“É o início de um longo e penoso caminho”

Numa carta aberta aos seus compatriotas, um académico cipriota apelou a estes últimos que fossem patriotas e que arregaçassem as mangas para resgatar eles próprios o sistema bancário e virar o mais rapidamente possível a página do plano de ajuda negociado a 25 de março em Bruxelas.

Publicado em 25 Março 2013 às 16:31

Sinto, agora mais do que nunca, a necessidade de escrever um pouco para expressar os meus sentimentos, para tentar recuperar a dignidade deste povo, destruída pela imposição de medidas inadmissíveis pelos nossos parceiros da União Europeia (UE).

Hoje, milhares de pessoas acordaram e, em vez de se preocuparem com as suas tarefas domésticas, sentiram um enorme vazio porque o seu país, Chipre, deixou de existir. A nossa ilha desapareceu algumas semanas antes da Páscoa, no início da Quaresma, ao aceitar as exigências da troika (FMI, UE e BCE). Sinto desgosto, vergonha e desilusão. O que é feito do nosso orgulho, da nossa dignidade e da nossa força de oposição?

Na verdade, somos os principais culpados pela situação em que o nosso país se encontra. Somos responsáveis por toda esta confusão, porque entregámos a gestão dos nossos problemas à troika e aos tecnocratas do Eurogrupo. A destruição do sistema bancário vai fazer desaparecer o nosso Estado. As pessoas vão ficar sem emprego e todos os sacrifícios que fizeram para terem uma vida melhor terão sido em vão. As suas reformas terão o mesmo destino do que os depósitos, sendo taxadas pelos nossos “amigos” europeus. Com amigos destes, quem precisa de inimigos?

Alma helénica a ferver

Que futuro têm esses empregados que ficam sem emprego e cujo salário é feito refém pelas dívidas. A maioria receberá agradecimentos sem qualquer indemnização. O que acontecerá aos bancos? São muitas as perguntas sem resposta. Estamos a ficar sem forças, cansados de esperar que outros decidam por nós o nosso futuro.

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Quero por isso, através desta carta, dirigir-me aos meus compatriotas, às pessoas simples, e pedir-lhes que participem neste objetivo de resgatar o nosso sistema bancário para conseguir a saída da troika e redefinir os nossos laços de solidariedade. Chegou a hora de manifestarmos o nosso patriotismo. Devemos mostrar que a alma helénica não se submete facilmente às exigências estrangeiras. Temos a alma a ferver e os punhos fechados.

Já andamos à procura de responsáveis e tenho a certeza que os encontraremos. Nestes tempos cruciais, devemos unir-nos, ajudar o nosso país e erguer-nos contra o inimigo. Como se estivéssemos novamente em guerra, sim. Acreditem que o que estamos atualmente a viver não deixa de ser uma guerra. Os nossos compatriotas que emigraram também nos podem ajudar através de financiamentos. É preciso ajudar o nosso Estado a levantar-se. Porque isto é apenas o início de um longo e penoso caminho. Paciência e coragem.

Comentário

Adeus ao paraíso fiscal de Chipre

“Em resumo”, escreve o Cyprus Mail pouco depois do acordo entre a troika e o Governo de Nicósia sobre o plano de resgate de €10 mil milhões:

A troika potencialmente vaporizou o setor financeiro de Chipre e fragilizou o seu estatuto de paraíso fiscal, um ato deliberado, com o objetivo de controlar as margens mais selvagens dos fluxos de capital para dentro e para fora da Europa. Mas também se destina a escorar a base fiscal dos Estados-membros da UE que estão sob pressão dos seus cidadãos para manterem os seus sistemas de previdência e para colocarem um limite a futuras subidas de impostos […]. O setor financeiro está asfixiado e o estatuto de paraíso financeiro de Chipre ficou rápida e seriamente comprometido. Não por causa da subida de impostos sobre as empresas mas porque, a partir de agora, toda a gente sabe que se se quer esconder dinheiro e pagar menos impostos, Chipre é o último sítio onde fazer tal coisa. Quem quer esconder dinheiro jamais voltará a colocá-lo em Chipre. […] A troika está agora a administrar o choque do sistema mas sem tentar sugerir como poderá ser trilhado um novo caminho de desenvolvimento económico a partir daqui.

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