Será assim tão difícil realizar um referendo sobre a Europa?

O Mecanismo de Estabilidade é parte da questão. O pacto orçamental também. As grandes decisões políticas de um país deverão ser submetidas ao voto dos cidadãos? Na Áustria, onde desde há alguns meses estão em debate a transparência e a democracia direta, a classe política não parece preparada para isso.

Publicado em 10 Julho 2012 às 14:14

Heinz Fischer deixaria de ser ele próprio se não tivesse, pelo menos, duas opiniões diferentes sobre o assunto. Mais democracia direta? No domingo, dia 8 de julho, no programa Pressestunde am Sonntag, o Presidente austríaco declarou ser perfeitamente capaz de imaginar que se permitisse um maior envolvimento do povo nas decisões importantes.

Mas também é perfeitamente capaz de imaginar não fazer tal coisa. Em primeiro lugar, mais democracia direta não deve relegar para segundo plano o Conselho Nacional [a assembleia de deputados, que, em 4 de julho, aprovou o Mecanismo Europeu de Estabilidade e o pacto orçamental]. Em segundo lugar, o Presidente parece muito preocupado com a hipótese de, se os referendos se generalizarem, os problemas em questão poderem vir a ser "debatidos nos tabloides". Realidades complexas como o pacto orçamental ou a criação do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) não são adequadas para serem plebiscitadas dessa forma. Porque a maneira como seriam representados poderia ser demasiado "popular".

É interessante. Quase no mesmo momento, o homólogo alemão de Fischer, Joachim Gauck pedia vivamente à chanceler Angela Merkel que voltasse a explicar em pormenor aos alemães as medidas destinadas a salvar o euro, que têm sido alvo de muitas críticas. Para que os eleitores percebessem também o que os espera. E Gauck tem toda a razão. Uma decisão de tão grande alcance não pode ser tomada à revelia dos cidadãos. Pelo menos se se quiser evitar que os cidadãos se desloquem em massa para o campo dos eurocéticos ferrenhos.

Estados responsáveis pelas dívidas dos outros

Os austríacos também têm direito a uma explicação pormenorizada. Será assim tão difícil dizer aos cidadãos, usando frases simples, que, com a criação do MEE, todos os Estados passarão a ser responsáveis pelas dívidas de todos os outros? E em que medida seria "debater nos tabloides" explicar à população que, de futuro, não somente as dívidas dos Estados serão responsabilidade comum, mas também que parte dos fundos de ajuda públicos serão utilizados para salvar os bancos privados – em vez de se deixar que os acionistas absorvam as perdas, como deveria ser feito?

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A "discussão nos tabloides" de determinadas questões complexas, que Heinz Fischer tanto receia, talvez fizesse algum bem a este país. Uma apresentação compreensível de realidades difíceis de entender não implica necessariamente reduzir e alterar de forma simplista essas realidades, conforme ficou provado, em junho de 1994, com o referendo sobre a adesão da Áustria à União Europeia.

Os nossos vizinhos suíços mostram-nos até onde pode ir a democracia direta e em que medida a população é capaz de tomar decisões adultas. No início do ano, os suíços votaram contra o prolongamento das férias pagas, que passariam de quatro para seis semanas. Não porque tenham alguma coisa contra o aumento do período de férias. Mas porque pensaram que a economia, já sujeita a forte pressão, poderia ficar ainda mais fragilizada.

Na Baixa Áustria não se importuna a população

Em 2005, em Saint-Gall, uma larga maioria da população rejeitou uma iniciativa destinada a desenvolver os hospitais regionais. Não porque os cidadãos tivessem alguma coisa contra uma densidade hospitalar mais elevada. Mas porque lhes foi explicado, com palavras simples, que essa medida levaria, logicamente, a um aumento dos impostos. Na Baixa Áustria, em contrapartida, não se importuna a população, manifestamente demasiado ocupada a ver [o programa televisivo de variedades] Musikantenstadel; os "especialistas" do parlamento regional tomam decisões sobre questões importantes em nome dela: foi designadamente graças a esses "especialistas" que se decidiu a construção de dois hospitais novinhos em folha, a doze quilómetros de distância.

Não se trata de obrigar a população a votar por tudo e por nada. Seria bom que esta pudesse dizer o que pensa, quando se colocam questões estratégicas. Como a seguinte: será preciso um MEE? Ou esta: deverá o Estado gastar permanentemente mais do que recebe? Ou ainda: as despesas do Estado deverão ser limitadas pela Constituição? Ou, por exemplo: a idade da reforma deverá ou não aumentar, em função do aumento da esperança de vida?

Ninguém deve ter medo das respostas a perguntas deste tipo. Nem mesmo a população, que se diz ser tão tola, poderá tomar decisões piores do que as dos especialistas do Conselho Nacional. Afinal, a fasquia não foi colocada muito alta, não é verdade?

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