Notícias Eleições na Catalunha

Como será o dia seguinte?

O escrutínio regional de 25 de novembro deverá dar a maioria aos nacionalistas. Mas o referendo sobre a independência que estes prometem precisa de obter o aval de Madrid e o apoio dos catalães.

Publicado em 22 Novembro 2012 às 16:37

Aproxima-se o dia D: o 25 de novembro. Sejam quais forem os resultados eleitorais, não vai ser o fim do debate sobre o nosso futuro, nem tampouco o da mudança de linha da Catalunha. Será o início de um longo período de redefinição das nossas relações económicas e políticas com Espanha. Apesar do que muitos acreditam agora, e da confiança na pretendida rapidez com que pode realizar-se, espera-nos um processo demorado.

Um dos aspetos mais surpreendentes do que aconteceu na Catalunha nos últimos meses é a rapidez com que uma parte significativa do país passou a considerar a concertação económica como uma coisa desejável, embora difícil, em vez de a rejeitar radicalmente. Tudo bem para quem acreditar em milagres. Mas em economia, como em tudo, não há caminhos reais nem atalhos. Se forem seriamente determinantes como o processo em que nos encontramos, os processos são prolongados e dolorosos, com avanços e recuos e, além disso, de futuro incerto.

À medida que se aproxima o dia D aproxima-se também o dia seguinte, que é realmente o que está em causa nestas eleições. As sondagens adiantam um mapa que, à exceção do possível afundamento do PSC, não é substancialmente diferente do atual. Uma grande maioria de deputados de organizações favoráveis à consulta de autodeterminação (CiU, ERC e ICV), uma marcada minoria contra (PP e Ciutadans) e o PSC no meio, a favor desde que possa ser convocada legalmente. Portanto, um esmagador conjunto favorável a que os cidadãos sejam consultados. E é aí que se articulará a batalha dos próximos anos.

Não somos os primeiros

Comecemos pela sua permissão ou não pelo Estado espanhol. Madrid está numa situação difícil, uma vez que aceitar a convocatória, seja qual for a pergunta, implica aceitar o núcleo do debate que nos tem oposto a Espanha nos últimos anos. Refiro-me ao reconhecimento da soberania catalã como distinta da espanhola, com capacidade para decidir o seu futuro. É este o fulcro da questão. O dia seguinte será o do tiro de partida, não do processo de independência, mas do que deveria levar os cidadãos catalães a ser consultados sobre o que querem fazer e quais devem ser as suas relações económicas e políticas com Espanha.

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Esta é uma questão prévia que, no fragor eleitoral, surge como secundária. E o debate público centra-se em se a Catalunha quer ou não ser independente ou se, no âmbito económico, estaremos ou não na Europa e manteremos ou não o euro. Oxalá fosse esta a discussão! Indicaria que Espanha tinha aceitado reformar radicalmente a sua Constituição; que tinha admitido que a Catalunha é um sujeito político autónomo, com direito a decidir; e que tinha acedido a que fossem os catalães a determinar o seu próprio futuro. Chegar aí não vai ser fácil.

Além disso, não somos os primeiros, nem outras tentativas, em países com uma tradição democrática mais firme que a espanhola, foram tão simples. A experiência canadiana do último referendo (1995) implicou que o seu Tribunal Constitucional ditasse regras rígidas sobre como devia exercer-se o direito à secessão: agora, é ao parlamento federal que compete aprovar a pergunta a formular, devendo também haver uma maioria "suficiente". Apesar de, na Europa, haver o precedente do Montenegro, para o qual a UE exigiu os 55%, no Canadá, o consenso existente é que a percentagem não deveria ser inferior a 66%.

Depois de casa roubada, trancas à porta!

Na Grã-Bretanha, o Partido Nacionalista Escocês apresentou-se às últimas eleições com a promessa de realizar um referendo e, depois de ganhar por maioria absoluta, é isso que fará. Mas, ali, as sondagens indicam uma votação a favor da independência que não chega aos 40%. Em contrapartida, a capacidade de decidir e a necessidade da consulta foi entusiasticamente aprovada. São duas questões distintas.

Aqui, tivemos a oportunidade de reformar a Constituição pela porta das traseiras, com o malogrado Estatuto. Mas os partidos espanhóis fecharam brutalmente essa porta. Agora, uma parte da intelectualidade de Madrid mostra-se preocupada com a possível secessão catalã. Depois da casa roubada, trancas à porta! O processo com vista a uma consulta sobre a autodeterminação da Catalunha começou. Quando é que esta será alcançada e em que condições económicas é outra história. Os tempos de profunda crise que estamos a viver são os mais adequados para mudanças radicais.

Por isso, o 26 de novembro marcará o início de um longo processo, no qual o primeiro assalto será sobre a nossa capacidade para convocar a consulta. Como é esta a questão central, é aí que vão acumular-se as ameaças e todo o tipo de pressões. Mas não se enganem. Não estamos a discutir a independência nem qual seria o nosso futuro na Europa. O que realmente começará a ser debatido nesse dia é o nosso direito a sermos consultados.

Contraponto

Não há lugar para quem não toma partido

O debate de soberania sobre a relação Catalunha-Espanha monopoliza as eleições regionais de 25 de novembro. Mas há eleitores que não querem tomar partido, nomeadamente os "charnegos" (catalães imigrados noutras regiões espanholas), refere a jornalista Julia Otero, ela própria “charnega”, em El Periódico:

Passar por separatista em Madrid e por “espanholista” na Catalunha é uma experiência estimulante que, quando não mata, alimenta a capacidade de sobrevivência. [...] No meio da guerra de bandeiras, há uma infinidade de indivíduos, perplexos e em silêncio, sem outra pátria a não ser as pessoas que amam e sem outra esperança a não ser viverem condignamente. [...] Avizinha-se um período apaixonante para quem tenha profundos sentimentos patrióticos. Estão com sorte. Ignoram o mal de não tomarem posição.

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