Mariano Rajoy, um valor em queda

O primeiro-ministro espanhol desdobra-se em medidas de austeridade para evitar o colapso económico do seu país. Após sete anos de oposição, porém, torna-se difícil ser inteiramente credível e eficaz, explicam três economistas.

Publicado em 10 Abril 2012

Espanha está num momento chave da sua História. Com o nervosismo a regressar aos mercados de dívida, um Orçamento para 2012 que convenceu muito poucos e uma economia em recessão, aproximamo-nos de um resgate que é preciso evitar a todo o custo porque as suas consequências seriam gravíssimas.

Primeiro, porque aqueles que interviriam são nossos credores e, portanto, não teriam como objetivo os nossos melhores interesses. Segundo, porque o resgate imporia um ajuste económico e financeiro ainda mais profundo. Terceiro, porque se sabe como se entra nestas intervenções, mas não se sabe como se sai.

Os resgates expulsam o capital privado e secam a liquidez do país. E quanto, porque não funcionaria: as intervenções do FMI baseiam-se em desvalorizações da moeda e pelo consequente aumento da procura externa. Como isto não é possível na zona euro, as intervenções na Grécia e em Portugal não melhoraram nada.

Um orçamento vítima do populismo

O que é que correu mal? Como voltaram tão depressa as nuvens temporariamente afastadas após a intervenção do BCE em dezembro? A resposta é simples mas demolidora: o novo Governo, apesar de ter feito uma reforma laboral decisiva, não soube deter os dois problemas fundamentais que abalavam a nossa credibilidade: o setor financeiro e a política orçamental.

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A situação do sistema financeiro é crítica. Fracassámos completamente no que diz respeito a convencer os mercados de capital a refinanciarem os nossos passivos bancários. As entidades espanholas só podem emitir com avales do Estado e vivem protegidas pela liquidez prevista pelo BCE. A reação lógica aos novos requisitos de capital foi restringir o crédito, o que estrangulou muitas empresas.

Quatro motivos afetaram a política orçamental. O primeiro é o absurdo baile de números sobre o défice de que padecemos desde o outono e que leva os observadores a perguntarem-se qual é o verdadeiro estado das nossas finanças públicas. O segundo é o intolerável atraso na apresentação do orçamento. Não só desbaratou o estado de graça de 100 dias que se concedeu ao novo Governo como também, ao apresentar-se logo a seguir às eleições andaluzas, deixou claro que, em Espanha, subordinamos a urgência à política.

O terceiro erro é que este orçamento é vítima de anos de oposição baseados no populismo [o Partido Popular, no poder, esteve na oposição]. Como se prometeu não cortar pensões ou salários dos funcionários públicos e não subir o IVA, não resta outro remédio ao orçamento senão reduzir o investimento e tentar uma amnistia fiscal. Mas os mercados não se deixam enganar com malabarismos. Percebem que este orçamento deteriora a nossa situação económica a médio prazo e demonstra a incapacidade dos nossos governos para encararem os problemas.

Espanha pode exigir um tratamento diferente

Finalmente, contínua imparável a sangria das finanças autonómicas e ninguém acredita que as comunidades autónomas cortem 27 mil milhões de euros, o exigido para 2012. O que fazer? Primeiro, o governo tem de esquecer as eleições, sejam estas galegas, bascas ou gerais e desterrar os fazedores os sondagens para outras tarefas. A prioridade absoluta é resolver a nossa falta de credibilidade.

Segundo, recuperar o mais depressa possível o fluxo de crédito. Isto só será conseguido se a confiança regressar ao setor bancário e este poder aceder ao mercado de capitais sem avales do Estado e sem a liquidez do BCE. Uma alternativa clara é a utilização do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira para recapitalizar o sistema financeiro, o que não exige uma intervenção. Espanha tem motivos suficientes para exigir um tratamento diferente daquele que receberam outros sócios menos responsáveis.

Terceiro, traçar um caminho de consolidação económica e financeira plurianual credível, pausada e sistemática. Como medidas de despesa, este plano deveria cortar os salários dos funcionários públicos, reduzir o seu número e congelar as pensões, enquanto as despesas com educação, investimentos produtivos e investigação e desenvolvimento deviam, tanto quanto possível, manter-se. No que diz respeito às receitas, este plano deveria introduzir uma subida escalonada do IVA ao longo dos próximos cinco anos. Como medidas institucionais, este plano devia criar um conselho fiscal independente e repensar radicalmente o financiamento autonómico para nos dar um modelo de Estado racional. Não é admissível que os regulamentos discutidos pela Comissão Europeia deem a esta instituição mais poder para controlar o governo de Espanha do que este tem sobre as suas autonomias rebeldes.

Depois de quatro anos de crise em que os governos de Espanha, o atual e o anterior, andaram a reboque dos acontecimentos, pode já ser tarde para mudar as coisas. Mas ainda vale a pena tentar porque estamos, agora sim, perante aquela que pode ser a nossa última oportunidade resolver estar interminável crise. Mas, para isso, precisamos de uma mudança radical de atitude, que comece com o abandono do errado populismo dos últimos anos de oposição ao governo Zapatero.

Orçamento

Cortes sem fim

A lista dos cortes orçamentais parece não parar de aumentar. “Rajoy acelera os ajustamentos face à pressão dos mercados e da UE”, titula El País. Através de um comunicado, no dia 9 de abril, o Governo de Mariano Rajoy anunciou um programa a que chamou de “estabilidade 2012-2015". Envolve dez mil milhões de euros de poupanças adicionais em relação aos cortes orçamentais de 27,3 mil milhões de euros anunciados a 29 de março. Uma decisão tomada numa altura em que a Bolsa de Madrid está em forte declínio e o prémio de risco sobre as obrigações de Estado espanholas superou pela primeira vez desde dezembro os 4 % de diferença em relação às alemãs.

Estes novos cortes, que afetarão setores tão sensíveis como o da saúde ou da educação, têm como objetivo “inspirar confiança” nos mercados e na UE, acrescenta o diário madrileno. O Governo compromete-se nomeadamente a fazer com que as regiões, muito endividadas, cumpram estas medidas, algo de que os analistas internacionais duvidam.

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