Um ícone europeu chamado baleia

Presentemente em discussão em Agadir, a proibição da caça à baleia divide a comunidade internacional. A maior parte dos países europeus deseja proteger este cetáceo, em nome de uma concepção quase religiosa da ecologia, considera o Die Welt.

Publicado em 22 Junho 2010 às 16:39

No grande circo das conferências internacionais, as reuniões da Comissão Baleeira Internacional (CBI) sempre passaram por uma farsa. Na verdade, tiveram ainda menos resultados do que as cimeiras sobre o clima ou as negociações de paz para o Médio Oriente. Ano após ano, os membros da CBI reuniram-se nos mais belos locais do planeta para dizerem uns aos outros que nada têm a dizer. Este ano, porém, e pela primeira vez desde a proibição global da pesca da baleia, em 1986, poderá estar à vista um compromisso. O presidente da Comissão, o chileno Christian Maquieira, propôs que os poucos países que ainda praticam esta pesca fossem autorizados a limitar-se a uma quota de 1400 presas anuais, nos próximos 10 anos. Depois disso, a caça à baleia acabaria.

Duas visões culturais irreconciliáveis

Após séculos de caça desenfreada, a CBI foi criada para organizar a exploração sustentável deste mamífero marinho. No entanto, em 1986, a CBI decidiu proibir pura e simplesmente a caça à baleia, depois de a maior parte dos países membros, como a Alemanha e os Estados Unidos da América, já ter renunciado a ela. O progresso técnico permitia então que deixassem de ser utilizadas as matérias-primas provenientes deste mamífero. Para os outros países, tal decisão representou uma verdadeira bofetada. A instituição a que tinham aderido para poderem pescar segundo as regras dera uma volta de 180 graus e transformara-se num organismo de protecção. Recusando submeter-se à vontade da maioria, esses países decidiram ignorar a proibição da pesca da baleia.

Há várias décadas que duas visões culturais inconciliáveis se defrontam numa guerra de posições. Uns continuam a considerar as baleias como um recurso, idêntico ao arenque e ao camarão, enquanto, para os outros, este mamífero obteve o estatuto de animal sagrado. Na Europa e na América do Norte, as pessoas afixam posters de baleias nos seus quartos, escutam o canto das baleias e participam em viagens de observação, organizadas por centenas de agências de viagens de todo o mundo. Para muitas delas, as baleias passaram a ser os anjos da nova religião secular ecologista, seres superiores, mensageiros da Mãe Natureza. Os zoólogos são mais comedidos. As baleias são seres inteligentes mas não mais do que as raposas ou os javalis, que são caçados aos milhões em toda a Europa.

Nada a objetar à caça desta espécie

Ao longo dos anos, a composição da Comissão tornou-se cada vez mais estranha. O Japão não hesita em recorrer à diplomacia do livro de cheques e apoia a adesão à CBI de pequenas ilhas favoráveis à sua causa. Por seu turno, os opositores à caça à baleia também reforçaram as suas fileiras com países que não têm acesso ao mar mas que são partidários da proibição da pesca à baleia. É difícil explicar aos defensores da exploração sustentável qual o papel de países como a Suíça, o Luxemburgo, a Áustria e a Hungria numa comissão internacional que se ocupa das baleias.

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Desde que os baleeiros ainda em actividade capturam apenas cerca de 2000 presas anuais, a população destes mamíferos está novamente a crescer: demasiado lentamente para algumas espécies como a baleia do Atlântico Norte, da qual restam apenas 350 indivíduos; muito mais depressa para outras, como a baleia de Minke, que beneficia do desaparecimento das espécies maiores e conta com 500 mil indivíduos suplementares. Do ponto de vista da protecção das espécies, não há nada a objetar à caça desta última espécie. Entretanto, os defensores dos direitos dos animais fariam melhor em denunciar os arpões explosivos que nem sempre matam de imediato os animais e os deixam a sofrer inutilmente durante muito tempo. Aliás, isto é válido também para as raposas e os javalis.

Negociações

Os Vinte e Sete em "ordem dispersa"

A proposta que a Comissão Baleeira Internacional (CBI) apresenta à votação em Agadir é "tão complicada que poucos membros da UE sabem exactamente o que está a ser decidido", constata o Süddeutsche Zeitung. A Alemanha, que participou na redacção do documento, levou quatro semanas a formular uma opinião, negativa. Mas esta falta de clareza não é a única razão para a "falta de firmeza da posição da UE", que consiste em "não concordar com o documento na sua forma actual", explica o diário de Munique. Os suecos apoiam o recomeço da caça, para algumas baleias, com vista a apaziguar o conflito. Os dinamarqueses apoiam-no também, por proximidade com os noruegueses e a Gronelândia. Os britânicos, os holandeses, os belgas e os alemães "preferiam que as baleias fossem intocáveis, por princípio", constata o SZ. Único ponto de acordo: a oposição à reivindicação da Islândia, país candidato à adesão, de autorizar o comércio de produtos derivados da baleia. Mas nem esta questão suscita o mesmo empenho de todos. "Quatro Estados-membros da UE não enviaram negociadores a Agadir, e dois esqueceram-se pagar as quotas para o CBI", conclui o SZ.

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