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Pequim compra o silêncio da Europa

Duramente flagelado pela crise económica, Portugal – como a Grécia e a França – acolheu com entusiasmo os investimentos chineses. A inevitável parceria com Pequim tem um preço: o fim do sonho ocidental de dar lições de democracia à China.

Publicado em 8 Novembro 2010 às 17:12

Foi uma manhã de domingo muito especial. O pequeno mundo dos gestores das grandes empresas portuguesas – EDP, BCP, PT – acorreu em peso ao Palácio das Necessidades, onde o Presidente da China, Hu Jintao, e o primeiro-ministro português, José Sócrates, não escondiam a sua satisfação pelos acordos assinados entre empresas dos dois países [ver abaixo].

Ninguém falou publicamente em compra de dívida soberana, mas a diplomacia económica portuguesa podia sorrir. A China é uma potência emergente incontornável e um país pequeno como Portugal tem tudo a ganhar em tê-la como parceira. Mas há, evidentemente, um outro lado para os negócios da China.

Ausência de uma resposta comum à ascensão da China

Há a questão da crescente influência chinesa no mundo e há a questão da democracia e dos direitos humanos. Como lidar com essas duas vertentes da ascensão do gigante chinês é o problema. Mas não existe uma resposta comum.

A visita de Hu Jintao a Lisboa mostrou que Portugal está na rota dos planos de expansão global da China, porque Portugal está na União Europeia. É absurdo ter medo de ter Pequim como um parceiro económico – afinal de contas, parecem tratar-nos melhor do que os mercados dos países democráticos.

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Europa arrisca-se a não ser vista com um espaço de liberdade

Mas é preciso ter presente quais as consequências da aproximação crescente entre a Europa e a China. E essa aproximação acontece ao mesmo tempo que a Europa e os Estados Unidos se afastam. É o equilíbrio geoestratégico do planeta que está a mudar, numa guerra travada com euros, yuans e dólares.

Nessa guerra afogaram-se os sonhos ocidentais de dar lições de democracia a Pequim. O maior de todos os riscos dos negócios da China é esse. E os nossos esquecimentos de conveniência ameaçam o mais intangível e importante capital da Europa, que é ser vista no mundo como um espaço de liberdade.

Números

Contratos de centenas de milhões de euros

Os contratos e os acordos comerciais bilaterais assinados pelo Presidente chinês, Hu Jintao, e o primeiro-ministro português, José Sócrates, no dia 7 de outubro em Lisboa, ascendem a um milhão de dólares (718 milhões de euros), anuncia a imprensa chinesa, citada pelo Diário de Notícias. Este elucida que Portugal e a China assinaram quatro acordos de cooperação e nove acordos comerciais, implicando empresas como a PT, a EDP, a Huawei, o Millennium BCP e o ICBC. A questão da compra por Pequim da dívida portuguesa foi cuidadosamente omitida nos discursos oficiais, mas "foi discutida nos encontros que precederam a cerimónia de assinatura dos protocolos", acrescenta o diário lisboeta. Segundo o mesmo jornal, além disso "Portugal já colocou no mercado 93% das obrigações previstas para este ano". O seu homólogoi acrescenta que os acordos com a China são apenas o primeiro passo para a recuperação financeira de Portugal, que pretende igualmente encetar relações com outros mercados em ascensão, como a Indonésia e Singapura.

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