A Bélgica morreu. Viva a Bélgica!

Numa altura em que o país se encontra há 485 dias sem governo, o provável próximo primeiro-ministro, Elio di Rupo, e os seus parceiros flamengos e francófonos apresentaram, em 11 de outubro, um acordo global sobre a reforma do Estado. Este entendimento, inesperado para alguns, estabiliza o país e abre caminho para uma saída da crise.

Publicado em 12 Outubro 2011 às 14:27

Depois da cisão do círculo eleitoral bilingue de Bruxelles-Hal-Vilvorde, que desbloqueou as negociações, os principais pontos do acordo consistem em mais federalismo, com reforço da autonomia das regiões (a Flandres, que representa mais de 50% dos recursos federais, a Valónia e Bruxelas-capital) em matéria fiscal, de segurança social, de emprego e do Código da Estrada. A duração da legislatura federal passará de 4 para 5 anos, a fim de evitar que o país esteja em campanha eleitoral quase permanente.

"Mesdames, messieurs, nous avons un accord!" [minhas senhoras e meus senhores, temos um acordo], diz o título do De Morgen, por uma vez em francês. Este diário flamengo cita, assim, as palavras com as quais Di Rupo anunciou o texto negociado com os prováveis membros da próxima coligação governamental. "Finalmente", escreve o chefe da secção de política do jornal, Steven Samyn:

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"Rodeado pelos 8 negociadores, o primeiro-ministro indigitado declarou: ‘Temos um acordo para fazer evoluir o país e para o estabilizar.’ Não poderia ter usado palavras mais apropriadas. A sexta reforma do Estado belga é uma evolução e não uma revolução. Uma grande reforma que transfere o grosso do peso do Estado belga para os estados federados." – De Morgen

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"Finalmente!", diz também o La Libre Belgique. Neste diário de Bruxelas, o cronista Francis Van de Woestyne tira o chapéu ao "principal artesão desta negociação, Elio Di Rupo":

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"É fácil imaginar a energia, a paciência, a atenção, a criatividade de que teve de dar mostras para chegar aqui. Porque, depois de se ter esforçado duramente por encontrar uma solução positiva para a crise com [o líder nacionalista flamengo] Bart De Wever […], Elio Di Rupo teve que lidar com parceiros ora frágeis, ora imprevisíveis, ora divididos. É preciso reconhecer que, num país onde as forças centrífugas e egoístas fazem medo, era a única pessoa a poder realizar esta síntese política entre o Norte e o Sul, entre a esquerda e a direita." – La Libre Belgique

Para Béatrice Delvaux, editorialista principal do Soir, o grande vencedor do dia, antes de Di Rupo, é a Bélgica:

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"É preciso recordar até que ponto já ninguém acreditava. É preciso recordar o número de vezes que se pensou que estava tudo perdido, para a Bélgica – isto para se avaliar a importância do momento. A Bélgica! É, aparentemente, o grande vencedor do dia, pelo simples facto de continuar ali, de pé, disposta a seguir o seu caminho. A Bélgica, sim, mas não mais a mesma: os seus motores passaram a ser regionais e comunitários, e a sua sobrevivência enquanto tal é mais do que problemática. Reconheçamos que essa velha entidade, que cortejou a morte, conseguiu sobreviver a uma mutação miraculosa e engenhosa, porque é capaz de, através de equilíbrios, sábia e pacientemente criados, dar a uns e a outros elementos de satisfação. […] Mas não devemos deixar-nos enganar: a reforma do Estado enterra uma determinada Bélgica federal. E, mesmo que não o deseje, muita gente está convencida de que esta não é a última cena do filme. É por isso que a grande vencedora do dia é a única que não aparece na fotografia de família. Ao longo desta prodigiosa negociação, Bart De Weer, líder nacionalista, terá acabado por convencer toda a gente do seu único objetivo: a Bélgica não faz (muito) sentido." – Le Soir

Por último, no De Standaard, o editorialista Guy Tegenbos considera "engraçado" o nome dado à reforma, "acordo laço borboleta", o que, no entanto, nada tem a ver com o conteúdo do acordo:

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"O acordo laço borboleta que, ostentando o seu laço borboleta, Di Rupo apresentou ontem é uma reforma do Estado tipicamente belga. Esta sexta reforma inclui, tal como a quinta, acordos de muitas páginas. Mas não tem uma linha. A reforma não corresponde a uma visão comum: nasceu da rutura dessas duas visões que se opõem praticamente em relação a todos os pontos. Foram necessários grandes esforços para encontrar um conjunto de elementos que, por acaso, agradasse aos dois blocos. E, depois, coseram tudo isso, como se fosse uma manta de retalhos. […] Di Rupo foi bem sucedido na sua missão impossível mas o resultado não foi uma nova Bélgica admirável e excitante. É uma Bélgica 6.0. A preparação para a 7.0. […] É uma trégua que dá às duas partes [os francófonos e os flamengos] um pouco daquilo que cada uma dessas partes queria, um pouco daquilo com que cada uma delas poderá dar-se por satisfeita durante pouco tempo." – De Standaard

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