"O Pensador" de Auguste Rodin. Foto de Javier Vazquez.

A Europa que o leste quer!

Para sair da crise, a União Europeia tem de ser ousada e fundar um novo projecto, que seja pelo menos tão ambicioso quanto o foi a Moeda Única. Pelo menos, é este o desafio do relatório "A Europa, pode fazer melhor", redigido em Varsóvia pelo semanário Polityka e pelo centro de reflexão demosEuropa.

Publicado em 24 Julho 2009 às 17:31
"O Pensador" de Auguste Rodin. Foto de Javier Vazquez.

O momento é único. A Europa perdeu a oportunidade e não sabe bem o que há-de fazer, apanhada no meio de uma crise económica, institucional e de falta de valores e visão de futuro. Mas a UE acabou de inaugurar uma nova época institucional: um novo Parlamento e, em breve, uma nova Comissão. É preciso vencer a apatia europeia.

OPolityka e o think tank demosEuropa - Centro para a Estratégia Europeia , criaram um grupo de reflexão com o propósito de preparar uma nova agenda para a União Europeia. No passado dia 16 de Julho, foi apresentado em Varsóvia o vasto relatório intitulado, A Europa Pode Fazer Melhor, que será igualmente apresentado noutras capitais europeias. A sua mensagem é clara:a UE tem de avançar e empreender um novo e rigoroso projecto de integração, comparável ao projecto do Mercado Único aos anos 80, ou ao da Moeda Única nos anos 90.

A UE é mais do que uma organização internacional bem sucedida: é um projecto político e civilizacional. A sua importância e significado são determinados pelo aspecto aliciante daquilo que a Europa tenha para oferecer a si própria e aos outros. O actual debate europeu estagnou, suspenso entre o sonho de uns Estados Unidos da Europa, que até há muito pouco tempo absorvia toda a gente, e um pragmatismo enganador, que domina a vida política do velho continente. Este pragmatismo é como um vírus que enfraquece a União, passando por várias mutações ao longo do processo. Abrange as questões mais importantes, incluindo o funcionamento do mercado único. Paradoxalmente, este tipo de "auto-desintegração" da UE pode ser mais perigoso do que os ataques directos à sua legitimidade.

Ao pronunciarem-se recentemente sobre o Tratado de Lisboa, os juízes do Tribunal Constitucional alemão argumentam, ao longo de 147 páginas, que a integração europeia foi longe de mais ao restringir as competências nacionais. Temos de escolher – ou um Estado-nação ou uns Estados Unidos da Europa. Ter os dois, é impossível.

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Nestes últimos tempos, a expressão "G2", em voga, significa o grupo constituído pelos EUA e pela China. Nenhum país europeu pode ser parceiro exclusivo destes dois países. E se a UE transformasse o G2 em G3? Se perder a batalha pela influência global, deixará de existir como entidade política. Para que o G3 seja uma realidade, a UE tem de desenvolver uma cultura estratégica comum e aprender a confiar nos seus representantes.

O Tratado de Lisboa dá luz verde a uma diplomacia europeia que pode demorar anos a criar e ficar dependente das principais capitais europeias ou ser rapidamente criada e devidamente apetrechada. Não restam dúvidas de que esta última é a hipótese que devia prevalecer.

A Europa precisa de ser politizada, por exemplo, com a criação de verdadeiros partidos políticos europeus.Só eles, e não os partidos nacionais, é que deveriam conduzir o debate antes das eleições para o Parlamento Europeu. Deste modo, evitar-se-iam campanhas eleitorais locais, dominadas por questões nacionais e pelas ambições das diferentes "capelinhas". Os europeus passariam a discutir assuntos à escala continental – por exemplo, protecção ambiental, transportes e energia – questões que não podem ser solucionadas por um Estado-membro.

É necessária uma cooperação estreita entre a UE e a Nato. Esta nova fase devia começar pela revisão dos principais desafios e pela designação de um denominador comum à E

Estratégia de Segurança Europeiae ao novo Conceito estratégico da NATO. A UE precisa de autonomia para traçar um plano de intervenção e não ficar dependente da boa vontade dos Estados-membros.

Felizmente que a crise mostrou a solidez das fundações da UE, nomeadamente do Banco Central Europeu. Se não fosse a moeda única, a Europa teria sido assolada por uma vaga de desvalorizações concorrenciais, com cada Estado-membro a esforçar-se por conseguir as melhores taxas de câmbio para si. O Euro precisa de ser fortalecido e passar a ser uma importante moeda de reserva global a par do dólar norte-americano. O alargamento da Zona Euro constitui um dos mais importantes desafios políticos para o próximo decénio. É preciso vencer aquilo que divide os velhos e os novos Estados-membros.

A construção europeia sempre se fundou na integração económica. E este aspecto é sobretudo perceptível em épocas de crise. Neste momento, cada um faz o que quer. A Alemanha inseriu na sua Constituição a obrigação de reduzir o défice orçamental, ao passo que a França quer investir "no futuro" aumentando a dívida pública. Este método do "cada um puxar para o seu lado", em que ganha o mais forte, continua a ser actual. De um ponto de vista polaco, é imperativo defender os princípios fundamentais da UE, isto é, a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais, independentemente da conjuntura económica. A prioridade passa igualmente pelo aumento do orçamento da UE que se situa, actualmente, em 1% do PIB europeu. Estas verbas serão necessárias para apoiar projectos europeus de investigação e desenvolvimento, já que a inovação é o "ser ou não ser" da economia europeia do século XXI.

A crise continua e há outras que aguardam em lista de espera. Uma delas é a crise demográfica, uma questão paradoxal para a Europa. Metade dos europeus terá mais de 50 anos, nos próximos dois ou três anos.Não há nenhuma outra economia ou sociedade no mundo com semelhante perfil demográfico.É preciso um pacto político europeu e adiar a idade da reforma e uma transição gradual (veja-se a Polónia) para um modelo de contribuições fixas.

O balanço das questões que a UE vai enfrentar nos próximos anos é preocupante. É assim que, ironicamente, se explica a desesperante falta de liderança política actual. É incomparavelmente mais fácil procurar refúgio em debates políticos internos e não pensar no que se passa no mundo, na secreta esperança de que alguém resolva as coisas por nós. Mas este idílio aproxima-se do fim. Com Jerzy Buzek à frente do Parlamento Europeu e com a presidência polaca a perfilar-se no horizonte, em 2011, só nos resta armarmo-nos até aos dentes. *Noblesse oblige*!

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