais financeiro do que político e os seus métodos são tão intelectuais quanto diplomáticos. Deve ter um presidente decidido a chegar à raiz dos problemas da Europa e que não se limite a distribuir dinheiro, em resgate atrás de resgate. E não tenhamos dúvidas: a causa principal das sucessivas crises da dívida soberana da maior parte dos países da zona euro é a competitividade, ou a falta dela, e a incapacidade que mostram de a recuperar dentro do regime atual.
O sistema do "tamanho único" aplicado à taxa de juro fracassou. Neste momento, o Banco Central Europeu está a planear o aumento das taxas, por recear a inflação. Na Alemanha, as pessoas poderão ser capazes de fazer face ao problema mas, em Espanha, esses aumentos empurrarão ainda mais para o abismo o mercado imobiliário em crise e os bancos falidos, desencadeando outra crise.
Uma economia em dificuldades precisa da opção de desvalorizar a moeda nacional (como fez o Reino Unido), para manter as exportações e voltar à normalidade.
Um dia qualquer, nos próximos anos, em Portugal, na Irlanda ou na Grécia, poderá surgir um político – provavelmente nacionalista e demagogo – a exigir o fim do desespero, da "austeridade" sem fim, da estagnação e da emigração e a pedir que o seu país abandone o euro.
Seria sensato que o próximo presidente do FMI impedisse isso. A despeito do seu estatuto de "estrela rock financeira”, Christine Lagarde não é a pessoa indicada para essa tarefa. Não sou capaz de pronunciar o seu nome, mas prefiro Tharman Shanmugaratnam (o atrás referido singapurense).