Faculdade de medicina dentária da Universidade Semmelweis, em Budapeste.

Europa de leste atrai estudantes de medicina

As propinas mais baratas, o maior acesso à universidade e as aulas lecionadas em inglês estão a convencer um número cada vez mais elevado de estudantes estrangeiros a inscrever-se em escolas de medicina da Europa de leste.

Publicado em 20 Agosto 2013 às 11:39
Faculdade de medicina dentária da Universidade Semmelweis, em Budapeste.

Quando um estudante do primeiro ano de medicina, originário dos Estados Unidos, deixou o seu skate na entrada da sala de aulas, construída no século XIX, a professora Andrea Dorottya Szekely pegou imediatamente nele e repreendeu o jovem proprietário.

“As coisas funcionam de forma diferente aqui,” disse Szekely em relação à Universidade Semmelweis, uma instituição em Budapeste com 244 anos, especializada nas ciências da saúde e médicas. Espera-se que os estudantes se mantenham silenciosos e nos seus lugares até tocar e o professor entrar, por exemplo.

Apesar de por vezes terem de superar as diferenças culturais, o número de estudantes estrangeiros a seguir estudos de medicina e farmacêuticos na Europa de leste não para de aumentar. Embora acolha maioritariamente alunos da Europa ocidental, a região parece estar a ser alvo de um crescente interesse.

Universidades com mais notoriedade

O número de estudantes universitários estrangeiros na Hungria subiu 21% entre 2008 e 2011 – passando de 13 601 para 16 465 – segundo o instituto de estatísticas da UNESCO, que define um estudante universitário estrangeiro como alguém que não concluiu o ensino secundário no país. Na Polónia, o número de alunos estrangeiros aumentou 80% entre 2005 e 2010, último ano com dados disponíveis. O número de estudantes estrangeiros na República Checa duplicou entre 2005 e 2011, enquanto na Eslováquia quintuplicou, de acordo com a UNESCO.

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A maioria desses estudantes escolhem a região para estudar medicina ou outras disciplinas relacionadas com a saúde. Em 2010, as áreas “saúde e bem-estar” foram responsáveis por 30% das inscrições de alunos estrangeiros, segundo um estudo levado a cabo pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Na Eslováquia, 45% dos estudantes estrangeiros estavam inscritos em cursos relacionados com a saúde e 15% na Polónia, de acordo com a OCDE. Em comparação, em países como a Alemanha, a Suécia e o Canadá, onde o nível competição para obter um lugar numa escola de medicina é extremamente elevado, 6 a 9% dos alunos são estrangeiros, segundo o mesmo estudo.

Na Hungria, onde quatro universidades fornecem formação em ciências médicas e odontológicas em inglês, 42% dos alunos estudam em áreas relacionadas com a saúde.

São vários os motivos por trás desta reviravolta. Além de a notoriedade das universidades da Europa de leste ter vindo a crescer, as propinas são mais baratas do que as das instituições universitárias ocidentais e é bem mais fácil conseguir ser admitido.

Fluidez das fronteiras europeias

Na Universidade Semmelweis, os estudantes estrangeiros de medicina pagam menos de 20 mil dólares [15 mil euros] por ano em propinas, enquanto os estudantes da União Europeia obtêm muitas vezes bolsas ou empréstimos estudantis. Na Universidade Charles, situada em Praga, também existem programas de medicina lecionados em inglês e as propinas anuais variam entre os 14 100 euros e os 18 600 euros. Os programas de medicina dentária costumam ser ligeiramente mais caros, devido ao custo de materiais necessários para a formação (por exemplo, moldes e materiais para a restauração dentária).

Para um estudante europeu, que tem acesso a escolas de medicina no seu próprio país sem ter quase nenhum custo, estas taxas podem parecer elevadas. Mas estes custos são relativamente modestos para um estudante dos Estados Unidos, onde até mesmo as propinas estatais das universidades públicas podem superar os 30 mil dólares [22,5 mil euros] por ano.

[[Médicos, dentistas e farmacêuticos com licenciaturas tiradas em universidades da Europa de leste podem praticar em qualquer parte da União Europeia]]. Os estudantes de medicina de Semmelweis estagiam normalmente em hospitais europeus, muitas vezes no país onde esperam vir a trabalhar mais tarde.

Sarah Moslehi, que se mudou de Gotemburgo, Suécia, para Budapeste para estudar medicina, compara a fluidez das fronteiras europeias com as dos Estados Unidos. “Basicamente, a Europa passou a ser uma maior versão dos Estados Unidos”, disse. “É possível estudar num país e mudar-se para outro a qualquer altura.”

Aulas de alemão para atrair estudantes

Para atrair estudantes estrangeiros, a Universidade Semmelweis começou a dar aulas em alemão no início dos anos de 1980. O inglês foi incluído mais tarde na mesma década, após a abertura política da Europa de leste. Para o novo ano académico que começará em setembro, a universidade admitiu 380 alunos estrangeiros nos seus cursos de ciências médicas, odontológicas e farmacêuticas lecionadas em inglês. Dos 12 719 alunos inscritos, 1910 frequentam cursos em inglês e 911 em alemão.

A Semmelweis beneficia claramente do facto de ter um campus multicultural, de acordo com estudantes e professores, mas os estudantes estrangeiros são uma verdadeira mais-valia financeira, por terem custos que pouco ou nada se aplicam aos húngaros.

A Universidade de Charles, em Praga, tem uma forte reputação para os estudantes de medicina que tencionam estudar na Europa de leste, e a Universidade de Medicina e de Farmácia de Iuliu Hatieganu, em Cluj-Napoca, Roménia, está também a atrair cada vez mais aspirantes a médicos, farmacêuticos e dentistas.

Processo de candidatura competitivo

Os programas da Semmelweis atraem estudantes da Alemanha, da Noruega e da Suécia, onde o processo de candidatura às escolas de medicina é extremamente competitivo pelo facto das admissões serem limitadas, assim como dos países do Médio Oriente, como o Irão e Israel.

Uma das principais vantagens de estudar na Hungria é a abordagem da educação médica própria do Velho Mundo, dizem os estudantes. Além de se concentrarem fortemente na etiqueta – os estudantes são obrigados a usar fatos quando realizam exames, por exemplo –, na memorização por repetição, os alunos de medicina entram em contacto com os pacientes numa fase mais precoce dos seus estudos do que os seus outros colegas e têm mais experiência prática em disciplinas como patologia e anatomia.

“Ensinamos de forma diferente”, disse Szekely, professora húngara que leciona aulas em inglês e em alemão.

Mas embora o caminho que leva à licenciatura seja diferente, o resultado é o mesmo, acrescenta. “Só há um objetivo, o de ser médico”, conclui.

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