Comércio livre contra mercado único

O mercado transatlântico que está atualmente a ser negociado beneficiará tanto a Europa como os Estados Unidos. Mas representará um enorme desafio para o mercado único europeu e pesará nas economias emergentes.

Publicado em 30 Julho 2013 às 14:49

Com cerca de metade do produto interno bruto (PIB) mundial e quase um terço do volume total de trocas comerciais do planeta, a União Europeia e os Estados Unidos já são os maiores parceiros do mundo em matéria de comércio e de investimento. Se chegarem a fechar o seu ambicioso acordo de comércio livre, a atividade económica do conjunto dos países da UE e os Estados Unidos registarão um enorme crescimento. Mas, com toda a probabilidade, as tradicionais relações comerciais intracomunitárias ficarão fragilizadas. Outra consequência é que alguns Estados ficarão menos dependentes do mercado interno da UE que, no entanto, é um dos principais sucessos e benefícios da integração europeia.
[[O mercado único constitui um dos maiores espaços económicos do mundo]]. Os seus quatro pilares são a livre circulação de pessoas, de mercadorias, de serviços e de capitais. Permitiu suprimir muitas barreiras administrativas e técnicas entre os mercados internos dos seus países membros. A eliminação dos entraves regulamentares nas trocas com os Estados Unidos e a perda das atuais vantagens que dão o direito [aos países da UE] a um tratamento preferencial no mercado interno, irão muito provavelmente diversificar as relações comerciais.
As trocas comerciais entre a Alemanha e os Estados Unidos poderão, praticamente, dobrar. Tal como o volume de negócios global das trocas comerciais entre os Estados Unidos e a Itália, a Grécia e Portugal. Em contrapartida, estima-se que as trocas comerciais entre a Alemanha e a França poderão cair 23% e diminuir 40% entre a Alemanha e o Reino Unido. As vantagens do mercado interno são frequentemente o cimento imaginário que mantém unida a comunidade europeia. Põe-se, por isso, a questão de saber se um enfraquecimento da parceria económica não terá um efeito direto sobre a “unidade” da União Europeia no seu conjunto.

Benefícios para o Sul e o Norte da UE

As trocas comerciais entre a Alemanha e os Estados Unidos poderão, praticamente, dobrar. Tal como o volume de negócios global das trocas comerciais entre os Estados Unidos e a Itália, a Grécia e Portugal. Em contrapartida, estima-se que as trocas comerciais entre a Alemanha e a França poderão cair 23% e diminuir 40% entre a Alemanha e o Reino Unido. As vantagens do mercado interno são frequentemente o cimento imaginário que mantém unida a comunidade europeia. Põe-se, por isso, a questão de saber se um enfraquecimento da parceria económica não terá um efeito direto sobre a “unidade” da União Europeia no seu conjunto.
Nesse contexto, é essencial ter em mente que, ambicioso como é, este acordo de livre comércio UE-EUA provavelmente não trará uma harmonização comparável [e que poderia fazer concorrência] à que existe atualmente entre os Estados membros da União Europeia. [[Não se trata, por isso, do aparecimento de uma União Euro-americana]] ou dos Estados Unidos da Euro-América. Por outro lado, a criação de uma zona de comércio livre transatlântica pode muito bem ajudar a fazer avançar o projeto de realização de mercado interno e a liberalização de domínios onde ainda existe uma excessiva regulamentação e barreiras parciais às trocas comerciais.
Tornar mais fáceis as trocas comerciais entre os Estados Unidos e a UE representará um aumento da atividade económica e uma redução dos custos de produção e dos preços de compra, o que se traduzirá num maior crescimento económico. Os países que mais beneficiarão com esse acordo são os que, tradicionalmente, já mantêm ligações comerciais privilegiadas com os Estados Unidos, como o Reino Unido ou a Irlanda. Mas as economias de Espanha e de Itália registarão igualmente um forte crescimento, porque as suas importações caras provenientes da União Europeia serão, em parte, substituídas por produtos relativamente mais baratos vindos dos Estados Unidos.
Uma das conclusões de um relatório da Fundação Bertelsmann sobre as negociações UE-Estados Unidos indica, por outro lado, que a parceria transatlântica não aprofundará ainda mais o fosso entre os países do Norte, de economias tradicionalmente fortes, e a ala Sul da UE, despedaçada pela crise. Acontecerá exatamente o contrário.

Grandes perdedores: os BRIC

A parceria entre a União Europeia e os Estados Unidos será o mais importante acordo comercial bilateral da história, não apenas sob o ponto de vista do volume das trocas comerciais mas, sobretudo, por causa da influência que terá sobre o comércio internacional no seu conjunto. O acordo entre os dois principais motores da economia mundial será um claro sinal enviado pelos dois parceiros. [[São suficientemente poderosos para influenciarem e criarem as novas regras dos mercados económicos mundiais do século XXI.]]
Os autores do relatório afirmam que os eventuais benefícios que os signatários do acordo obterão serão contrabalançados por perdas em países terceiros. Com toda a probabilidade, os BRIC, cujas exportações para a União Europeia e os Estados Unidos poderão cair, respetivamente, 10 e 30%, serão os mais atingidos.
Por fim, [sublinha o relatório] convém ser realista naquilo que diz respeito ao calendário. O ambicioso objetivo que fixou a conclusão da parceria transatlântica para daqui a dois anos não se enquadra, provavelmente, na complexidade de um tal acordo. Em breve conheceremos a orientação e a dinâmica das negociações. Os Estados Unidos apostam na necessidade que Bruxelas tem de dar um forte impulso a uma economia europeia que se degrada. As negociações, no entanto, não podem esquecer que esta “janela de oportunidade” de negociar um acordo se fechará no final do mandato do atual presidente norte-americano uma vez que, tanto de um lado como do outro do Atlântico, é verdade que não se ganham eleições com a liberalização do comércio internacional.

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