Minarete da mesquita Mahmud, em Zurique (AFP)

Populismo ataca os minaretes

A proibição da construção de minaretes, aprovada pelos eleitores suíços, em 29 de Novembro, é um ataque directo contra os muçulmanos que vivem no país. E é também mais um indício de um problema social e político que afecta todos os países do continente, considera a imprensa europeia.

Publicado em 30 Novembro 2009 às 16:52
Minarete da mesquita Mahmud, em Zurique (AFP)

Contra todas as expectativas e contra a opinião dos principais partidos políticos, de responsáveis religiosos e de meios económicos, 75% dos suíços votaram pela proibição dos minaretes no seu país. A questão, levantada pela União Democrática do Centro (UDC), foi colocada aos eleitores, porque este partido populista recolheu o número de assinaturas suficiente (mais de 100 mil) para organizar um referendo de iniciativa popular.

"Os muçulmanos da Suíça não merecem a injustiça deste voto de sanção, inspirado pelo medo, por fantasmas e pela ignorância", escreve o Le Temps, que especifica que os eleitores votaram contra os minaretes e não contra as mesquitas. "Nem todos os votantes são contra o Islão mas contra aquilo que interpretam como uma representação excessiva do Islão na vida nacional." No entender do politólogo Michael Hermann, os eleitores protestaram sobretudo contra as migrações e a globalização, "entendidas como um perigo para a identidade tradicional suíça". As causas desta forma de "racismo resultante de um orgulho nacional ferido" seriam, segundo o Tageszeitung, o facto de estar a ser posto em causa o segredo bancário, a falência da Swissair, o colapso de outros símbolos da identidade suíça e também "a maneira vergonhosa" como Kadhafi tratou o país no caso dos reféns suíços na Líbia.

A visibilidade problemática dos muçulmanos na Europa

"O que importa são as consequências indirectas do referendo e o seu impacto sobre o clima social na Suíça", sublinha o Neue Zürcher Zeitung, que considera o referendo como uma manobra de "diversão". "Trata-se de um não aos islamitas dispostos a recorrer à violência." "As convicções dos muçulmanos, a imagem que têm da mulher e o seu fanatismo realmente existente suscitaram uma contra-reacção e seria inevitável não levar em consideração esse mal-estar perante o que é diferente", observa este diário de língua alemã. E esse mal-estar não é exclusivo da Suíça. "Todos os países europeus têm símbolos ou questões a apontar aos muçulmanos", recorda Tariq Ramadanno Guardian. "Em França, é o lenço ou a burqa; na Alemanha, as mesquitas; na Grã-Bretanha, a violência; caricaturas na Dinamarca; a homossexualidade nos Países Baixos e assim por diante."

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Numa altura em que "os países e os cidadãos europeus atravessam uma crise de identidade real e profunda, a nova visibilidade dos muçulmanos é problemática e assustadora", observa este intelectual e universitário suíço."O resultado deste referendo representa uma grande surpresa", escreve o Rzeczpospolita, "porque o medo e a aversão em relação ao Islão circulam fora da corrente maioritária." Na verdade, adianta este diário de Varsóvia, "os suíços sublinharam que a integração dos muçulmanos é o principal problema social e civilizacional da Europa", mas "só foram capazes de lançar este sinal através de um referendo, cujo resultado é uma proibição semelhante às existentes nos países muçulmanos intolerantes".

Um neopopulismo transeuropeu

Até agora, acrescenta o Libération, "nenhum Governo do continente encontrou uma solução satisfatória para as suas relações com a religião muçulmana, que, no entanto, é parte integrante da paisagem europeia". Porque a xenofobia e o ódio aos imigrantes proporcionam "às formações populistas que prosperam em toda a Europa uma base de comércio eleitoral".

"Trata-se da quarta vaga nacional populista depois da do pós-guerra, da dos anos 1960 que foi limitada, da das extremas-direitas dos anos 1980, como a Frente Nacional em França ou o Vlaams Blok na Flandres", refere a análise de Jean-Yves Camus, especialista em populismos europeus. "Recusando ser comparadas com a extrema-direita e, ainda menos com o neofascismo, essas formações defendem um ultraliberalismo 'radical' – menos impostos, menos regras, menos ajudas sociais – e um programa me fortemente anti-muçulmano, em nome da luta contra o multiculturalismo."

O Partido da Liberdade de Geert Wilders, na Holanda, e o Partido do Povo Dinamarquês já anunciaram o desejo de organizar referendos semelhantes. E, em Itália, Roberto Castelli, vice-ministro das Infra-estruturas e dos Transportes, pertencente à Liga do Norte, qualificou o referendo suíço de "mensagem de civilização" e propôs a inclusão da cruz na bandeira nacional, para afirmar a identidade cristã de Itália. Para o La Repubblica, esse tipo de iniciativa iria relançar "a ideia de que a liberdade religiosa poderia ser tema de consulta popular. Como se os direitos fundamentais pudessem ser submetidos ao julgamento aleatório da maioria de uma determinada época".

Perante este fenómeno, afirma o Libération, "só existe uma estratégia possível": "Favorecer, partindo das bases laicas estabelecidas há muito tempo, a emergência de um Islão europeu, fiel à sua fé e familiarizado com a cultura dos direitos do homem. A Suiça acaba de lhe voltar as costas, com grande vantagem para os integristas de todos os quadrantes".

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