Monti derrubado pelo Cavaliere

A demissão do primeiro-ministro anunciada em 7 de dezembro causa preocupações em Itália e no estrangeiro. Mas, perante a tentativa de Silvio Berlusconi de explorar o mal-estar dos italianos, que outra coisa poderia fazer o Governo tecnocrata que tantos sacrifícios impôs para reerguer o país?

Publicado em 10 Dezembro 2012 às 15:38

Mario Monti demorou um dia a pensar. Em seguida, fez o único gesto coerente com a sua pessoa, a sua vida e a sua forma de governar: garantir o orçamento para 2013 e, depois, apresentar a demissão.

Não apenas não podia aceitar ser acusado por quem lhe deixara nas mãos um país que se encontrava num caos; não apenas não tinha intenção de mendigar, durante semanas, a confiança relativamente a cada medida, como também não desejava partilhar nem mais um metro de caminho com quem decidiu agora que a causa de todos os males reside na moeda única. "Não vou a Bruxelas para dar cobertura àqueles que fazem declarações antieuropeias. Não quero ter nada a ver com eles", disse muito claramente Monti ao Presidente da República, em 8 de dezembro, quando lhe anunciou a sua intenção de se demitir.

Um gesto claro e transparente, que obriga os outros a assumir as suas responsabilidades e que deixa Berlusconi sozinho com as suas agitações e as suas reviravoltas. Ninguém pretende discutir o direito do Cavaliere de voltar a candidatar-se (apesar de, durante um ano, ter afirmado o contrário), mas é intolerável que a principal figura do Governo técnico – que, recorde-se, é também o primeiro-ministro que deixou a Itália à beira do abismo – acorde, uma manhã, e se distancie.

O regresso à emergência e às convulsões

É intolerável que acuse Monti de ser o responsável por todos os problemas de Itália, sem reconhecer o trabalho realizado no espaço de um ano. O governo técnico nasceu da incapacidade de governar e da profunda desconfiança dos italianos em relação ao sistema de partidos, e devia servir para pôr em segurança as contas do Estado e para nos conduzir a novas eleições. O pacto era que cada um assumisse a sua parte de responsabilidade (e de impopularidade), para se tentar evitar a ruína do país, sem ceder ao populismo nem tirar partido do mal-estar social.

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Partindo destas premissas, como podia o chefe do Partido da Liberdade, o partido de Berlusconi, Angelino Alfano, pensar que Monti podia continuar a governar, depois de lhe retirar oficialmente a confiança, na Assembleia Nacional? Só um político da velha escola e habituado a todos os compromissos, teria fingido que não acontecera nada. Monti, pelo contrário, tomou a devida nota e decidiu entregar as chaves do Governo.

Assim, pela primeira vez na história da República, iremos votar no inverno. Talvez mesmo na primeira metade de fevereiro, se a votação do orçamento for antecipada e o parlamento dissolvido na véspera de Natal.

Depois de ter tentado fazer as coisas com ordem durante 12 meses, voltamos à emergência e a ter de enfrentar as convulsões da pior política. Com todos os esforços e sacrifícios que fizemos, não merecíamos isso.

Seria a altura de a Itália se tornar um país normal, previsível e – quem sabe – talvez também aborrecido. Um país que não nos fizesse corar, que pudesse ter assento na Europa e conseguisse fazer-se ouvir. Durante um ano, andámos lá perto.

Reações à direita

Adeus Monti, e boa viagem

“Quero ser sincero e não me quero juntar aos que se afundam na tristeza, que suplicam ao professor Monti para não se ir embora e que lhe vão agradecer o trabalho realizado”, escreve Alessandro Sallusti um dia depois de o chefe de Governo italiano ter anunciado a sua intenção de se demitir. O diretor de Il Giornale, o diário do irmão de Silvio Berlusconi,

quer estar ao lado de milhares de trabalhadores e de empresas que, durante o iluminado Governo de Monti, perderam o emprego e encerraram portas. […] Não vivemos da suposta credibilidade internacional. Queremos restabelecer a democracia suspensa há cerca de um ano pelo ataque relâmpago do Presidente da República. Queremos recuperar a soberania nacional estupidamente delegada aos bancos e à Europa dos alemães. Queremos recuperar a liberdade de decidir, de atuar, de sofrer, se for preciso. Não pelo capricho de uma casta endeusada pelos jornais dos poderosos, mas porque fomos nós que escolhemos. Temos de intervir e votar, aconteça o que acontecer. […] Devíamos ter orgulho de termos tido a coragem de desencadear o fim deste governo de tecnocratas. Não nos trouxe nada, nem poderia trazer. Pelo contrário, sacrificou-nos ainda mais.

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