Bruxelas pode liberalizar culturas transgénicas

A Comissão quer multiplicar as autorizações de plantas geneticamente modificadas, deixando aos Estados a liberdade de as proibirem. Assim, espera satisfazer os países que querem desenvolver o seu cultivo e permitir, aos que lhes são hostis, que o impeçam.

Publicado em 10 Junho 2010 às 15:31

A Comissão Europeia encontrou um meio de desbloquear o espinhoso dossiê dos OGM? O Velho Continente, recalcitrante às plantas geneticamente modificadas, cultiva com estes organismos apenas 100 mil hectares, contra os 134 milhões existentes no resto do mundo. E o Presidente da Comissão, Durão barroso, nunca escondeu que quer acabar com essa excepção.

Bruxelas estuda a possibilidade de permitir uma maior flexibilidade aos Estados para proibirem, internamente, a cultura de sementes OGM, mesmo que sejam autorizadas a nível europeu. Em troca, os países hostis às biotecnologias deixariam de bloquear a aprovação de novas variedades transgénicas. Uma proposta mais concreta deverá ser apresentada, durante o mês de Julho, pelo Comissário da Saúde, John Dalli. Depois, deverá ser aprovada pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu. Mas a França pediu para o assunto ser abordado já na próxima sexta-feira, 11 de Junho, no Conselho Europeu do Ambiente que terá lugar no Luxemburgo.

Oito Estados contra transgénicos no seu território

Concretamente, qual é a proposta? Dalli quer alterar a legislação actual, para permitir aos Estados proibirem os OGM sem serem obrigados a recorrerem a uma cláusula de salvaguarda. Será introduzida uma cláusula de isenção (“opt-out”), que os Governos poderão invocar, sem justificação particular, para proibirem esta ou aquela cultura. O objectivo é claro: preservar o actual sistema europeu de autorização de OGM, dando aos Estados membros a vantagem da autonomia, nomeadamente política. Nesta fase, as cláusulas de salvaguarda deverão, de facto, ser motivadas por razões sanitárias ou ambientais. Quando não é esse o caso, a União Europeia pode ser alvo de uma queixa junto da Organização Mundial do Comércio (OMC).

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Em Março, o colégio de Comissários europeus pôs fim a um longo bloqueio, ao aprovar o cultivo da batata Amflora, a segunda autorização na Europa depois da do milho Mon 810, da Monsanto. Um sinal verde muito criticado pelos defensores do ambiente. Dalli prometeu, nessa altura, precisar as suas intenções até ao Verão. Os eurocratas constatam que o quadro actual não impediu oito países, entre os quais a França, a Áustria, a Alemanha e a Hungria, de se oporem à cultura de uma ou outra OGM no seu território através de uma cláusula de salvaguarda. Em quatro casos, a Comissão tentou obter o levantamento dessas proibições, cuja validade científica é contestada pela Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (EFSA), mas os Estados rejeitaram essas propostas.

A nova abordagem visa combinar a alteração do actual quadro legislativo com uma nova recomendação sobre a coexistência de culturas OGM e não OGM. A Comissão procura, por outro lado, reduzir o impacto desta reforma no mercado interno: a comercialização, e as trocas de produtos OGM não poderão ser limitadas, o “opt-out” refere-se apenas ao cultivo. “As trocas livres de sementes OGM autorizadas (...) deve continuar sem entraves no quadro do mercado interno”, pode ler-se nos documentos da Comissão, que não tenciona reformar a EFSA, cujo funcionamento foi objecto de vivas críticas.

Uma armadilha sob a capa de proposta sedutora

Paris defende, por exemplo, que estas novas propostas não contrariam o documento aprovado por unanimidade pelos Estados membros, durante a Presidência Francesa da UE, no final de 2008, para que fosse revisto, em profundidade, o processo de autorização e o funcionamento da EFSA.

O Ministério da Agricultura francês opôs-se à introdução do princípio de subsidiariedade sobre a cultura de OGM, que poderia introduzir distorções de concorrência, argumenta. Quanto ao aspecto ecológico, insiste no objectivo prosseguido com a cláusula de salvaguarda: ter a certeza de poder cultivar sem risco de contaminação.

No Greenpeace França, Arnaud Apoteker afirma que por detrás do seu aspecto “sedutor”, estas propostas representam uma armadilha: “O texto não esconde que a intenção é acelerar as autorizações. No entanto, a avaliação dos OGM ainda não está implementada de forma satisfatória.”

Para James Borel, vice-presidente executivo do grupo agro-químico americano DuPont, a proposta de Bruxelas representa “um grande passo em frente”, apesar de não ser “ideal”. Três pedidos de autorização estão já em cima da mesa do Comissário Dalli, para os milhos BT 11, do grupo suíço Syngenta, BT 1507, do grupo americano Pioneer (filial da Du Pont) e MON 810, da americana Monsanto, para a renovação da sua autorização.

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