Boïko Borisov durante a campnha para as legislativas, em Julho de 2009, em Sofia (AFP)

Uma mancha resistente à limpeza

Acabado de eleger em Julho passado, o primeiro-ministro Boiko Borissov foi confrontado com um relatório demolidor sobre a corrupção no seu país. Aquele que se orgulha de ser o “Impoluto” de Sófia conseguirá vencer o que parece ser uma praga endémica ou cederá à tentação da censura?

Publicado em 23 Novembro 2009 às 18:23
Boïko Borisov durante a campnha para as legislativas, em Julho de 2009, em Sofia (AFP)

No início, parecia ser um acerto de contas políticas entre rivais. O conservador Boiko Borissov, novo primeiro-ministro búlgaro, acusou o seu antecessor, o socialista Serguei Stanichev, de ter feito desaparecer, em 2008, o primeiro relatório secreto da DANS, o departamento estatal da Segurança Nacional, que queria manter secreto, a fim de poder informar a tempo os membros do seu Governo que eram ali acusados de corrupção. Entretanto, a justiça intentou uma acção contra Stanichev e a pessoa – ainda anónima – que divulgou esse relatório na Internet.O relatório mais não faz do que confirmar o que os meios de Comunicação Social e os governos ocidentais há muito tempo sabiam e que Sófia se esforçava por minimizar: os fundos da União Europeia são sistematicamente desviados, com o aval dos mais altos responsáveis políticos do país, onde reina uma corrupção sem limites e um profundo conluio entre a classe política e as redes criminosas.

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Foi, aliás, o próprio Stanichev que, em 2008, lançou a DANS, no seguimento de escândalos que rebentaram no Ministério do Interior, onde as relações entre numerosos funcionários e a máfia vieram à luz do dia, manchando a reputação da Bulgária no mundo inteiro e provocando uma redução dos subsídios da UE.

Desvio de fundos da UE

A opinião pública búlgara parece perplexa: a DANS contenta-se em revelar uma imagem crua da realidade búlgara, ou – como afirma Borissov – desempenha o papel de “polícia política” pessoal do seu antecessor? Mas a irritação do primeiro-ministro pode ter outros motivos. Porque depois disso, o relatório de segurança do primeiro semestre de 2009 foi igualmente tornado público. E uma vez mais, o segredo não funcionou – embora muitos jornalistas tivessem de atestar por escrito que não o publicariam.

O conteúdo vale o seu peso em ouro: os fundos da UE, essencialmente no sector agrícola, são desviados graças “à tendência para a corrupção” manifestada pelos funcionários do fundo soberano búlgaro, que não está sujeito a nenhum controlo. A fim de obter os almejados benefícios da UE, terão, nomeadamente, destruído e falsificado documentos, ou apresentado títulos de propriedade pertencentes a falecidos.

Um maná financeiro de que nem só os búlgaros tiram proveito. Gregos e turcos compraram ou alugaram também enormes terrenos por intermédio de testas-de-ferro búlgaros, porque os apoios da UE são calculados com base na superfície. No sector da saúde, médicos e hospitais criavam doentes fictícios e desviavam os apoios para outros investimentos. Os laboratórios farmacêuticos privados aproveitam a sua posição de monopólio para impor preços mais elevados, interrompendo o fornecimento de medicamentos vitais.

Antenas do Hezbollah em território búlgaro

Os infractores recorrem a todas as manhas. Os proprietários que fizeram desvios de fundos ou que levaram as empresas à ruína por má gestão transferem a propriedade de companhias crivadas de dívidas para pobres, geralmente ciganos. Assim, escapam a qualquer responsabilidade e à eventual apreensão dos seus capitais privados. Compreende-se facilmente que o branqueamento de capitais seja também corrente num país com leis tão permissivas, onde a justiça é ostracizada e o aparelho de Estado está infiltrado de mafiosos.

O crime organizado, esse, não foi beliscado e as extorsões, raptos e ameaças há anos que fazem parte do quotidiano búlgaro. Outro assunto inquietante: constatam-se os primeiros sinais de terrorismo transfronteiriço. Organizações xiitas, como o libanês Hezbollah, já teriam organizado unidades em território búlgaro.

Até ao final do ano, Borissov tem de ter extirpado este vespeiro se quiser dar do seu Governo uma imagem menos negativa que a do seu antecessor. Porque mesmo a população búlgara começa a perder paciência, perante a passividade dos seus políticos. Se o próximo relatório não for mais positivo, as relações com a UE correm o risco de arrefecer bastante. Bruxelas interrogar-se-á uma vez mais quais os critérios que fizeram com que os búlgaros, que disputam à Roménia o título de Estado mais corrupto da União, fossem aceites na UE, em 2007.

De um ponto de vista realista, o primeiro-ministro só pode optar entre o encerramento anunciado daquele organismo estatal embaraçoso e o seu reenquadramento político. A menos que obtenha a certeza absoluta de que os próximos relatórios ficarão firmemente fechados nas gavetas da instituição.

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