Palestinianos esperar para passar o posto fronteiriço com o Egipto, em Rafah

A Europa tem razão desde 1980

Há 30 anos, a Europa advogou a autodeterminação para o povo palestiniano. Na sequência do ataque do exército israelita à pequena frota em Gaza, dois autores israelitas defendem que ela continua a ser a única solução viável para o conflito do Médio Oriente.

Publicado em 14 Junho 2010 às 10:27
Palestinianos esperar para passar o posto fronteiriço com o Egipto, em Rafah

Há 30 anos, numa sexta-feira 13, em Junho, uma declaração emitida pela Comunidade Europeia criou uma nova base para o diálogo, apoiando a “autodeterminação” do povo palestiniano e incitando a Organização para a Libertação da Palestina a “associar-se” às negociações para a paz no Médio Oriente. Surgida no meio dos esforços norte-americanos para o relançamento de negociações sobre a autonomia palestiniana entre Israel e o Egipto, na sequência do tratado de paz assinado pelos dois países um ano antes, a Declaração de Veneza deixou Jerusalém em estado de choque e fez ranger alguns dentes em Washington.

O primeiro-ministro israelita, Menahem Begin, fez uma das declarações mais furiosas dos anais da diplomacia. Chamou à OLP “as SS árabes” e comparou a declaração europeia às iniciativas de paz de Hitler, dizendo: “Qualquer homem de boa vontade e qualquer pessoa livre da Europa que examine este documento vê nele uma rendição como a de Munique, a segunda da nossa geração, uma extorsão tirânica e um incentivo para todos os elementos que aspiram a destruir o processo de paz no Médio Oriente”.

Princípios fundamentais de uma solução global

Não surpreende, portanto, que nem Bruxelas nem Jerusalém estejam ansiosos por comemorar o seu aniversário. Mas lembrar a Declaração de Veneza representa uma oportunidade para avaliar como resistiu ao tempo – e para reconhecer um momento visionário na política europeia sobre o Médio Oriente.

O veredicto é claro: os europeus tinham razão. Tinham razão em apontar que a resolução do conflito israelo-árabe exigia que Israel reconhecesse a “autodeterminação palestiniana”, o termo de código diplomático para Estado independente. Tinham razão em apelar à inclusão da OLP no processo de paz. E tinham razão em preconizar uma solução generalizada do conflito árabe – uma solução que fosse além do acordo bilateral israelo-egípcio e da autonomia que ambos os países pretendiam negociar em nome dos palestinianos.

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A declaração europeia não só estava certa como era visionária, já que escreveu corajosamente os princípios que uma solução ampla exigia. Esses princípios incluíam o reconhecimento do direito de existência de Israel, as garantias de segurança de todas as partes em conflito (que envolvia, se necessário, a criação de uma força multinacional no terreno) e a retirada israelita dos territórios árabes ocupados a partir de 1967. Chamando aos colonatos judaicos “um obstáculo sério ao processo de paz”, a declaração manifestou-se igualmente contra todas as iniciativas unilaterais para mudar o estatuto de Jerusalém. Estes princípios são os que continuam a definir os contornos do único acordo plausível entre Israel e os palestinianos.

O Médio Oriente espera uma nova Veneza

O facto de se ter provado que os europeus estavam certos não quer dizer, contudo, que as suas movimentações diplomáticas tivessem sido isentas de falhas. Para começar, erraram na forma da apresentação diplomática da declaração e contribuíram assim para a sua rejeição. Na verdade, na sequência da atitude fria dos europeus em relação ao processo de Camp David, encetado pelos Estados Unidos, a Declaração de Veneza apareceu mais como uma demonstração oportunista do que como um esforço bem intencionado.

Quanto a Washington, a sua relutância em reconhecer que algo substancial pudesse sair de negociações para a autonomia conduziu a muitos anos de arrastamento diplomático. Só em Dezembro de 2000 aceitou os termos da Declaração de Veneza, apresentando os chamados Parâmetros de Clinton. A OLP, para a qual a declaração constituía um triunfo diplomático inequívoco, levou mais oito anos a renunciar formalmente à violência e a comprometer-se numa solução de dois Estados.

Contudo a OLP, os Estados Unidos e, em vários graus, até Israel acataram a visão europeia e, três décadas depois, a Declaração de Veneza continua a destacar-se como a mais corajosa iniciativa de paz para o Médio Oriente produzida pela Europa. O facto de nenhum esforço similar se lhe ter seguido tem que ver com muitos factores, incluindo o alargamento da construção comunitária europeia, da falta de músculo político (para não dizer militar) da Europa e dos esforços de Washington para manter Europa ao largo.

Os europeus queixam-se frequentemente de que o seu papel no Médio Oriente tem sido relegado a pagadores em vez de intervenientes. O 30º aniversário da Declaração de Veneza deve recordar-nos a capacidade original da Europa em articular uma posição mais clara, mais corajosa e mais visionária que a dos outros intervenientes. A região precisa de outra Veneza.

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