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Os dirigentes da FN - Marine Le Pen, o seu pai Jean-Marie e Bruno Gollnisch - na noite da segunda volta das eleições regionais francesas, 21 de Março de 2010 (AFP)

A campanha nortenha da Frente Nacional em França

O partido de Jean-Marie Le Pen causou surpresa nas eleições regionais francesas de 21 de Março, ao atingir os 20% em várias regiões. Nas zonas rurais do Pas-de-Calais (Norte), a sua filha Marine chegou a ultrapassar os 22%, graças a um discurso centrado na defesa dos camponeses contra a Política Agrícola Comum da UE.

Publicado em 23 Março 2010 às 17:27
Os dirigentes da FN - Marine Le Pen, o seu pai Jean-Marie e Bruno Gollnisch - na noite da segunda volta das eleições regionais francesas, 21 de Março de 2010 (AFP)

No pequeno município de Lisburgo (Pas-de-Calais), os resultados estão afixados na porta envidraçada da Junta: 509 eleitores inscritos e Marine Le Pen à frente, com 37,05% dos votos expressos. Vinte pontos mais do que nas regionais de 2004. Valérie Létard, cabeça de lista da UMP (União para um Movimento Popular, partido no poder em França) atingiu os 32,87% e perdeu 13 pontos. Coisa nunca vista nesta aldeia do Ternois, terra verdejante e acidentada, de exploração leiteira.

Aqui, as pessoas são da UMP, do mesmo modo que são agricultores, de pai para filho. Willy Gallet, adjunto do presidente da junta encarregue das festas, ainda não se recompôs. "Uma votação destas, 133 votos!" É certo que a lista da FN incluía "uma pessoa da terra", como diz a dona do café Chez Mimi, numa posição elegível. Que, aliás, foi eleito conselheiro regional, no domingo. "Olivier Delbé foi da UMP", suspira Willy Gallet. "E depois, há um mês, ficámos a saber pela imprensa que ele era candidato pela lista da Frente Nacional."

"Le Pen tem razão quando diz que temos de ser franceses antes de sermos europeus"

Noutras aldeias das redondezas, a FN obteve idêntico sucesso. Beaumetz-lès-Aire, 39%, Fléchin, 32%. Willy Gallet comenta: "Não votaram no homem certo, votaram no descontentamento". Olivier Delbé não baseou a campanha nos temas tradicionais da FN: "Aqui, não há imigração. E também não há criminalidade: a porta da minha casa está sempre aberta", troça Bruno, que é agricultor. Este homem corpulento, com os olhos a brilhar de malícia, recebe-nos sentado diante da mesa da sala de jantar da quinta da família. Não, o problema é outro: o Ternois é uma terra de produção de leite e a descida do preço deste arruinou muita gente.

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Bruno cuida sozinho da sua exploração de 50 hectares, com a ajuda dos pais. Vai deixar de produzir leite dentro de oito dias: cumprir as normas da União Europeia iria deixá-lo endividado. Prefere concentrar-se na criação de animais para produção de carne: ovinos e bovinos. "Calçar as botas". "O Le Pen tem razão, quando diz que devemos ser franceses antes de sermos europeus. Tínhamos votado não quanto à Constituição Europeia e depois foi sim. Portanto, é claro que estamos descontentes", diz. Critica a política de Sarkozy e daqueles "que dizem que vamos receber ajudas e, afinal, são empréstimos sem juros. O melhor que os políticos faziam era calçar umas botas e visitarem uma quinta a sério, não uma quinta da televisão."

Uma lição para Nicolas Sarkozy

Marine Le Pen deslocou-se a Lisburgo e deu uma conferência de imprensa ao lado do seu candidato local. Voltou para lhe dar apoio, entre as duas voltas das eleições. "A Frente Nacional fez uma boa campanha", admite Willy Gallet. Djamel Mermat, universitário especialista da FN, que o infiltrou em Hénin-Beaumont, em 2008, reconhece o papel desempenhado pela filha de Le Pen na obtenção dos actuais resultados. "Ela conquistou 70 mil votos na região Nord-Pas-de-Calais, entre as duas voltas. Colheu os frutos do seu método largamente aplicado para lá de Hénin-Beaumont: a presença no terreno e não apenas nas cidades principais e um discurso trabalhado." "Isso não nos interessa." O aparelho de Le Pen estende-se a todo o território e ajuda os candidatos da FN nas pequenas comunas, por exemplo, com panfletos. Um jogo para ganhar e também para uso interno.

"Jean-Marie Le Pen fez bem em promover a filha. Ela precisa de um apoio militante. Trabalha com profissionalismo e espera uma boa votação dentro do partido", explica Djamel Mermat. Na quinta de Bruno, a mãe deste, Jeanne-Marie, também acha "normal" o resultado de Le Pen, ainda que aponte para um monte de correio onde ainda há envelopes com mensagens políticas por abrir. "Isso não nos interessa, está a ver?" Lamenta que, hoje, "um agricultor não possa dar de comer à mulher. Há 20 anos, quando se tinha 15 hectares, até se podia comprar mais terras". Bruno concorda: "Agora, alguns têm 200 hectares e as suas mulheres são obrigadas a trabalhar fora. Conheço um assim. Estava endividado em 105% por doze anos e ainda lhe faltam dois anos a trabalhar para nada, só para pagar reembolsos. Há dez anos que é a mulher que lhe dá de comer." E, a meia voz, acrescenta: "O Sarkozy não pensa em nós e estava a precisar de uma lição".

Frente Nacional

Extremista e familiar

Fundada em 1972 por Jean-Marie Le Pen, de 81 anos – seu único presidente até hoje –, a Frente Nacional (FN) é um partido da direita nacional, populista, soberanista e fascista para alguns politólogos. Força marginal, a FN começou a crescer em termos eleitorais a meio dos anos 1980, representando 11 a 18% do eleitorado nacional e cerca de 30% nalgumas cidades, especialmente a Sul e na Alsácia, graças ao seu discurso anti-imigração e ao seu lema "está tudo podre". O declínio a partir de 2007 foi de curta duração: o debate sobre a identidade nacional, lançado pelo Governo em 2009, trouxe as suas teses de novo para a ribalta. Aproveitando o êxito nas autárquicas de 22 de Março, Marine Le Pen, vice-presidente do partido e filha de Jean-Marie Le Pen, poderá ser a líder natural da FN. Esta força elegeu três deputados para o Parlamento Europeu: Bruno Gollnisch e os Le Pen, pai e filha.

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