Um rosto para o euro

Publicado em 11 Janeiro 2013 às 14:35

O que é que tem nuances de cinzento, castanho e verde, que é maleável e que cabe no bolso? A última patranha de Mario Draghi, dirão alguns espíritos retorcidos ou cáusticos. Mas a nova nota de cinco euros, apresentada em 10 de janeiro – sim, é disso que se trata – é a prova mais banal e ao mesmo tempo mais concreta de que as autoridades europeias mantêm inabalável a sua fé no futuro da moeda única. Que haverá de mais simbólico, aos olhos do público, dos políticos nacionais e dos mercados que a introdução de uma nova nota?

O presidente do Banco Central Europeu (BCE) preferiu colocar a tónica na inovação gráfica da nota: a presença de um rosto humano, no caso presente o da personagem mitológica Europa, copiada de uma cerâmica grega, em exposição no Museu do Louvre, em Paris. Até agora, as notas de euro apresentavam apenas monumentos imaginários ilustrativos da história da arquitetura europeia da Antiguidade até aos nossos dias.

Quando do lançamento da moeda única, os dirigentes europeus desistiram, após profunda reflexão, da escolha de personalidades ou monumentos reais. Quem, entre Goethe, Cervantes ou Victor Hugo, teria ornamentado as notas de 500 euros, e não as de dez euros? Porquê escolher o Coliseu e não a Acrópole (ou o inverso)? O medo de ferir suscetibilidades nacionais e o receio de, assim, tornar impopular esta divisa artificial levaram à decisão de inventar monumentos tipo. Com risco de reforçar o caráter impessoal do euro.

Mais de dez anos após a introdução das moedas e notas, esta problemática parece estar ultrapassada. Nem mesmo a crise do euro parece ter posto seriamente em causa este novo hábito diário dos europeus. Agora que acaba de ser dado o primeiro passo, poderíamos incentivar o BCE a ir mais longe em matéria de audácia.

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Quando a UE recebeu o prémio Nobel da Paz, muitas pessoas, incluindo alguns dirigentes políticos, salientaram que o galardão premiava tanto os Fundadores da construção europeia como os seus continuadores atuais. Então, por que não ir mais longe nessa homenagem e consagrar Robert Schuman, Jean Monnet, Altiero Spinnelli ou Paul-Henri Spaak, para citar apenas alguns?

Haverá quem contraponha que eles não são suficientemente conhecidos do grande público e que representam uma visão tecnocrática da Europa. Contudo, isso seria precisamente uma forma de integrar as referências históricas e culturais comuns dos europeus (mesmo que se tratasse apenas daqueles cujos países são membros do euro). E isso seria de qualquer modo melhor que monumentos inventados, que ninguém pode visitar.

Nada impediria depois que se ornamentassem as nossas notas com escritores, pintores e músicos, dantes ostentados nas nossas antigas moedas nacionais. Para fazer finalmente do euro uma moeda com rosto humano.

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