Algumas capas da imprensa europeia de 4 de Novembro de 2009. © Presseurop

Foi assinado, viremos a página

Após a sua assinatura pelo Presidente checo, é agora certo que o Tratado de Lisboa entrará em vigor no próximo dia 1 de Dezembro. É óbvio que a UE passará a dispor de instrumentos para funcionar melhor mas o texto não servirá de nada se os dirigentes não alterarem o seu comportamento, adverte a imprensa europeia.

Publicado em 4 Novembro 2009
Algumas capas da imprensa europeia de 4 de Novembro de 2009. © Presseurop

Finalmente. Após longos entraves, o Presidente checo, Václav Klaus, assinou – sem uma cerimónia e sem a presença de jornalistas e fotógrafos – o Tratado de Lisboa, em 3 de Novembro, algumas horas depois de o Tribunal Constitucional checo ter rejeitado o último recurso contra o texto. "Não estava de acordo mas assinou", diz oMladá Fronta DNES, que encima a fotografia da assinatura tão esperada pelos outros dirigentes europeus.

À maneira de ponto de honra, Klaus declarou que, com este Tratado, "a República Checa deixa de ser um país soberano". "A caneta é mais sensata do que a boca", contrapôs Martin Komárek, neste diário de Praga. O cronista recorda que todos os Estados-membros abandonaram "uma parte da sua soberania, ao entrarem na União Europeia, onde os seus representantes podem defender os interesses do país".

Bruxelas tem motivos para "brindar", diz oDe Volkskrant. Mas, a partir de agora, adverte o diário holandês, é preciso que os políticos "prometam solenemente deixar de atamancar a construção europeia por muito tempo". "As reformas institucionais elevaram o ‘olhar para o umbigo’ à categoria de passatempo bruxelense levado ao extremo", lamenta o jornal. "Chegou a altura de a Europa […] mostrar aos seus cidadãos que é realmente um guia para o progresso."

Um grande passo em frente

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"Graças às regras estabelecidas pelo Tratado de Lisboa, a Europa tem a oportunidade de dar um grande salto em frente." É o que quer acreditar Jacek Pawlicki, no Gazeta Wyborcza. No entanto, este comentador recorda que, "por mais perfeitos que sejam, os tratados não deixarão nunca de ser letras impressas em papel, se ninguém tiver a vontade para os pôr em prática. O sucesso de Lisboa exigiu muita energia e determinação. Não se pode desperdiçar esse capital".

Contudo, ao fim de oito anos de negociações e referendos, o Tratado de Lisboa não é garante do melhor dos mundos em Bruxelas. "A União Europeia não era ‘sexy’ antes de Lisboa e este documento não vai torná-la mais encantadora nem apagar-lhe as rugas. Pelo contrário", afirma Martin Komárek, no Mladá Fronta DNES. "O debate sobre um tratado denso e em grande parte difícil de ler, pouco contribuiu para dissipar a visão de UE como projecto elitista", recorda o Irish Times. "O choque de Lisboa pode ter ficado para trás mas o desinteresse dos cidadãos vai continuar a ser um desafio decisivo para os dirigentes europeus."

A Europa em pleno "suicídio civilizacional"

O Rzeczpospolita não acredita no entusiasmo dos europeus. Porque de que serve dotarmo-nos de belas instituições, se a Europa está a cometer "um suicídio civilizacional", interroga-se o diário conservador polaco. No momento em que Klaus assinava o Tratado, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos condenava a Itália pela presença de crucifixos nas escolas. Ao afastar a Europa das suas raízes cristãs, o Tribunal de Estrasburgo "inverte o mundo de valores que serviram de base à Comunidade Europeia", considera este diário de Varsóvia. "Já não somos ligados pela igreja de Santa Maria de Cracóvia, pela catedral de Notre-Dame e pela Capela Sistina mas pelo Tratado de Lisboa, pela MTV, pelos papos cheios, pelas férias em Ibiza e pela tolerância para com os homossexuais."

"A elite política europeia mostrou o seu desdém habitual pela vontade do povo", lamenta o The Times. Mas, agora que o Tratado de Lisboa foi ratificado, está na altura de passar para outra coisa. "Por mais exasperante que isso seja, em política, quando os factos mudam, é preciso mudar de estratégia", escreve este diário de Londres. "É isso mesmo que David Cameron (o líder conservador) indicou que iria fazer", ao abandonar a ideia de um referendo sobre o Tratado, se chegar ao poder, na próxima Primavera.

Mas a história ainda não acabou. Salientando que os conservadores britânicos continuam a esperar tirar partido do tratado de adesão da Croácia, para obterem cláusulas de isenção para o seu país, o The *I*rish Times mostra-se preocupado por ver que, "antes mesmo de a tinta ter secado no Tratado, a promessa de que a sua entrada em vigor ponha termo, por uma geração, às disputas constitucionais e institucionais parece não passar de um desejo piedoso. Não é realmente uma previsão animadora".

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