O centro de logística da Amazon em Bad Hersfeld, no centro da Alemanha.

Somos os chineses da Europa

A Amazon vai abrir três grandes centros de logística na Polónia. Uma boa notícia? Na verdade não, porque os empregos serão precários e mal pagos. E o país está errado se pensa que vai tornar-se competitivo por esta via.

Publicado em 23 Outubro 2013 às 11:14
O centro de logística da Amazon em Bad Hersfeld, no centro da Alemanha.

Para uma maioria de dirigentes de grandes empresas internacionais, a Polónia é, antes de mais, um país com mão-de-obra barata, e não um modelo de inovação. Esta é a perceção da maioria dos responsáveis das multinacionais que responderam a um estudo recente sobre o que a Polónia oferece aos investidores estrangeiros.

O milionário americano e fundador da Amazon, Jeff Bezos, numa visita recente à Polónia partilha desta opinião. Para o gigante de vendas na Internet, a Polónia não passa de uma reserva de mais de dois milhões de desempregados, prontos a trabalhar, não apenas pelo salário mínimo mas à tarefa, à hora, algumas semanas por ano.

A Amazon vai abrir três centros logísticos na Polónia, com dois mil postos de trabalho permanentes e três mil temporários em cada local. “Estamos muito contentes com a entrada da Amazon na Polónia. A criação de milhares de empregos é um elemento essencial para o nosso crescimento económico”, assegurou o vice-primeiro-ministro e ministro da Economia Janusz Piechociński.

Uma falsa alegria

Vários peritos duvidam que a empresa americana mereça tantos aplausos da Polónia. Segundo os assessores fiscais, a Amazon pagará poucos impostos, porque os centros logísticos geram, sobretudo, custos. A parte mais rentável da empresa, ou seja, a venda de produtos, fica fora da Polónia. [[Quanto aos tais preciosos empregos, não passam de pura ficção. É sabido que a Amazon só tem um punhado de pessoas a tempo inteiro, e paga a todos os outros o mínimo possível]].

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Em Bad Hersfeld, o maior centro de distribuição da Amazon na Europa, que emprega vários polacos, a média é de 9 euros brutos por hora, enquanto o salário mínimo oficial é ligeiramente superior a 8 euros. Mesmo os alemães não qualificados recusam-se a trabalhar por tão pouco, explica Jerzy Fulara, dirigente da empresa de trabalho temporário Pracomania.pl, a trabalhar há alguns anos no mercado alemão que faz muitas vezes recrutamento para a Amazon.

Questionado sobre os salários polacos, a Amazon respondeu ao Wprost que serão “competitivos” relativamente aos salários do setor da logística. Jerzy Fulara explica que uma tarifa atrativa significa 10-12 zlotis por hora (menos de 3 euros), ou seja um salário mensal próximo do mínimo.

“Tenho dúvidas de que, nos arredores de Poznan ou de Wroclaw, consigam encontrar milhares de pessoas dispostas a trabalhar por esse preço. Esta falta será provavelmente colmatada com trabalhadores oriundos de outras regiões polacas bastante afetadas pelo desemprego. Estas pessoas vão, claramente, ficar a perder, porque se têm de partir para arranjar trabalho, seria mais rentável optar pelo trabalho temporário em Bad Hersfeld”, assegura Jerzy Fulara.

Polacos, os miseráveis

Merecemos a nossa reputação de europeus imbecis: “temos a taxa de desemprego mais elevada e os salários mais baixos. Por causa disso podemos oferecer aos investidores enormes recursos de mão-de-obra barata”, pode ler-se no folheto oficial de Vármia-Masúria ‘Investir na Polónia 2014’”. O Hackett Group, uma empresa especialista em redução de custos de produção é da mesma opinião. “A seguir à China e à Índia, a Polónia é o melhor local do mundo para os investidores reduzirem os custos de produção. Isto deve-se ao facto de os custos de mão-de-obra local serem metade dos da Europa Ocidental ou dos Estados Unidos”, pode ler-se num relatório recente que dificilmente se pode considerar um elogio.

Mais de 100 mil polacos trabalham nas BPO (Business Process Outsourcing), centros externos que prestam serviços a outras empresas como plataformas de atendimento telefónico, contabilidade de bancos estrangeiros ou gabinetes informáticos. Esta atividade é uma verdadeira especialidade polaca, como testemunham as 600 pessoas empregadas em Cracóvia pela empresa americana de serviços financeiros State Street. O nosso sucesso deve-se ao facto de que num posto de trabalho equivalente, um polaco no cargo de especialista júnior ganha cerca de 100 euros menos do que um húngaro e menos 75 do que um checo.

Quem fica a ganhar?

“A competitividade que assenta unicamente nos custos de mão-de-obra, em vez da inovação, é uma das razões pelas quais aparecemos sempre na categoria dos cidadãos europeus mais mal pagos”, resume Ryszard Florek, proprietário da empresa Fakro, fabricante de janelas de sótão e um dos raros empresários polacos que opera a uma escala mundial.

“Os empregos de baixo custo são indispensáveis, mas não contribuem para o enriquecimento da sociedade polaca. Os principais lucros são gerados pelas empresas capazes de desenvolver produtos inovadores e vendê-los nos mercados estrangeiros.”

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