Extração de gás em Grijpskerk, na província de Groningen (Norte).

O gás não é um presente

A exploração da jazida no norte dá milhares de milhões de euros ao Estado holandês. Mas os sismos são cada vez mais frequentes e a ausência de investimentos de longo prazo estão a alimentar o debate sobre o seu interesse.

Publicado em 25 Fevereiro 2013 às 12:18
Extração de gás em Grijpskerk, na província de Groningen (Norte).

Primeiro, o gato salta da cama – os animais de estimação detectam a aproximação dos sismos. Depois começam a ouvir-se roncos fundos, que terminam com um estalo que faz vibrar as janelas e põe as paredes a tremer. É mais uma noite de insónia em todas as aldeias das comunas de Loppersum e Slochteren, às vezes chega mesmo aos subúrbios da cidade de Groningen.
Paredes que racham, portas que empenam, uma telha que cai: danos irritantes, mas que ainda são remediáveis. O pior é o medo. Será que isto vai parar? É pouco provável, a acreditar no relatório da entidade reguladora das atividades de exploração do subsolo, a Staatstoezicht op de Mijnen, que Henk Kamp, ministro da Economia, tornou público no final do mês passado. Nos últimos anos, os tremores de terra causados pela extração de gás no campo de Groningen têm aumentado significativamente, tanto em frequência como em intensidade. Segundo as previsões, o subsolo deverá continuar a tremer durante mais 50 anos.

A maior jazida do mundo

Henk Kamp fez o que o consórcio holandês de petróleos – Nederlandse Aardolie Maatschappij (NAM) – deveria ter feito há anos: reconhecer que o subsolo da província de Groningen está a ceder devido à extração de gás, situação que é acompanhada por pequenos sismos.

Segundo Wobbes Reint, da aldeia de Huizinge, que integra a fundação de proteção de antigas igrejas da região, a Oude Groninger Kerken, "Kamp fala de medidas preventivas. Mas não sei o que pode fazer. Esta região é culturalmente uma das mais antigas da Europa. Como vai proteger as casas e outros edifícios, igrejas com vários séculos? Devia ter tomado medidas mais cedo. Porque é que o impulso teve que partir de uma iniciativa cidadã, do movimento de defesa do subsolo de Groningen – o Groninger Bodem Beweging? Porque é que as autoridades não trataram mais cedo de proteger a população?".

Campos nus cobertos de neve: a lama arada aguarda a primavera. Nas terras altas, a extração de gás é pouco percetível. Não se sente, não se vê. O primeiro furo do "depósito de Slochteren" foi aberto em 22 julho de 1959, nas terras do agricultor Boon, perto da aldeia de Kolham. Mas a euforia só se deu alguns anos mais tarde, quando se tornou evidente que este campo de gás era a maior reserva particular em todo o mundo. No entanto, a região não enriqueceu com isso. Segundo a Lei de Mineração de 1810, os minerais extraídos do subsolo não revertem para o dono da terra, mas para o Estado. Isso às vezes causa algum mal-estar.

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Uma segurança social generosa

Não é isso que é grave, considera Herman de Jong, professor de História Económica da Universidade de Groningen: "Nem quero imaginar o que teria acontecido se a lei mineira não existisse. Teríamos uma série de habitantes que teriam enriquecido e que teriam as ideias mais extravagantes; além disso, o impacto sobre o emprego seria de curta duração. Assim, foi possível pôr de pé um sistema de segurança social generoso e fazer investimentos significativos em infraestruturas, nomeadamente as obras do Plano Delta".
"Devíamos era orientar a economia por antecipação em relação à cessação das receitas do gás, dentro de trinta anos. A Holanda nunca pensou a longo prazo, persuadida de que ia passar para a energia nuclear. O campo de gás há anos que vem sendo usado para tapar buracos orçamentais. A Noruega adotou uma abordagem mais sensata, investindo as receitas do petróleo e do gás num fundo público: os juros gerados por ele servem para financiar os gastos públicos em educação e infraestruturas".
A Shell e a Esso, parceiros da NAM, recebem somas substanciais da extração de gás em Groningen, recorda Herman de Jong. "Mas o Estado também beneficia. Um contrato engenhoso permitiu-lhe cobrar impostos elevados, desde o primeiro momento." O campo de Groningen já fez entrar mais de 200 mil milhões de euros para os cofres do Estado. Dentro de vinte anos, a Holanda terá usufruído de 75 anos deste sistema.

Groningen, plataforma energética

Os habitantes de Groningen começam a perguntar-se o que ganharam, nos últimos 50 anos, com o gás que tinham debaixo dos pés, para lá do lento afundamento do solo. O Partij voor het Noorden [partido que defende os interesses dos habitantes das províncias do norte dos Países Baixos: Groningen, Drente e Frísia] exige que um quarto da receita do gás natural seja investido na região.
Jan Willem Velthuijsen, professor especializado em Energia e Fluxos Financeiros Associados na Universidade de Groningen, também considera que a Holanda deve investir na província de Groningen. Não por o gás ser ali extraído, mas porque o Norte desempenha um papel importante no fornecimento de energia.
Para ele, "há boas razões para investir na província de Groningen como plataforma energética. A interface que estamos a construir é fundamental para o abastecimento energético da Europa. Estamos ligados ao mercado alemão, que privilegia o desenvolvimento sustentável, o que dá vantagens às centrais a gás. São baratas e ecologicamente limpas. O cabo submarino que traz a energia hidroelétrica da Noruega é conectado aqui, tal como o gás russo. Temos uma infraestrutura fantástica, os gasodutos e depósitos de gás são perfeitos, não só para bombar o gás, mas também para o armazenar. Podemos armazenar gás russo barato, distribuindo-o quando os preços subirem. A torneira pode ser aberta ou fechada como quisermos. É muito mais fácil fazê-lo aqui do que em qualquer outro lugar."

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