Nicolas Sarkozy au Parlement marocain à Rabat, en 2007.

Sarkozy, o novo patrão da Europa

A Europa já não é a mesma, sobretudo do ponto de vista de Berlim. A crise financeira e as medidas de recuperação do euro abalroaram a União. O timoneiro alemão não deu conta do recado. Agora, constata o Berliner Zeitung, são os franceses que assumem o controlo.

Publicado em 12 Maio 2010 às 15:20
Nicolas Sarkozy au Parlement marocain à Rabat, en 2007.

A política é uma actividade cruel. Vitória e derrota andam frequentemente a par, tal como triunfo e queda. Por vezes, pode-se perder tudo em poucas semanas.

O mais recente exemplo é o de Angela Merkel, a chanceler alemã. No final de Março, era a rainha da Europa. Dominou a cimeira da Primavera em Bruxelas. Ditou as condições de negociação das bases para um conjunto de medidas destinadas a salvar os gregos em apuros. Para ela, nada devia ser feito. Os outros Estados que se resignassem.

Seis semanas depois, a antiga soberana está bastante isolada. A prudência não produziu efeitos. O seu poder desgastou-se, tanto dentro como fora da Europa. Quando, no fim-de-semana passado, de um dia para o outro, os Estados da UE traçaram um gigantesco plano de emergência para salvar o euro, foi a França que assumiu o comando – em estreito acordo com a Itália e outros países mediterrânicos.

Alemães cederam lugar que era sagrado

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Estes recentes acontecimentos são o sinal de uma ruptura. A crise financeira e as medidas de recuperação da Zona Euro vão perturbar profundamente a União Europeia. Esta vai passar a ser mais francesa e menos alemã. E não apenas porque o Presidente francês, Nicolas Sarkozy, soube posicionar-se como gestor da crise, com uma visão de longo prazo, enquanto os pensamentos de Merkel continuavam voltados para as eleições na província alemã da Renânia do Norte-Vestefália [a 9 de Maio]. No futuro, a política na Europa será à francesa. Os métodos e as instituições também.

De uma cajadada, no fim-de-semana passada, os alemães cederam um lugar ainda há pouco sagrado a seus olhos. Agora, as coisas passam-se como Paris entender: na sua forma actual, o pacto de estabilidade do euro, invenção alemã, só pode serve para ir para o lixo. Porque, na prática, não é o pacto que garante a estabilidade da moeda única, mas o plano de 110 mil milhões para os gregos e a almofada de 750 mil milhões previsto para outros Estados potencialmente em falência.

Nada será agora possível sem uma liderança política

Acabou, de facto, a proibição de apoiar os Estados em apuros. Nos últimos meses, os alemães brandiram esta cláusula como um escudo para se defender de eventuais reacções de Karlsruhe [sede do Tribunal Constitucional alemão]. Os franceses nunca partilharam tais ideias. Acabaram por levar a melhor.

Sarkozy aproximou-se do seu objectivo de governação económica comum aos dezasseis membros da Zona Euro. Foram efectivamente eles que tomaram as decisões cruciais do fim-de-semana passado. A Comissão Europeia foi relegada para um papel operacional. Há, no entanto, um ponto decisivo: todos os países da Zona Euro têm vindo a compreender gradualmente que nada será doravante possível sem uma liderança política e um nítido reforço da coordenação económica entre parceiros. Até agora, os alemães foram sempre surdos a este discurso. A partir daqui, a Europa vai dispor de uma governação económica, oficial ou não. A União Europeia não tem opção, se quiser remediar aos erros de concepção da sua moeda.

A visão alemã não vai conseguir voltar a impôr-se

É também a visão francesa do Banco Central Europeu (BCE) que hoje vigora. Concebido segundo o modelo alemão do Bundesbank como instituição independente, o BCE deixou-se de súbito envolver no acordo concluído em Bruxelas no fim-de-semana passado. Declarou-se disposto, em caso de urgência, a comprar a dívida dos Estados à beira da falência. A sua independência é apenas uma memória. O Banco Central deixa de ser apenas o executor dos órgãos políticos, situação não somente inédita, mas revolucionária.

Não sejamos ingénuos. A visão alemã não vai conseguir voltar a impor-se quando as bolsas se tiverem acalmado e a crise financeira tiver passado. Uma semana bastou para fazer cair os tabus europeus, uns atrás dos outros. Quando os parceiros europeus começarem a reflectir nas consequências desta crise do euro e a definir as novas regras do jogo para a união monetária, os alemães vão ficar numa posição delicada. O seu modelo europeu não resistiu à prova. Eles próprios acabaram por percebê-lo, ao subscreverem o vasto plano de salvação da moeda europeia.

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