MEE, uma máquina de fazer dívida

O Mecanismo Europeu de Estabilidade lançado em 9 de outubro trai os pais e os textos fundadores da UE, escreve o Frankfurter Allgemeine Zeitung, defensor sensível da política alemã de estabilidade. E nada garante que possa assegurar a salvaguarda da união monetária.

Publicado em 9 Outubro 2012 às 14:08

A exceção passou a ser regra: o fundo europeu de resgate, o MEE [Mecanismo Europeu de Estabilidade], faz hoje parte integrante da união monetária europeia. Destina-se a tirar de apuros os países da zona euro que não podem ou não querem respeitar as regras do jogo da moeda comum.

Ao fazê-lo, os salvadores do euro desdenharam não apenas as promessas dos pais fundadores da União mas também a cláusula de não resgate que figura nos tratados europeus. O equilíbrio de poderes e a estabilidade da união monetária são assim alterados e, provavelmente, não no bom sentido.

Porque, a partir de agora, a jovem moeda fica privada do principal instrumento de pressão, que lhe permitia garantir a coesão da união: a ameaça credível de obrigar os países que não se vergam à disciplina orçamental e que não fazem o necessário para assegurar a competitividade da sua economia a assumirem eles próprios estas infrações. "Solidariedade" é a nova palavra de ordem. O MEE organiza e institucionaliza a responsabilidade comunitária – o fundo pode avançar com pelo menos €500 mil milhões de créditos em condições preferenciais, montante que pode ainda ser reforçado pelo efeito de alavanca.

Fundo anticrise altamente politizado

A ajuda é acompanhada por condições cuja severidade, hoje louvada, não durará muito. A partir de agora, os países que beneficiem ou desejem beneficiar desta ajuda apostam com sucesso num abrandamento dessas condições. A Espanha, por exemplo, preferiria canalizar diretamente os créditos para os seus bancos que se encontram numa situação desastrosa e evitar, assim, fazer economias orçamentais ou abrir o seu mercado de trabalho.

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O potencial de chantagem dos países fracos da zona euro é elevado e irá aumentando, enquanto a convicção de que não se deve abandonar nenhum Estado-membro predominar entre os responsáveis políticos europeus.

A instauração deste poderoso fundo de salvamento do euro abre um novo capítulo na história da união monetária. Ao lado de um Banco Central Europeu, que já não é absolutamente independente da esfera política, surge agora um fundo anticrise altamente politizado. Através destas duas instituições – o BCE e o MEE – a classe política pensa poder reduzir a influência dos mercados financeiros.

As diferenças de solvabilidade entre os países da zona euro não deverão continuar a traduzir-se por diferenças de taxa de juro. Acumular dívida torna-se, assim, menos oneroso. Uma via arriscada, que pode facilitar as reformas nos países em crise mas pode também – e a experiência leva a crer que será isso que acontecerá – incitar os países a optar fortemente pela vida a crédito.

Visto de Itália

O MEE está refém da eleição de Angela Merkel

“O euro conseguirá sobreviver até ao mês de setembroSetembro de 2013 [data das legislativas alemãs] ou arriscar-se-á a perder alguns países, por causa das jogadas táticas e eleitorais de Angela Merkel, na Alemanha, decidida a manter-se na chancelaria custe o que custar? Esta pergunta pode aparecer como provocatória, senão paradoxal”, escreve o Sole 24 Ore, “no preciso momento em que acaba de ser instituído o Mecanismo de Estabilização Europeu (MEE)” e a chanceler alemã se desloca a Atenas para apoiar a política de austeridade do Governo de Antonis Samaras. “Mas, como sublinha aquele diário económico, a pergunta faz todo o sentido:

O fogo continua a lavrar debaixo das cinzas duma crise sem fim e que corre o risco de voltar a eclodir de um momento para o outro numa Europa tensa e surrealista que, tal como a teia de Penélope, faz por um lado e desfaz pelo outro, numa atmosfera, ora de conflito, ora de aparente paz.

Neste contexto,

o arranque do MEE tem muito de ambíguo, desde logo porque só está parcialmente operacional e assim permanecerá não se sabe até quando. A maior urgência é a recapitalização dos bancos espanhóis em cerca de €60 mil milhões, mas o MEE não a poderá fazer, por não haver acordo quanto à centralização da sua supervisão no BCE, devido às reticências alemãs. E também porque a Alemanha, a Holanda e a Finlândia pensam que os apoios do MEE só deverão abranger as novas dívidas bancárias [contraídas depois da entrada em vigor do MEE]. Resumindo, subverte-se o jogo enquanto se estão a discutir as regras. […] O certo é que Merkel e o seu ministro das Finanças estão prestes a conseguir tirar de cena todas as decisões europeias que poderiam perturbar a opinião pública alemã durante a campanha eleitoral.

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